Ainda bem que eu sou Flamengo!

quarta-feira, 12 de novembro de 2014

Sem falar nos que põem a mão no fogo pela honestidade de Renan Calheiros, pela macheza de Clodovil e pela virgindade de Madonna

Sim, nisso eu concordo com você: cada um acredita no que bem quiser. Não faltam pessoas que já viram disco voador e até mesmo quem tenha conversado (em inglês, naturalmente) com seus tripulantes. Outro dia viajei ao lado de um respeitável senhor que me assegurou já ter estado pessoalmente com Jesus Cristo, o qual, aliás, lhe garantiu, ainda que por outras palavras, aquilo mesmo que prometera ao Bom Ladrão: “Teu lugar tá garantido no céu”. Isso sem falar nos que põem a mão no fogo pela honestidade de Renan Calheiros, pela macheza de Clodovil e pela virgindade de Madonna.

    Sim, cada um acredita no que quer. Ou no que pode. E talvez nosso maior equívoco seja acreditarmos em nós mesmos, quando o que mais fazemos é iludirmo-nos. Como diria aquele nosso conhecido, “estou convencido de que nunca antes na história deste país” as pessoas tiveram tão boa opinião sobre si mesmas, em contraste com o que pensam de todas as demais, que são uns falsos, mal-educados, desonestos e deselegantes. 

Embora devamos admitir que certas avaliações são corretas, e só não acreditam nelas os céticos doentios, ou quem vê a realidade pela ótica de espúrios interesses pessoais. Por exemplo: o presidente Lula disse que o sistema público de saúde no Brasil está próximo da perfeição.  Quem pode discordar? Não há de ser a velhinha que levanta de madrugada para apanhar ficha nos postos de saúde (e quando chega a vez dela, “acabou as fichas, minha gente. Volta amanhã"). Sim, quem pode discordar? O mosquito da dengue? A febre amarela? Os medicamentos que sumiram dos hospitais? Ora, são todos da oposição, fazem tudo para comprometer o bom conceito de que goza o governo junto ao povo em geral.

Acreditemos. É o que podemos fazer de melhor.  Por exemplo, no pecado. Há quem ache que não existe pecado do lado de baixo do Equador. Outros vivem como se ele não existisse também do lado de cima, ou nas laterais (se é que o Equador tem laterais). Estão bem desinformados. Você mesma, santa leitora, somente hoje já deve ter cometido pelo menos meia dúzia de pecados. Caso não se trate de uma leitora, e sim de um leitor, não dou por menos de uma dúzia, uma dúzia e meia. O pecado existe, pode crer. 

É certo que se fôssemos julgados de acordo com nossas faltas, estávamos ferrados. Mas também não exageremos. Vejam só: estava eu inocentemente ouvindo umas musiquinhas no rádio quando entra no ar um pregador iradíssimo. De que igreja? Nem adianta insistir que não vou responder. Não sou eu que vou começar mais uma guerra religiosa, isso é coisa que já tem demais neste mundo. 

O fato é que o homem botou a humanidade abaixo das botas daquele “cujo nome não se pronuncia”, tais foram as torpezas que nos atribuiu. Mas, provando que a salvação está ao alcance de todos, contou a história de sua própria conversão. Ainda que não dispondo dos recursos retóricos de tão grande orador, tento aqui reproduzir o seu discurso: 

“Eu também vivia no pecado, irmão! Mas encontrei a salvação, irmão! Hoje vivo longe do pecado, irmão! Desde que me converti, abandonei tudo que é coisa do demônio, irmão! Parei de fumar, parei de beber, irmão! Não ando mais atrás da mulher dos outros e deixei de torcer pelo Vasco, irmão!”

Nisso eu concordo com ele: é um pecado torcer pelo Vasco, quando se pode ser Flamengo!

02.02.08

TAGS:

Robério Canto

Escrevivendo

No estilo “caminhando contra o vento”, o professor Robério Canto vai “vivendo e Escrevivendo” causos cotidianos, com uma generosa pitada de bom humor. Membro da Academia Friburguense de Letras, imortal desde criancinha.

A Direção do Jornal A Voz da Serra não é solidária, não se responsabiliza e nem endossa os conceitos e opiniões emitidas por seus colunistas em seções ou artigos assinados.