A mais antiga profissão do mundo

quarta-feira, 17 de outubro de 2018

As autoridades fizeram o que sempre fazem quando não sabem o que fazer: largaram pra lá.

Durante muito tempo se disse que a prostituição era a mais antiga profissão do mundo. Talvez seja, porém reflexões mais aprofundadas levaram à conclusão de que a política é tanto quanto ou ainda mais. Não vai nisso qualquer comparação entre as duas, cada uma com suas especificidades, ambas com seus detratores e defensores, como soe acontecer a toda atividade humana.

Um dos defensores da prostituição teria sido Fidel Castro. Em Cuba, segundo se diz (eu nunca fui lá e, se fosse, não procuraria apurar essa história), a prostituição é mais disseminada do que o amor ao socialismo. Mas tudo no mundo depende do ponto de vista, que é sempre a vista de um ponto e, por isso mesmo, limitado e pouco abrangente. Segundo a piada, disseram a Fidel que Cuba era tão pobre que até as universitárias eram prostitutas, ao que o Comandante retrucou que não: “Cuba é tão rica que até as prostitutas são universitárias!”

O assunto é complexo. Na Índia, por exemplo, em Primeiro de Maio de 1958, não por acaso Dia do Trabalho, uma jovem compareceu a um tribunal para protestar contra a lei que a proibia de trabalhar honestamente na casa que era sua, na cama que era sua, com corpo que era seu e com o qual se sustentava e sustentava a família. A constituição do país assegurava (e qual não assegura, raramente cumprindo?) o direito das pessoas ao bem-estar. Como ter bem-estar sem trabalhar, e como escolher trabalho num país com tão poucos empregos para tantos milhões de habitantes? Para sobreviver, cada um faz o que pode e sabe. Essa moça só sabia fazer uma coisa, e queria continuar a fazê-la em paz.

Ouvi dizer que os baianos se revoltaram com um candidato que prometeu abrir milhares de postos de trabalho, quando o que eles estavam pleiteando era a instalação de mais redes de dormir e mais quiosques nas praias ensolaradas. Quer dizer, cada um defende seus interesses.

No caso da jovem indiana, ela recebeu o apoio das colegas de profissão e de outras trabalhadoras de ramos similares, todas tidas como “mulheres de má fama”, o que, na época, incluía cantoras e dançarinas. Também não faltou o apoio velado dos homens; velado, mas em dinheiro. Colaboraram os fregueses, por motivos óbvios; além de empresários e comerciantes, uma vez que a ocupação das mulheres atraía clientes para o negócio deles, claro.

Depois de muita discussão, as autoridades fizeram o que sempre fazem quando não sabem o que fazer: largaram pra lá. Não reprimiram e não mudaram a lei que proibia. Não sei como é hoje a situação na Índia, que a tanto não vão meus conhecimentos sobre o assunto. Mas o que eu mais gostaria era de ficar sabendo que não existem mais neste mundo pessoas que, para matar a fome, para ter um teto, para, enfim, sobreviver, precisem se dedicar a profissões que as degradam.

Enquanto isso está tão longe da verdade quanto a Terra da mais longínqua estrela do universo, aprendamos a lição de Jesus, quando impediu que a mulher adúltera fosse apedrejada: “Eu também não te condeno. Vai e não peques mais” (João 8:3-11).

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Robério Canto

Escrevivendo

No estilo “caminhando contra o vento”, o professor Robério Canto vai “vivendo e Escrevivendo” causos cotidianos, com uma generosa pitada de bom humor. Membro da Academia Friburguense de Letras, imortal desde criancinha.

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