Muitas nações, um só povo

terça-feira, 22 de maio de 2018

Caros amigos, na reflexão desta semana faremos memória às palavras proferidas na homilia da santa missa do último domingo, 20, para juntos agradecermos a Deus pelo bicentenário de fundação da cidade de Nova Friburgo. Um momento de júbilo e fraternidade.

Rendo graças ao bom Deus que nos permitiu estar juntos para comemorar os 200 anos da cidade de Nova Friburgo, tão emoldurada por suas belas montanhas e caracterizada por um povo de fé, simpático e de grande fibra. Assim como Jesus ordenou que os 11 permanecessem juntos para recepção do dom do Espírito Santo, estamos aqui unidos em oração com a Virgem da Conceição Aparecida, ao redor do altar, fazendo desta Praça do Suspiro um grande cenáculo.

Hoje (domingo, 20) a Igreja celebra a Solenidade de Pentecostes e com ela encerramos o tempo pascal, onde os nossos louvores nos conduziram a uma maior adoração e reconhecimento de Cristo Ressuscitado, vencedor da morte. Ao longo dos densos 50 dias fomos preparados para vivenciar o cumprimento das promessas feitas por Cristo aos apóstolos antes de ascender ao Pai: primeiro permaneceria com eles, neles e entre eles até o final dos séculos (cf. Mt 28,20) e depois os enviaria o Espírito Santo que sempre recordaria o que havia sido revelado (cf. Jo 14,26).

Os apóstolos tinham o costume de reunir-se na sala, onde transcorreu a última ceia (cf. Lc 22,12) e nos conta a Sagrada Escritura que eram concordes; rezavam com algumas mulheres, dentre elas Maria, a mãe de Jesus (cf. At 1,14), mas permaneciam com as portas fechadas até que numa manhã de encontro receberam a efusão do Espírito Santo. Escutamos na primeira leitura o relato detalhado do dia de Pentecostes, mas gostaria de me deter as consequências daquele forte evento e das línguas em forma de fogo na vida daqueles medrosos homens: a brisa fez desaparecer o que amordaçava a esperança, a luminosidade das chamas aqueceu os corações inquietos pela dúvida e as portas se abriram, mostrando o caminho que deveriam recorrer.

Assim devemos vivenciar a hodierna festividade e rezar pedindo que esta grande obra de Pentecostes aconteça com seus frutos em nosso coração e em Nova Friburgo, para que comemore os 200 anos de história, entre momentos alegres e difíceis, não nos reconhecendo como Babel, cujo relato da torre mostra que era composta por homens que desejavam construir uma obra maravilhosa por intermédio exclusivo de suas mãos e habilidades (cf. Gn 11, 1-9), mas como aquela Jerusalém que foi inundada pelas maravilhas vindas das mãos de Deus.

Se contemplamos o mosaico das dez colônias que formaram Nova Friburgo, podemos nos questionar sobre o segredo para o sucesso de uma terra abençoada e logo recordamos o episódio de Pentecostes. Longe de gerar confusão ou divisão, a diferença das línguas naquela descida do Espírito Santo era o justo e o necessário para que todos entendessem o projeto de Deus, ou melhor, era uma janela para que pudessem entender a recriação do mundo novo pelas mãos de quem o fez, conforme cantamos no salmo responsorial: “enviai o vosso Espírito, Senhor, e da terra toda face renovai” (cf. Sl 103).

Igualmente aconteceu com esta cidade, desde os suíços convidados pelo Rei D. João VI em 1818 até a última família de emigrantes, tudo poderia ser um caos, mas segundo a vontade de Deus as diferenças de cada nação, cultura e idioma que aqui se estabelecem fizeram surgir uma terra repleta de qualidades, virtudes e fé. O diferente complementa! Com fé, a diferença gera prosperidade.

Queridos amigos, a Igreja Católica, que sempre esteve vinculada à gênese deste povo pelos sacerdotes que vieram com os suíços, através da ereção da Igreja Matriz (hoje Catedral) que teve lugar no mesmo ato de emancipação do município ou por intermédio de outros feitos históricos, também renova com a vossa alegria o seu empenho apostólico pela salvação das almas e o anúncio do Evangelho a todos os cantos deste lugar.

Como nos disse São Paulo na Carta aos Coríntios (2ª leitura), os discípulos do Senhor que formamos a sua Igreja, estamos convidados como membros de Seu “corpo” (1 Cor 12,12) a partir dos nossos dons e qualidades, dos nossos diferentes lugares e serviços, a continuar o que Cristo começou com os primeiros que habitaram Nova Friburgo e deram a vida por muitos sonhos. Sonhar o crescimento desta cidade, não requer fechamento ou simples manutenção de um mínimo progresso ou de uma única forma evangelização. Sonhar o crescimento é projetar Nova Friburgo e seus talentos para o mundo; é traduzir a missionariedade do friburguense que deve transpor as montanhas sem perder a identidade; é traduzir na vida o bonito e eterno anúncio de Pentecostes.

A celebração deste aniversário deve gerar esperança porque o Espírito Santo nos concede luzes, força com a sua sabedoria e o discernimento de como avançar na defesa da família, da dignidade humana e na proteção dos mais necessitados – aqui presto minha afetuosa homenagem à Casa dos Pobres das Irmãs de São Vicente e ao Ambulatório Bento XVI – fazendo de Nova Friburgo a terra da caridade, a casa da fraternidade e o vale da solidariedade.

“Consolo que acalma, hóspede da alma, doce alívio, vinde”, as palavras que terminamos de escutar na poética sequência que antecedeu o Santo Evangelho, sendo o hino mais antigo ao Espírito Santo, são de uma beleza e verdade singulares, pois somos testemunhas de como o Paráclito com sua doce presença em nossa alma nos consola quando se aproximam as horas difíceis que abrasam como fogo, quando as lágrimas são enxutas e trocadas pelo contentamento da verdadeira alegria e quando é nosso descanso nas lutas o recomeçar.

Particularmente desde janeiro de 2011, Nova Friburgo vive mais fortemente a luta pelo recomeço e dá ao Brasil a incontestável prova de um povo temente a Deus e dócil ao Espírito Santo; pode passar por travessias difíceis como foram as da Arca de Noé, mas ao final sempre aparece a pomba branca com o ramo de oliveira, representando a paz.

Caros irmãos, sejamos íntimos ao Espírito Santo para não perdermos e cultivarmos a paz nos inúmeros recomeços da história. Ao desejar o sublime dom da paz aos apóstolos, no Evangelho agora proclamado, o Senhor soprou o Espírito sobre eles, para que nunca esquecessem o quanto a paz é um dom e uma tarefa humana. Como dom divino deveriam implorá-la através da oração e rechaçando o pecado em suas múltiplas faces, como tarefa humana precisariam buscar o bem para si e o próximo no corpo e na alma.

Tal como os apóstolos perseveraram unânimes com a presença materna da Virgem Maria, desejo de todo o coração, que nossa cidade continue sendo uma cidade mariana, de grande devoção à Imaculada Conceição, padroeira diocesana. De mãos dadas e contemplando o olhar de Nossa Senhora, receberemos um renovado impulso na fé para viver com Cristo e por Cristo, fazendo desta terra não somente a maior produtora de flores do Rio de Janeiro, mas particularmente de uma flor cujas pétalas são o perdão, a verdade e a justiça, pilares da paz e fraternidade.

Que São João Batista, o padroeiro da nossa cidade e padroeiro secundário de nossa Diocese, obtenha de seu primo Jesus as maiores graças para que nunca nos falte o empenho na construção de uma “nova” Nova Friburgo, renovada, aberta e digna a todos, onde resplandeça a bondade de Deus.

Amém.

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Dom Edney Gouvêa Mattoso

A Voz do Pastor

Buscando trazer uma palavra de paz e evangelização para a população de Nova Friburgo, o bispo diocesano da cidade, Dom Edney Gouvêa Mattoso, assina a coluna A Voz do Pastor, todas as terças, no A VOZ DA SERRA.

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