Mudando paradigmas – O tempo absoluto

quarta-feira, 28 de março de 2018

A humanidade evoluiu e desaguou na era industrial, em que o tempo, reforçado pelos conceitos de Newton na era moderna, passou a ser considerado absoluto. Os filósofos consideravam o tempo como o número ou a medida do movimento. A influência matemática e mecanicista transformava o tempo em número fluente e contínuo. A principal distinção que se fazia estava ligada à duração deste mesmo tempo.

A sucessão de movimentos é tão intimamente ligada ao tempo que, se suprimirmos a sucessão, suprimimos o tempo. Daí se desdobra uma ação que se conjuga, perfeitamente, com a época: revolução industrial, sucessão de ações para a feitura de determinado objeto e, para gerar maiores lucros, a busca de um tempo cada vez menor, dentro das fábricas, aliado a uma sucessão cada vez maior.

Nesse ponto de nossa história humana, o tempo passou, com sua força absoluta, a ocupar um lugar de destaque, moendo as pessoas, que, a cada dia, eram instigadas a trabalhar mais, para produzir mais e em tempo menor. Surgiu o estresse, que antes o trabalho não provocava tanto. Este tempo, assim considerado, passou a determinar, dentro das escolas e universidades, a quantidade de conteúdo a ser assimilado pelos estudantes. Quantidade que crescia com o aumento da ciência, empacotada dentro dos mesmos tempos, dividida em semestres, bimestres e anos letivos.

Quando se chegou à aplicação dos créditos, aconteceu a mesma coisa: criou-se um fluxo de conteúdos para determinados tempos, enquanto, na indústria, já ocorria o mesmo: pessoas controlando outras pessoas, que deveriam fazer uma tarefa numa exata etapa da sucessão dos movimentos. O resultado desse processo, apesar de ter levado a humanidade a muitos progressos, embruteceu as pessoas, eliminando de suas vidas a capacidade de criar soluções novas, que, por sua vez, dependem de uma mente mais livre e menos pressionada pelas sucessões de vários movimentos.

O tempo absoluto passou a ser considerado medida da justiça, mesmo dentro das escolas, onde uns aprendem mais depressa e outros mais devagar. Julgava-se injusto conceder um tempo maior para um estudante porque, dos outros, fora exigido um tempo menor. Assim como na indústria, uma pessoa lenta deveria ser retirada da trilha de montagem e substituída por outra mais rápida, as escolas simplesmente descartavam, via reprovação, os mais lentos e – pior do que na indústria – não os substituía, ficando a carteira escolar vazia e a sociedade prejudicada. Esse foi o grande mal que a noção de tempo, como concebida por um paradigma do passado, típico da era das máquinas, provocou na formação intelectual, no avanço da ciência e na formação da cidadania.

Se um país determinasse que o crescimento de seu bolo industrial e de sua riqueza dependeria de um determinado número de pessoas bem formadas, praticamente não se preocupava com os demais descartados do sistema, porque não seriam necessários para fazer o “bolo” crescer.  No entanto algo muito sério ocorria: o “bolo” crescia; sua divisão, porém, tornava-se impossível. Assim, os países passaram a ser discriminados pelo nível de escolaridade, com reflexos imediatos no seu desenvolvimento.

Quando os países emergentes acordaram para a necessidade de crescimento, depararam com uma estrutura escolar que se refletia na economia, área em que a cultura da reprovação atendia aos paradigmas de uma época distante, envolvida por uma mentalidade de mestres que buscavam, incessantemente, os erros, nunca os pontos fortes dos alunos. Esta é a estrutura de base do paradigma do passado, que não faz desenvolver, nem integrar as pessoas ao seu meio, e não as torna cidadãs comprometidas.

A manutenção da influência dos conceitos de tempo é importante porque elimina as possibilidades de flexibilização desse mesmo tempo, impedindo a recuperação das pessoas ou as acelerações que permitam a queima de etapas, retomando, de imediato, o crescimento.

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Hamilton Werneck

Hamilton Werneck

Eis um homem que representa com exatidão o significado da palavra “mestre”. Pedagogo, palestrante e educador, Hamilton Werneck compartilha com os leitores de A VOZ DA SERRA, todas as quartas, sua vasta experiência com a Educação no Brasil.

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