Aos filhos, no dia dos pais

sexta-feira, 07 de agosto de 2015

Finalmente conseguira superar os obstáculos que por tanto tempo haviam impedido aquele abraço tão longamente planejado. 

Começo confessando que a narrativa original não é minha. Ouso reproduzi-la porque acho que pode ser uma leitura interessante, sobretudo para os filhos no Dia dos Pais, e porque tenho certeza de que seu autor nunca virá a saber da apropriação indébita que fiz do que ele escreveu e que, se por milagre viesse a saber, não me processaria.  Afinal, há tantos filmes, livros e músicas sobre Jesus e não há notícia de que ele tenha condenado alguém por assim se aproveitar de sua história. E olha que não lhe faltariam motivos. Além do mais, eu li isso há tanto tempo que nem me lembro onde. Vou contar como melhor puder, esperando não distorcer demais o texto original.

Um homem importante, vamos chamá-lo João, ainda jovem se afastara do pai, a quem chamaremos Antônio. Há muitos anos eles não se viam. Um dia, Antônio escreveu ao filho, manifestando o desejo de vê-lo e de reatar a convivência perdida. Convidava-o a visitá-lo, e sugeria que ele levasse a família consigo. João achou boa a ideia e combinou com a esposa que dentro de um mês iriam à cidade onde morava aquele homem tão próximo na genealogia, mas agora distante no espaço e sobretudo no tempo. Na data prevista, contudo, o time da escola onde a filha estudava tinha um jogo importante, e ela era líder de torcida. Não houve jeito senão adiar a viagem.

Nova visita foi planejada, para dois meses depois. Nesse meio tempo, João enviou algum dinheiro para Antônio, que retribuiu mandando pequenos presentes para os netos. Dessa vez a visita estava certa, tudo cuidadosamente previsto. Mas eis que, quando se aproximava o dia da partida, o patrão precisou ausentar-se do trabalho por algum tempo, e João assumiu temporariamente o lugar do chefe na direção da firma.  Assim, pela segunda vez, a viagem não pôde ser realizada.

Também a mulher queria que a visita se concretizasse e escreveu ao sogro, confirmando o reencontro, agora com menos de um mês de espera e enviando-lhe um delicado presente. Ansioso e emocionado, Antônio ficou aguardando a família. Mas antes que ela aparecesse, um ataque cardíaco o atingiu. Informado pelo hospital, João falou por telefone com o pai. “Eu estou bem, filho. Não se apresse.” E João não se apressou.

Chegou o Natal, João novamente enviou dinheiro para “o Velho”, e recebeu em troca presentes para todos da família. A nora ganhou uma joia que havia pertencido à falecida sogra. Novamente pai e filho se falaram por telefone, e combinaram se reunir em breve. Mas sempre algum acontecimento inesperado e importante para João e sua família impedia que o encontro se realizasse: uma cirurgia da esposa, a celebração do Dia das mães, o frio excessivo.

Os meses foram passando e sempre os imprevistos acontecendo. Até que um dia João realizou a viagem, embora sozinho e às pressas. Finalmente conseguira superar os obstáculos que por tanto tempo haviam impedido aquele abraço tão longamente planejado. 

E verdadeiramente tanto se apressou que chegou ainda a tempo de assistir ao sepultamento do pai.

“Por que eu não vim antes?”, se perguntava chorando. Mas ele, melhor do que ninguém, sabia a resposta.

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Robério Canto

Escrevivendo

No estilo “caminhando contra o vento”, o professor Robério Canto vai “vivendo e Escrevivendo” causos cotidianos, com uma generosa pitada de bom humor. Membro da Academia Friburguense de Letras, imortal desde criancinha.

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