Colunas
Enfado e sofrimento
Um filme japonês de excelente qualidade, exibido muitos anos atrás nos cinemas brasileiros, que tive a oportunidade de assistir em uma fita cassete que aluguei em uma casa de vídeos, mostra de maneira clara e com um toque de ternura e sofrimento a solução daquela época para o idoso.
O titulo era “A balada de Narayama”.
Retrata com intensa dramaticidade os acontecimentos que envolvem uma família de uma pequena aldeia do interior do país, situada numa região montanhosa e de difícil acesso. A avó, que havia participado da criação de todos que ali se encontravam, agora muito idosa e incapacitada para qualquer tipo de trabalho e completamente dependente de todos, para tudo, sem nenhuma condição de cuidar de si mesma, colocava a família diante da dolorosa opção que a sociedade daquele tempo permitia para os idosos incapazes de qualquer atividade.
Levá-los para um local distante, com água e comida para alguns dias e lá abandoná-los para que morressem.
Assim eram as coisas por lá, e em muitos outros lugares pelo mundo afora, sem dúvida alguma.
Narayama era o nome da montanha para onde a idosa foi conduzida.
Os filhos mais velhos a levaram e, lá, a deixaram numa cena comovente. A idosa e os filhos não derramaram lágrimas, apenas se ouvia o ruído do vento frio nas pedras do local. Muitos anos antes, ela também participara de uma mesma situação quando conduziu seus velhos pais para sua última morada, naquele mesmo local.
Davam sorte aqueles idosos que morriam subitamente, antes que a idade os colocasse na posição de total dependência da família, para tudo, completamente incapazes de proverem sua própria subsistência.
Assim era a solução para aqueles que depois de servirem a sua comunidade, agora envelhecidos e incapazes de se cuidarem, se tornavam um fardo impossível de se carregar.
Os séculos se passaram, mas a natureza continua a mesma. Todos envelhecem e depois de uma vida inteira de trabalho e convivência familiar eis que se encontram em situação de total dependência dos mais jovens, para tudo.
Para a higiene pessoal, para se alimentarem e se vestirem, enfim, para tudo.
A sociedade e as leis evoluíram, mas mesmo assim o sofrimento de todos mudou pouco.
Para os filhos a convivência dolorosa e sofrida com aquelas pessoas que já foram tudo em suas vidas, que conhecem desde que nasceram e das quais receberam amor e proteção. Agora perdidas na velhice, na escuridão da demência, da incapacidade física, sofrendo de inúmeras doenças que acompanham o envelhecer.
Para os idosos pouco resta a desfrutar, com a exceção de poucos que ainda se mantêm com algum nível de consciência e conseguem interagir e se comunicar com os familiares. Muitos dizem que gostariam de morrer antes de chegarem naquela situação, mas isto não depende de suas vontades nem tampouco de se cuidarem melhor ou pior.
A vida é assim, desde que tudo começou neste planeta. As arvores, os animais, os humanos, tudo tem seu tempo de vida, tudo é atingido pelo desgaste do tempo, tudo envelhece.
A Bíblia, em sua gigantesca sabedoria, cita em trecho dos provérbios que “o homem foi feito para viver sessenta, setenta anos. Aos que vivem muito mais, restam o enfado e o sofrimento”.
Dr. Norberto Louback Rocha
A Saúde da Mulher
O ginecologista e obstetra Norberto Rocha assina a coluna A Saúde da Mulher, publicada às terças no A VOZ DA SERRA. Nela, o médico trabalha principalmente a cultura de prevenção contra os males que atingem as mulheres.
A Direção do Jornal A Voz da Serra não é solidária, não se responsabiliza e nem endossa os conceitos e opiniões emitidas por seus colunistas em seções ou artigos assinados.
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