Pela internet

quarta-feira, 01 de fevereiro de 2017

E discursos políticos que fariam Lula votar em Sérgio Moro para presidente

Tem uma senhora, e não é a minha, que anda terrivelmente preocupada com minha vida amorosa. Diariamente ela tem me mandado mensagens pela internet, oferecendo produtos que vão aumentar isso, melhorar aquilo, enfim, me transformar num campeão olímpico na mais antiga e mais praticada das modalidades esportivas. A ser verdade o que promete essa senhora, minha fama percorrerá a cidade e mulheres desesperadas me cercarão pelas ruas. Para tanto, basta que eu adquira o tal produto que, por minha grande sorte e para minha maior glória, está em promoção, com 50% de desconto.  A algum leitor que acaso se interesse pelo assunto, lamento informar que “a quantidade é limitada”, a promoção é “só por hoje” e se destina exclusivamente a “clientes selecionados”. Por exemplo: eu.

Não quero ser indelicado com pessoa que assim abnegadamente se propõe a me socorrer em assunto de tão vital importância. E longe de mim duvidar de sua honestidade ou da qualidade da maravilha que ela está vendendo a preço assaz convidativo. Mas o fato é que ser campeão pode se tornar uma coisa cansativa. Vamos supor que tudo realmente acontecesse como essa amiga internética promete. Ia me dar uma trabalheira danada, me ocupar o dia inteiro (e as noites!) e me privar de outros prazeres, tais como ir para cama somente para dormir, e nada mais.

Outra (como se interessam por mim essas senhoras!), também pela internet, frequentemente me oferece lições que, a um pequeno custo, me ensinarão a escrever melhor. Não posso dizer que não preciso. O leitor é testemunha de que preciso, e muito. Então, quem sabe se, seguindo com afinco os conselhos dessa expert, eu deixaria no chinelo concorrentes tais como João Ubaldo, Carlos Drummond, o próprio Rubem Braga e outros menos votados. O único inconveniente é que o pagamento deve ser integral e antecipado, e eu não me acho em condições financeiras de atender a tão justa solicitação.

Mas é bem tentador saber que, com as aulinhas assim generosamente oferecidas, alcançarei redigir relatórios capazes de remover qualquer suspeita sobre as contas das campanhas eleitorais. E cartas daquelas que comovem os corações de pedra e trazem de volta maridos fugidos e amores perdidos. E discursos políticos que fariam Lula votar em Sérgio Moro para presidente. Tudo isso estará ao meu alcance se eu adquirir doze apostilas, a um preço tão baixo que só é possível porque “a autora não tem interesse comercial”, pretendendo apenas “ajudar o amigo internauta a escrever com mais eficiência e correção”.

Mas não apenas as senhoras! Um cavalheiro que se diz totalmente confiável (e eu não tenho por que duvidar, se nem o conheço) se dispõe a me ensinar uma forma de ganhar dinheiro até dormindo. Isso mesmo: dormindo. Pelo que entendi, ele criou um programa que me permitirá abrir um escritório virtual que funcionará 24 horas por dia e talvez um pouco mais, todos os dias da semana e talvez mais alguns outros.

É um milagre, e eu não sou nenhum incrédulo. Um gráfico anexado à mensagem comprova que a cada segundo alguém, de algum lugar deste vasto planeta, entrará em meu escritório. Não entendi bem o que eu estaria lhes oferecendo, mas o que importa é que, a cada acesso, faturarei trinta reais. Você dirá que trinta reais é uma mixaria, mas pense em quantos segundos tem uma hora, quantas horas tem um dia, quantos dias tem o mês, e por aí vai. No fim dá um salário de fazer inveja a craques de futebol, grandes empresários, astros de Hollywood e políticos honestos.

É tanta gente boa querendo me ajudar que fico totalmente confuso e acabo não aproveitando nada, pelo que continuo longe de ser um super-homem, escrevendo mal e, ainda por cima, pobre.

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Robério Canto

Escrevivendo

No estilo “caminhando contra o vento”, o professor Robério Canto vai “vivendo e Escrevivendo” causos cotidianos, com uma generosa pitada de bom humor. Membro da Academia Friburguense de Letras, imortal desde criancinha.

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