A atenção aos processos

quarta-feira, 27 de junho de 2018

Se o antigo paradigma dava atenção ao produto, o atual dá especial atenção ao processo. Dar atenção ao processo não significa trabalhar em detrimento do produto, como pensam os conservadores que fixam o olhar no produto final. Quando os serviços dentro de uma fábrica ou dentro de uma universidade são avaliados com a ótica antiga, trabalha-se a avaliação como se estivéssemos dentro de uma fábrica da Ford no início do século 19.

Fabricava-se o carro e somente depois era feita a avaliação. Conclusão: havendo defeitos, o carro deveria voltar à trilha de montagem. O custo da mão de obra, os gastos com energia e as perdas de matéria-prima foram inviabilizando o sistema. Como contorná-lo? Simples. Centrou-se no processo. Se a avaliação ocorre ao longo do processo de montagem, à medida que forem surgindo, os problemas serão reparados, evitando-se uma perda total ou quase total ao final do trabalho.

Complementando, basta pensar em quanto custa um “recall” porque a avaliação durante o processo foi feita sem qualidade. Muito semelhante a essa situação é a questão do ensino nas escolas. A mentalidade industrial, marcada pelo paradigma de uma sociedade de segunda onda, na visão de Toffler, é uma sociedade industrial que se reflete dentro dos estabelecimentos de ensino. Assim, o ensino é ministrado em tempos iguais com quantidades iguais, os alunos sentam-se enfileirados, um olhando para a nuca do outro, e as avaliações não são feitas durante o processo, mas sim quando o “produto” estiver pronto.

Por isso, as escolas e universidades estavam centradas em exames finais, muitos deles com pesos mais fortes que o ano letivo. A duras penas, no Brasil e na maioria dos países da América Latina, foi implantada uma avaliação do processo, porque as pessoas estavam arraigadas ao passado, quando se considerava, apenas, o produto. As avaliações durante o processo exigem maior atenção de todo o sistema produtivo ou de todo o sistema de ensino, se for uma escola. Isso, a princípio, dá mais trabalho, no entanto o aproveitamento é muito maior, porque os conhecimentos adquiridos com falha são repostos de imediato.

Se falarmos em uma conferência para professores sobre este tema, teremos algumas reações visíveis: dirão alguns que não podem aplicar provas todos os dias e, certamente, esta será a primeira contestação. Não trataremos de outras, esta bastaria para termos substância para questionamento. Esta postura denota que o avaliador só sabe fazer uma coisa: aplicar provas e, preferencialmente, do tipo medição do conhecimento. A avaliação durante a fabricação de um produto ou durante o ensino de alguma coisa a alguém independe da existência de provas. Uma pessoa pode fazer avaliações e não aplicar provas.

Nesse caso, valem a observação, a percepção pelas perguntas feitas e dos feedbacks e as verificações de desempenho em relação ao domínio do conhecimento ou manejo de uma determinada máquina ou aparelho. Muitos avaliadores, sobretudo dentro de escolas e universidades, são pessoas presas aos números, e suas avaliações e serviços de secretaria muito se assemelham a trabalhos de um escritório de contabilidade. Alguns sistemas de educação enquadram as secretarias não como parte dos serviços de supervisão escolar, mas, sim, na administração da escola ou universidade. Há uma substancial diferença entre uma fábrica de sabão e uma escola. O que se pode fazer em uma não se deve fazer na outra.

Quando se avalia o processo, avalia-se o todo de uma empresa, sua estrutura administrativa, seus serviços, seus procedimentos para contornar problemas, sua capacidade de investimento e de formação continuada de profissionais. Dizer que a preocupação está centrada no produto pode significar uma postura de desprezo com a formação, com a percepção dos problemas que ocorrem durante o trabalho, seja ele mecânico ou intelectual, comprometendo a questão da vida dentro da empresa.

Se as avaliações ocorrem em processo, a tendência é corrigir-se o problema antes que ele se instale ou, o pior, se transforme em uma cultura dentro da empresa. Assim, atendimento, quando não corrigido em suas falhas, pode solidificar uma postura de mau atendimento que passa a comprometer o desempenho geral, a convivência dentro e fora da empresa. Alguns clientes poderão sentir essa situação e buscar outros fornecedores.

O novo paradigma dá ênfase ao processo e se estende aos contornos da vida dos funcionários em relação ao meio social de onde vêm. Processo e contexto são fundamentais para se ter um produto competitivo. Em se tratando de uma escola, a convivência é importante. Este local não é, apenas, para se aprender, do ponto de vista intelectual, mas existe para que a convivência se desenvolva. A ausência da convivência pode desembocar na violência. Os cuidados com a convivência fazem parte do processo, e isso é fundamental em qualquer parte e precisa ser assimilado por todo profissional interessado em permanecer no mercado neste século.

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Hamilton Werneck

Hamilton Werneck

Eis um homem que representa com exatidão o significado da palavra “mestre”. Pedagogo, palestrante e educador, Hamilton Werneck compartilha com os leitores de A VOZ DA SERRA, todas as quartas, sua vasta experiência com a Educação no Brasil.

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