Apenas

sábado, 12 de maio de 2018

Estamos nas vésperas de um dos dias mais importantes de ano, o dia em que reverenciamos a nossa causa de ser, em que nos voltamos a quem misturou seus ingredientes com o de um homem e nos fez do jeito que somos. Dia da Mãe. Dia da Mamãe.

Antes de começar a escrever, uma obra que desvela um drama bem corriqueiro, que pode existir em cada quarteirão da cidade e acontecer a qualquer mulher, tomou conta dos meus pensamentos: Éramos Seis, de Maria José Dupré, escrita em 1943.

Eu li o romance no colégio e nunca me esqueci dele. Volta e meia, me vinha à cabeça a imagem da Lola, a protagonista, uma mulher idosa, interna em um asilo, que se recordava da vida que teve com sua família; seu marido e seus quatro filhos.

Quando pré-adolescente, eu me sensibilizei, mas não entendia muito bem a existência da solidão e da perda. Na época, eu era cercada de avós, tias e mãe. Se bem que papai havia falecido, e mamãe estava novamente casada. Mas eu vivia em casas cheias.

Hoje, até com mais idade que meus avós tinham na época em que li o livro, sinto uma emoção que toma conta dos meus olhos, que precisam de óculos para enxergarem as coisas quotidianas, dos meus dedos já com as juntas inchadas que escrevem as palavras desta coluna, da pele marcada pelos anos e pela vida, com os pés apertados nos calçados por estarem mais largos. E um centímetro de altura mais baixa. É a emoção que sabe o que é perder um filho, ver a mãe ficando mais velha, aquela pessoa que sempre tive como certa nos meus dias, a minha amiga que me conhece pelo brilho dos meus cabelos. Ah, meus braços ainda sentem a primeira vez que aconcheguei meus filhos no colo; ainda sinto o calor dos corpinhos recém-nascidos no peito. Como foi bom ter tido uma filha mulher!

Agora, escrevendo esta coluna, só, na minha sala, e vendo o passarinho bater nas minhas janelas, eu me resgato, enquanto tantas mulheres que existem em mim, vivas em todos os momentos, todas são mães, netas e filhas. Que sou e que fui. Ao longo da vida, fui muitas pessoas; minhas características foram se transformando com o passar do tempo. Até hoje, meus ouvidos escutam a vovó me chamando, me dando, de lanche de “capitão”, café com leite e pão francês, cortado em pedacinhos com manteiga.

Não fui perfeita, nem a melhor neta ou a pior filha. Fui, apenas. Fui a mãe que as minhas mulheres me ensinaram a ser. E, da mesma forma, as mulheres que tive como avós, mãe e filha foram apenas.

Apenas é um advérbio de vários significados que representam a amplitude do sentimento amoroso: exclusivamente, com dificuldades e tão logo que. O amor entre avós, mães e filhos é único, não é totalmente manso, nem completamente rebelde, e o afeto brota tão logo o outro se faça presente. Muitas vezes, vovó correu atrás da gente, os netos, com o sapato do tipo anabela nas mãos.

Por todas nós termos sido e sermos apenas, fui e sou feliz. Enquanto fazemos ou fizemos parte da vida uma das outras, nossos elos foram e são intensos. Eternos.

Salve o Dia das Mães!

 

 

 

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Tereza Malcher

Tereza Cristina Malcher Campitelli

Momentos Literários

Tereza Malcher é mestre em educação pela PUC-Rio, escritora de livros infantojuvenis, presidente da Academia Friburguense de Letras e ganhadora, em 2014, do Prêmio OFF Flip de Literatura.

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