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Certas previsões erradas
Não duvido de que Eva tenha garantido a Adão que Deus não ia ficar sabendo.
Estou escrevendo hoje porque o mundo vai acabar amanhã. Pelo menos é o que garante um astrólogo americano. Verdade que ele tinha marcado outra data e o mundo não acabou, tanto assim que você e eu estamos aqui, jogando conversa fora, e nenhum de nós dois, pelo que eu saiba, já morreu. Bom, quanto a você, não tenho certeza. Mas agora ele garante que refez os cálculos e não tem sombra de dúvida: amanhã é o último dia. O tal astrólogo é capaz de apostar a vida na sua profecia, se bem que, se amanhã for mesmo o fim do mundo, ele está apostando o que praticamente não tem mais.
Tão antiga quanto essa história de fim do mundo é a história das previsões erradas. Não duvido de que Eva tenha garantido a Adão que Deus não ia ficar sabendo. Os militares de 64 prometeram que a ditadura acabaria com a corrupção, os maus costumes políticos e a inflação. Quando deixaram o poder, a inflação ia pela casa dos 80% (ao mês!), a corrupção e os maus costumes políticos nadavam num profundo mar de rosas, no qual, aliás, estão nadando até hoje.
Quando Henry Ford teve aquela ideia maluca de construir automóveis, ouviu de um banqueiro que os cavalos eram definitivos, mas que automóveis não eram mais do que uma novidade passageira. Quase acertou: de tão passageiros, os carros estão passando até hoje, aos milhões. Pior fez o jornal que apostou que automóvel jamais se tornaria tão comum quanto a bicicleta. Esse também não andou longe da verdade, visto que nas ruas de hoje o automóvel não chega a ser tão comum quanto a bicicleta: é muito mais.
Mesmo sobre o computador, tão recente, muita besteira foi falada. Houve gente entendida jurando que ninguém quereria ter um computador em casa, simplesmente porque não haveria nenhuma boa razão para isso. Um cara do Departamento de Patentes dos Estados Unidos garantiu que a televisão não tinha futuro, pois as pessoas iam logo enjoar de ficar olhando para aquela caixa barulhenta. Um dos fundadores da Warner Brothers defendeu o cinema mudo com uma pergunta irrespondível: “Para que alguém vai querer ouvir a voz dos artistas?” Não sei se não terá sido esse mesmo que pomposamente afirmou: “o rádio não tem futuro”.
Sobre a mais famosa invenção de Thomas Edison, o presidente de um instituto de tecnologia concluiu que a lâmpada elétrica estava destinada a ser um completo fracasso (o progresso humano já havia chegado ao extremo de produzir lampiões a gás). Outra furada saiu no New York Times: “Um foguete jamais será capaz de deixar a atmosfera da Terra”. Winston Churchill concluiu que a energia atômica não resultaria em nada muito perigoso. O fato de ele estar errado causou grande decepção aos japoneses.
Para um cientista da Sociedade Real Britânica, seria impossível que máquinas mais pesadas que o ar conseguissem voar. Certo (mas errado) professor da Escola Superior de Guerra da França considerou que o avião era um brinquedo interessante, mas sem valor para uso militar. Um mandão do Escritório Postal Britânico, além de errar na previsão, apresentou um argumento que parece piada de... inglês: ele disse que o telefone podia ser necessário para os americanos, mas que os ingleses não precisavam de telefone, porque tinham, palavras dele, “muitos mensageiros”.
Enfim, não os critiquemos. Eles fizeram suas avaliações com os dados que tinham na época e, além do mais, herrar é umano. E o melhor que podemos fazer é desejar que o astrólogo americano acima citado erre mais uma vez. Se assim for, que amanhã nada mais grave do que uns pingos de chuva caiam na sua cabeça, prezada leitora, ou que sobre você, caro leitor, na pior das hipóteses, desabe apenas o produto da digestão de algum passarinho descuidado.
Robério Canto
Escrevivendo
No estilo “caminhando contra o vento”, o professor Robério Canto vai “vivendo e Escrevivendo” causos cotidianos, com uma generosa pitada de bom humor. Membro da Academia Friburguense de Letras, imortal desde criancinha.
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