Alta produtividade

quarta-feira, 30 de outubro de 2019

Em termos de produtividade ninguém tem moral para criticar os brasileiros

Ele tem 34 anos e sete filhos. E ainda dizem que a produtividade brasileira é baixa! Argumentam que, enquanto o brasileiro faz um carro, o americano faz dois; o japonês, quatro, e o chinês ninguém sabe quantos. Deve ser porque nesses países não se dá a devida atenção aos assuntos realmente importantes, tais como futebol (Neymar joga ou não joga?), Big Brother (Fulana transou com Sicrano ou só dormiram juntos embaixo dos cobertores?) e Carnaval (Mangueira!). Aqui não falta assunto, e naturalmente isso nos toma algum tempo do horário de trabalho, sem falar que um tanto nos desconcentra de nossas tarefas diárias.

Mas há países em que as TVs nem sequer têm programas de auditório nos fins de semana! Quer dizer, na segunda-feira o cara chega sem assunto no trabalho e vai fazer o quê? Vai trabalhar, é claro! Além disso, nos países asiáticos ninguém perde tempo olhando para a cara do colega para saber como ela é. E a explicação pode estar na mensagem que me enviaram pela internet, reproduzindo este diálogo ocorrido entre dois chineses: “Mestre, Shiatki, por que os ocidentais dizem que todos nós temos a mesma cara?”, pergunta o discípulo. “Eu não sou o mestre Shiatki”, responde o porteiro do prédio.

Quer dizer, em termos de produtividade ninguém tem moral para criticar os brasileiros. Esse rapaz, por exemplo, tem sete filhos e, quando faço cara de espanto ao ouvir tal confissão, se apressa em explicar que dele mesmo são somente cinco: dois são apenas da atual mulher, com a qual até o momento ele só é responsável por uma menina. Sobre a parte que realmente lhe cabe no aumento da população brasileira, declara que foi produzida com a parceria de diferentes senhoras. O primogênito, com a primeira namorada. A caçula, com a atual esposa, como já foi dito. O do meio com uma mulher que sumiu e deixou a criança com a irmã dele (“Que cria a sobrinha como se filha dela fosse”). Ainda teve mais dois, ambos com nove anos. “São gêmeos?”, pergunto eu ingenuamente.

Não é bem o caso. Deu-se que os bebês nasceram com três meses de diferença. Eu já tinha ouvido falar em casos de gêmeos que nascem com horas de diferença. Talvez até com dias seja possível. Mas meses?! Ele, no entanto, desfaz o mistério. Separou-se da mulher, com a qual não estava se entendendo, mas com a qual havia se entendido até pouco tempo antes, tanto que a deixou com um neném na barriga. E, como não é a favor de se viver sozinho, logo arrumou outra companheira que — surpraize! — imediatamente ficou grávida. Foi assim que, num espaço de três meses, tornou-se pai duas vezes, façanha que muitos homens levam anos para realizar e alguns nunca conseguem.

Agora pede que eu lhe arrume um biscate, pois uma ex está ameaçando entrar na Justiça para obter pensão alimentícia, sendo que ele mesmo está bem precisado de alimento. Sabe fazer tudo (principalmente filhos, penso eu): jardinagem, pintura, faxina. Quer trabalhar e, ainda que por palavras mais simples, garante que é muito produtivo. Trinta e quatro anos e sete filhos! Não tem dúvida de que produtivo ele é!

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Robério Canto

Escrevivendo

No estilo “caminhando contra o vento”, o professor Robério Canto vai “vivendo e Escrevivendo” causos cotidianos, com uma generosa pitada de bom humor. Membro da Academia Friburguense de Letras, imortal desde criancinha.

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