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Pavlov político
quinta-feira, 27 de junho de 2013
Ivan Pavlov, um fisiólogo russo, que em 1904 ganhou um Nobel por processos digestivos, ficou mundialmente conhecido por seu experimento sobre reflexos condicionados. Pavlov descobriu que era possível antecipar comportamentos adicionando marcadores, situações que criavam associação com o próximo passo. Em seus estudos descobriu mais, descobriu que esses comportamentos podiam ser natos (incondicionados) e outros podiam ser aprendidos (condicionados). Seus experimentos, com cães, geraram a base da psicologia comportamental que orienta desde tratamentos psicológicos aos eficientes anúncios de propaganda.
Resumidamente, Pavlov associou um toque de campainha à disponibilidade da ração a seus cachorros, e descobriu que ao soar a campainha, mesmo sem por a comida, todos já salivavam, pois sabiam que a ração seria servida em seguida... Isso te lembra o comportamento político neste país?
Mais que um comportamento condicionado, mais que um reflexo da malemolência brasileira, isso é um círculo vicioso e viciado onde um político precisa se corromper para se aproximar dos partidos e obter deles atenção, e uma vez no poder, toca a sineta e a saliva vem em forma de corrupção, desvios, nepotismos, venda de cargos etc.
Muitos de nossos políticos se acostumaram a ver uma eleição como uma oportunidade a seus interesses pessoais, do mesmo modo que vê uma oportunidade de desvio diante de um contrato, como enxerga um cargo político para o partido ou a contratação de parente na assinatura de uma proposta de lei que incha a máquina pública. Pouco a pouco o público se torna de ninguém, o interesse corporativo se sobrepõe ao coletivo, o meu e o seu passa a ser o dele, e o passado fica sem resultado e presente fica sem futuro. Nesta ciranda que mais parece roda de capoeira, só fica de pé quem tem poder e todos nós agachados pagando impostos.
Surgindo a cada quatro anos na porta da nossa casa, a imensa maioria some durante o período em que foi eleito, e retorna quatro anos depois, mais babado, mais condicionado, como num ciclo previsível, onde também ouvimos uma sineta, onde parte significativa da população também converte suas decisões de voto a interesses menores e absolutamente próprios, reforçando o traço viciado e de baixa expectativa, que no fundo é o rascunho de uma sociedade individualista que não privilegia um político de opinião ou que entende que resultados maiores precisam de um tempo maior de maturação, que o coletivo deve se sobrepor ao individual. Farinha pouco, pirão para quem tem mais fome!
Na lógica do tudo para mim e tudo pra ontem, seguimos sem amanhã e nada pra nós e, é lógico, nenhuma sociedade prospera nestas condições. A corrupção não é só política, ela está no oportunismo da fila dupla, no telefonema que explora o favor, no cartão de estacionamento exposto no painel com data vencida, no carro que avança a faixa de pedestre e no pedestre que desfila na faixa em vez de atravessar. Ela está arraigada na confiança abusada que a impunidade dá!
O que vemos nas ruas de todo país atualmente é um país sem liderança política, incapaz de canalizar a tentativa desordenada, mas não menos legítima, de uma população que parece querer finalmente romper o reflexo condicionado de entubar os desmandos, a corrupção, a falta de atenção do estado e o vicioso hábito de prometer o que não pode e nem se pretende cumprir.
Tomara que achemos os caminhos para transformar a energia sonora do Vem Pra Rua em energia cinética que dê ao Brasil rumo, velocidade e constância. Em 1995 éramos sétima economia do mundo, a China a oitava, portanto atrás de nós. Em 2012, ou seja, dezessete anos depois avançamos uma única posição; já a China ganhou seis posições e hoje é a segunda.
Precisamos romper o reflexo condicionado de aceitar desmandos, corrupção, precisamos ouvir a sineta e entender que através do trabalho, do uso sério dos nossos impostos e de políticos que respeitem o seu eleitor, finalmente poderemos nos alimentar, não de esperança, mas de resultados e prosperidade. Enquanto isso? Vem pra rua!
Roberto Mendes é publicitário, especialista em marketing pelo Instituto de Administração e Gerência da PUC-Rio, pós-graduado em Engenharia Ambiental, professor titular da Universidade Candido Mendes e sócio da Target Comunicação.
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