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Beleza e consumo
quinta-feira, 09 de janeiro de 2014
Todo verão aumenta a pressão por um corpo perfeito e o pós-festas de fim de ano vem sempre seguido de promessas e mais promessas de regime, e é aí que algo mais que a calça aperta, aperta o bolso!
O consumo hoje namora com a beleza de uma forma muita mais ostensiva que em qualquer outra época da história. Sempre houve certo flerte entre dinheiro e beleza. Grosso modo, os ricos sempre pareceram mais bonitos, afinal, roupas caras e penteados bacanas sempre ajudaram a enganar os defeitos ou a enfatizar as virtudes, e é aí que a armadilha de comprar se arma e captura cada vez vítimas.
A beleza hoje é definida por orçamento. Você é tão belo quanto seu saldo bancário, ou a prestação que pode pagar. A medicina estética, a ortodontia, os tratamentos capilares, cirurgias plásticas, cosméticos, roupas, SPAs; toda uma indústria trabalha, fatura e até certo ponto entrega a consumidores o sonho de ser socialmente bonito.
Bem verdade que é uma beleza produzida, construída e quase sempre dentro de um pote padrão onde todos parecem precisar se encaixar em um único formato, ignorando a variedade de gostos pessoais, naturais e que podem ser específicos de um biotipo, por exemplo.
Como comprar uma camisa, quando acerta o colarinho aperta ou sobra no punho, ou um sapato que ajusta no tamanho, mas falta na altura... Somos sistematicamente padronizados em uma realidade de exceções.
A indústria da moda e da beleza renova conceitos a cada três meses. Novas cores, tendências, estilos, tudo muda e assim seu guarda-roupa, seu cabelo, seu jogo de maquiagem, tudo precisa ser renovado. Empregos, faturamento, amores, tudo parece depender deste frágil e leve equilíbrio entre ser belo e ser feliz.
A verdade que a nossa autoestima e qualidade de vida tão agredidas pelo nosso estilo de vida acelerado, devedor e tão definido por relações de poderes, que precisa e aceita como consolo a beleza de prateleira, trocada, esquecida ou mesmo roubada, pelo que no passado vinha em parte pela beleza do descanso, do amor, do estar bem consigo e com quem se quer bem.
Pouco a pouco trocamos um momento bonito por um momento para a beleza, nos afastamos daquilo que é, e nos deixa bonito, para ficarmos aparentemente bonitos. Mais tempo no shopping, no salão, arriscando nossa vida em mesas de centro cirúrgicos, tudo isso para alcançar um ideal de beleza produzido pela indústria, tudo isso por uma beleza que era pessoal e que se perdeu com o tempo, um tempo que se relaciona muito mais com a qualidade do tempo do que com a quantidade do tempo, afinal, via de regra este foi gasto em outros afazeres, como a correria, a alimentação errada, com um dia a dia menos feliz.
É, verão é tempo de culto ao corpo, a uma beleza plástica que agrada sim, mas que por vezes degrada quem a possui, não só pela falsidade pela qual é construída, mas porque reforça uma enorme superficialidade, reforça um conceito estético padronizado, sem nenhuma individualidade, e cultua um relacionar-se de aparências onde o consumo determina a percepção de felicidade e afasta as pessoas do ser feliz consigo para o ser feliz com os outros, ou melhor, com o que os outros acham dela.
Verão é sol, tempo de luz, de iluminar outras belezas e nossas muitas belezas. Mais praias, menos centro cirúrgico. Mais tempo para o bom e o bem, do que tempo para o belo. Mais tempo para as pessoas e menos para consumo.
Roberto Mendes é publicitário, especialista em marketing pelo Instituto de
Administração e Gerência da PUC-Rio, pós-graduado em Engenharia Ambiental,
professor titular da Universidade Candido Mendes e sócio da Target Comunicação
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