Características do profissional na sociedade do conhecimento - A Criatividade

quarta-feira, 22 de agosto de 2018

Enquanto a sociedade da primeira onda era a sociedade do sobreviver, a sociedade de segunda onda é a sociedade do fazer. Vive-se hoje em um tipo de sociedade em que a tônica é conhecer. Existe uma febre, em nossos dias, correspondente ao desejo de novidades e de coisas diferentes. Isto é inerente ao ser humano e pode ser constatado ao longo da história. No período das grandes navegações, havia um desejo incontido por riquezas, especiarias e sedas do Oriente. Àquela época, navegadores e aventureiros conseguiam trazer essas riquezas para a Europa e encantavam os habitantes.
Hoje, a febre é semelhante. Desejam-se coisas muito novas, personalizadas e diferentes, o que exige saídas comerciais, industriais e intelectuais muito criativas por parte das pessoas. Se os problemas existem, devem existir soluções para eles, com uma diferença básica que Albert Einstein indica muito bem: 
“As soluções para os problemas não podem ser dadas com os mesmos parâmetros que criaram esses mesmos problemas”. 
Daí a necessidade da criatividade. Se a sociedade fosse outra, poderíamos nos dar ao luxo de, simplesmente, repetir; se a sociedade fosse ainda a agrícola, poderíamos fazer como nossos avós fizeram. No entanto, a sociedade é diferente, e as soluções para agradá-la ou resolver seus problemas devem ser criativas. Se analisarmos uma cidade que prosperava dentro da segunda onda – ou seja, da sociedade industrial –, no momento da queda desse modelo, quando as fábricas diminuem seus funcionários e começam, por questões administrativas e econômicas, a falir, a solução não estará em tentar soerguer esse modelo. Pelo contrário, a solução é encontrar outro modelo que, certamente, nada terá a ver com o atual. Onde estarão os empregados dessas enormes fábricas, hoje falidas? Você os encontrará como motoboys, entregando pizzas, remédios e levando encomendas de um lado para outro. 
Se o sistema anterior e fabril exigia um controle do relógio e dos apitos das fábricas, nesse novo modelo, admite-se o teletrabalho como um processo viável e mais econômico para as empresas, atingindo-se o mesmo objetivo de produção. Se considerarmos o teletrabalho como algo moderno, veremos que o especialista fica em sua própria casa e não recebe vale-refeição, não se desloca pelas vias normais, congestionando o trânsito ou consumindo vale-transporte ou o combustível que ele mesmo paga; a luz e os computadores são de sua propriedade, e ele mesmo arca com todas as despesas. A fábrica nada gasta, e o funcionário está mais livre e mais feliz. 
Mas, para se ter emprego nessas circunstâncias, é necessário ser criativo e, além disso, a sociedade precisa ser criativa dentro do modelo de sociedade do conhecimento. Ser criativo é fazer mais com menos. Ser criativo é trazer uma solução mágica para o problema. Parece-me que as tentativas de repetir os modelos falidos só provocam reuniões trágicas entre os coordenadores. É preciso mudar radicalmente o modo de fazer, de pensar e de sentir; é preciso, radicalmente, virar o dial do rádio e mudar de estação, buscando outra sintonia. 
Quando se fala em criatividade, geralmente as pessoas pensam em técnicas sofisticadas, e os menos criativos, na sua arraigada posição contrária às mudanças, dizem que os investimentos precisam ser altos para se atingir o objetivo criativo. 
Na verdade, considero o contrário: criatividade é fazer mais com menos e, para tanto, proponho uma reflexão: uma professora de escola multisseriada do interior de um município verificou que lá não havia lápis de cor e bastões de cera para pintura. No entanto, havia papel. Como professora de artes e muito criativa, em vez de chorar a falta de material, descobriu-os na própria escola. Seus alunos foram orientados para buscar tintas da natureza e pintar com os dedos, no papel fornecido, o que quisessem. Resultado: dentro de meia hora, as crianças descobriram tintas de cores muito variadas que nunca perceberam antes. Alguns pequenos gênios da pintura surgiram e, dependurando as folhas num barbante, dentro da sala de aula, a professora acabara de fazer a primeira “bienal de arte” com os seus alunos. Usando material muito barato, ela mostrou que a criatividade é, realmente, mágica. O espírito criativo foi mantido, embora os materiais fossem muito simples. Isso é fazer mais com menos, e nossa professora do interior mostrou-se, realmente, mágica. 
Estava, certa vez, um chefe escoteiro num acampamento e resolveu fazer algo diferente, enquanto ensinava alguns processos de sobrevivência. Chamou alguns escoteiros, que usavam somente short, tênis e uma faca com bainha. Pediu-lhes que imobilizassem o braço do colega com aqueles materiais, sem que ficassem nus. Depois de certo tempo, dois deles descobriram que a faca dentro da bainha serviria de base para a imobilização, e os cadarços dos tênis amarrariam essa base. Mesmo sendo um processo primitivo, e que deve ser removido logo para não impedir a circulação no local, seria uma solução para imobilizar um membro do corpo humano de modo criativo, até que se chegasse ao socorro mais próximo. 
O mais importante é a iniciativa unida à criatividade que se verificou com essa prática. Muitas fábricas recolhem sugestões em caixas e dão prêmios aos novos inventores. É necessário acreditar que o invento pode ser simples, como um cortador de unha ou um abridor de lata – o importante é que ainda não exista. Nossa sociedade nutre uma expressão típica de segunda onda, que, ao mesmo tempo, age contra a criatividade: “Não vamos descobrir a pólvora”. É claro que nada de novo viria à tona. O que é preciso é descobrir alguma coisa diferente da pólvora com o mesmo efeito dela. 
A expressão é contra a busca de criatividade e acaba dizendo às pessoas, dentro de uma empresa ou escola, que devem, simplesmente, repetir. Assim não chegaremos aos avanços que a sociedade do conhecimento requer. Esta sociedade é marcadamente criativa, e tal faceta é o caminho mais seguro para a sobrevivência neste século. Para tanto, as escolas e universidades, dentro de suas atividades, precisam incentivar feiras de criatividade, concursos literários, exposições de arte e ainda vencer as barreiras contra a educação artística, permitir mais aulas e atividades nesse setor. Então, sem dúvida, poderão dizer que estão preparando seres humanos para o futuro!

 

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Hamilton Werneck

Hamilton Werneck

Eis um homem que representa com exatidão o significado da palavra “mestre”. Pedagogo, palestrante e educador, Hamilton Werneck compartilha com os leitores de A VOZ DA SERRA, todas as quartas, sua vasta experiência com a Educação no Brasil.

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