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Salário x competência
A questão salário versus competência está se transformando numa batalha semelhante ao antigo debate: quem nasceu primeiro, o ovo ou a galinha?
Revistas de educação ou formadoras de opinião pública dão conta de uma série de artigos sobre essa questão, apelando alguns para experiências de outros países e esquecendo de olhar a área proximal que nos interessa mais que é a do próprio Brasil.
Se nós continuarmos com o debate voltado, cartesianamente, para as segmentações entre competência e salário não chegaremos às metas necessárias que interessam à educação brasileira.
Os desafios enfrentados por outros países podem ser úteis às nossas reflexões, nunca, porém, exemplos paradigmáticos a serem transportados de longínquas regiões setentrionais para nossas vastas áreas tropicais.
O paradigma cartesiano é reducionista e, por consequência, determina um foco e o isola dos demais elementos pertinentes ao debate. Esse isolamento é defendido como um processo para se ver mais claramente o que se deseja, no entanto, ao separarmos um elemento do contexto podemos perder de vista o cenário onde os fatos ocorrem.
Uma simples brincadeira nos dá a dimensão do que estamos falando: se um urso brigar com um jacaré, quem ganhará a briga? A resposta só será obtida se considerarmos o contexto dessa luta: se for na terra, ganhará o urso; se for na água, ganhará o jacaré. A vitória depende do contexto em que a luta ocorrerá.
Depreende-se, então, que salário e competência também dependem do contexto e quem quiser solucionar as questões educacionais não atingirá objetivo algum que desejar isolando cada uma dessas duas partes. Uma está atrelada à outra. Quem não tem competência dificilmente conseguirá um salário melhor e quem não tiver salário terá dificuldades de buscar competência. Portanto, as duas vertentes precisam ser trabalhadas de modo concomitante.
Parecem-me erros brutais ao analisar essa questão algumas posturas ideológicas que apelam para vários tipos de análise e comparações visando trazer as conclusões para seu campo de interesse.
Posso citar os debates bastante vazios quando se aborda a questão da competência: alguns só aceitam a competência dentro do conceito semântico de competição e, portanto, deveria ser rejeitada porque a sociedade precisa muito mais da solidariedade que da competição. No entanto, quem age assim, pode acabar pensando que não se deve buscar mais conhecimento porque este aumentaria a capacidade de competição dentro do mercado. Mais interessante nesse debate é encontrar os defensores da meritocracia contrários à competência. Nesse caso, a contradição é maior ainda: ao defender a ocupação de cargos através de concursos que selecionam por competências, acabam defendendo-as e promovendo-as.
Nos debates em relação à situação salarial, dado que a Finlândia passou a ser “parâmetro” para alguns analistas, torna-se importante observar aquele país sob vários pontos de vista: clima, internet disponível, relação do espaço físico habitado com os que se apresentam para exames, estação climática da época dos exames, formação dos educadores e nível de educação das famílias.
Comparar, simplesmente, a Finlândia com a Alemanha ou com o Centro-Oeste Brasileiro, para tentar transportar soluções finlandesas para cá será um ledo engano pelas grandes diferenças existentes.
Hoje, no Brasil, o foco dos debates sobre salário e competência dos educadores está errado. Primeiro porque estes assuntos precisam ser considerados em seus contextos e não podem estar separados; segundo porque as realidades dentro do próprio Brasil são muito variadas.
O concreto que percebo Brasil afora em relação a essas duas questões não reside na falta de verbas para a educação, reside, sim, na carência de melhor gestão.
Se, de um lado, há educadores que exigem planos de carreira com fulcro exclusivo no tempo de serviço e, não, na conjugação com a formação continuada, de outro, há administradores que julgam ser possível com salários irrisórios, um professor cuidar da própria formação.
Os dois erram, a meu ver porque, sem a formação continuada, em pouco tempo estarão com o “prazo de validade vencido” e, sem o salário, continuarão com a autoestima num patamar aquém das exigências psicológicas mínimas.
Hoje, qualquer empresa ou qualquer instituição tem a preocupação com a formação de seus quadros que representa o capital humano ali agregado. Por isso, os que lidam com a educação, no setor público ou privado precisam estar atentos aos dois pólos ao mesmo tempo.
Um aspecto, no entanto, parece-me importante considerar: qualquer formação continuada que não proporcionar uma transformação interior da pessoa do educador poderá até servir para a melhoria do salário, porém, dificilmente, fará ressurgir uma educação de qualidade.
Prof. Hamilton Werneck é pedagogo,
escritor e palestrante.
Hamilton Werneck
Hamilton Werneck
Eis um homem que representa com exatidão o significado da palavra “mestre”. Pedagogo, palestrante e educador, Hamilton Werneck compartilha com os leitores de A VOZ DA SERRA, todas as quartas, sua vasta experiência com a Educação no Brasil.
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