Coisas da vida

segunda-feira, 30 de março de 2015

Passando no Hospital Unimed para visitar duas pacientes recém-operadas, encontrei num dos corredores uma velha conhecida a quem perguntei o que fazia ali. Respondeu-me que seu único filho estava internado com uma infecção nos pulmões. Pediu que se fosse possível eu o visitasse, pois ele era leitor assíduo da nossa coluna, e que desse uma força para o rapaz. De pronto concordei e garanti que iria passar pelo quarto dele. Fiz o que tinha que fazer e na saída fui visitar o rapaz. 

Lá chegando, encontrei um homem de seus quarenta e poucos anos, de aspecto frágil, muito magro, com dois tubos de oxigênio nas narinas, que já sabendo que eu prometera visitá-lo, disse: "Nem acreditei que o senhor viria, pois vocês médicos vivem correndo de um lugar para o outro". Falou com voz muito baixa e fraca e logo ficou calado, demonstrando grande cansaço. A mãe quebrou o silêncio e disse: "Ele tem uma doença grave e sem cura, já não fica um minuto sequer fora do oxigênio”. De novo falou o rapaz, com muita dificuldade e de forma lenta, mostrando grande cansaço pela dificuldade em respirar: "Fui um bom contador, durante muitos anos. Infelizmente, comecei a fumar aos 16 anos para atrair as garotas e me sentir mais velho, naquela época, todos os homens de sucesso fumavam, nas novelas e no cinema, todos os heróis fumavam e bebiam. Gostei do cigarro, me acostumei com ele e depois de um tempo não conseguia ficar sem. Eram muitos por dia, e piorava quando eu ficava nervoso, preocupado. Meu pai e os parentes no início falavam para eu parar, mas eu reagia mal, dizia que era com meu dinheiro que fumava, que a boca era minha e que ninguém tinha nada com isso e aos poucos as pessoas foram me deixando de lado, ninguém falava mais nada para evitar brigas. Hoje daria tudo para voltar no tempo e pedir perdão a todos, principalmente para meu pai, que já faleceu, e começar de novo uma vida limpa, sem o maldito cigarro, que me destruiu”. Para falar tudo isto ele levou um bom tempo, pois tinha que parar toda hora para descansar, mesmo com os tubos de oxigênio puro nas narinas. Ouvi em silêncio e com muita pena daquele jovem e sua mãe. Uma vida perdida, jogada fora junto com as pontas dos cigarros que fumou por anos seguidos. Segurei sua mão e desejei sorte. Se cuide bem, falei, siga todas as orientações do seu médico. Abracei a velha mãe, de corpo magro e rosto sofrido, e pensei comigo mesmo: "Pobre mulher. Em breve vai ficar sozinha na vida”.

TAGS:
Dr. Norberto Louback Rocha

Dr. Norberto Louback Rocha

A Saúde da Mulher

O ginecologista e obstetra Norberto Rocha assina a coluna A Saúde da Mulher, publicada às terças no A VOZ DA SERRA. Nela, o médico trabalha principalmente a cultura de prevenção contra os males que atingem as mulheres.

A Direção do Jornal A Voz da Serra não é solidária, não se responsabiliza e nem endossa os conceitos e opiniões emitidas por seus colunistas em seções ou artigos assinados.