A escola educadora - Última parte

quarta-feira, 27 de setembro de 2017

Mesmo que ainda persista a ideia de que a escola educadora tem seus alicerces no quadro docente, numa comparação muito comum com os hospitais que entendem ter seus alicerces no corpo médico, não se pode mais restringir a ação dos principais responsáveis pela educação: os pais dos alunos e alunas.

Nesse sentido a escola educadora enfrenta duas vertentes significativas: uma delas, vai de encontro ao desejo de alguns pais que pensam ser a melhor educação aquela em que o aluno é entregue a uma instituição que cuida de tudo, procurando livrá-lo de todos os incômodos possíveis. Quando os pais assim pensam e a escola se sente um santuário onde somente alguns têm o direito de ingressar, consegue-se até bons resultados em concursos, porém, a qualidade da educação para a cidadania e para a vida estará comprometida.

Outra delas, trata-se de um quadro real de nossa sociedade que matricula alunos em escolas com qualidade comprovada e que não está interessada em barrar os pais em sua porta, porém, os alunos, são na realidade, “órfãos de pais vivos”. Seria a educação também de menor qualidade, mesmo sem culpa da instituição de ensino.

Não conseguimos fugir da realidade de nossa sociedade onde este comportamento existe. Mas, apesar de tudo fica a possibilidade do reconhecimento do “papel dos outros” no processo educativo, onde educadores sentem-se com uma função ampliada que vai muito além do simples instruir.

Como muitos gostam das comparações entre escolas e hospitais, valeria a pena verificar a mudança do comportamento do trabalho dos médicos de família. Quando os médicos do Sistema Único de Saúde compreendem o contexto de vida dos pacientes, mais facilmente conseguem conduzir a situação da doença à cura. Fica mais fácil dirigir as equipes que cuidam das famílias e que atendem aos pacientes ali inseridos. O mesmo aplica-se a uma escola, porém, sempre que a família do paciente não quer colaborar, ou se o paciente é difícil em colaborar, a qualidade do atendimento decresce e isso é válido para as escolas.

Uma escola de qualidade desenvolve a ética do cuidado e isso só se consegue mediante a prática da dimensão afetiva da justiça. Não se trata de padronizar, por exemplo, as concessões de bolsa de estudos a fórmulas matemáticas porque estaríamos deixando de lado o ponto mais significativo do processo de negociação que é a necessidade presumida e a busca de identidade de interesses.

A fala pessoal e a compreensão afetiva da situação em que se encontram os pais-parceiros nesse processo de educação torna-se o elo mais importante do estabelecimento do cuidado que exige dedicação e tempo, contrapondo-se à velocidade da sociedade de consumo que impede o sabor das coisas. Paulo Freire alerta para o fato de que sabor e saber têm a mesma raiz, portanto, se não saborearmos não saberemos.

O cuidado espera pela fala alheia. É sensível enquanto escuta e interpreta, fazendo-se ao mesmo tempo pessoa clara e comprometida com a outra parte em questão. Então, as negociações que se baseiam na ética do cuidado, podem ter, após várias entrevistas, aparentemente a impressão de injustiça quando, na verdade, são as mais justas porque observadas na ótica afetiva.

O cuidado entende as diferenças individuais, percebe a necessidade de manter sigilos e compreende que muitas situações são temporárias e que o tempo, na medida das transformações, pode também modificar as resoluções, antes tomadas. O cuidado, enfim, tende a eliminar a fórmulas feitas e está atento à complexidade da vida e das pessoas, assim como da sociedade em constante mudança.

O cuidado requer ainda um educador sensibilizado pelo imprevisível e pelo complexo que cuide das coisas e pessoas com características de coordenação, organização e transformação. A escola educadora, enfim, vive com vários elementos ao lado da ética do cuidado. Este caldo variado é, ao mesmo tempo, complexo, dialético e dialógico.

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Hamilton Werneck

Hamilton Werneck

Eis um homem que representa com exatidão o significado da palavra “mestre”. Pedagogo, palestrante e educador, Hamilton Werneck compartilha com os leitores de A VOZ DA SERRA, todas as quartas, sua vasta experiência com a Educação no Brasil.

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