Márcio Madeira
Existem diversos conceitos a respeito do que realmente significa vencer na vida, variando conforme os anseios de cada pessoa. Todavia, para a maioria dessas definições, o nome de Heloísa Assis pode servir não apenas como exemplo, mas também como expoente. Empregada doméstica e babá há pouco mais de vinte anos, Heloísa — ou Zica, como prefere ser chamada — é hoje responsável por empregar cerca de duas mil pessoas, e acaba de ser eleita pela Forbes como uma das dez mulheres de negócios mais poderosas do Brasil. Sua empresa, a Beleza Natural, há alguns meses vem sendo estudada pela Universidade de Columbia, em Nova York, como exemplo de gestão de operações.
Tão importante quanto o sucesso obtido, no entanto, é o caminho trilhado até ele. Foi o filósofo alemão Walter Benjamin quem afirmou que autores escrevem os livros que gostariam de ler e que não encontram nas bibliotecas. Sobre Zica, o mesmo poderia ser dito. Dona de uma vasta cabeleira crespa, tudo que ela queria era encontrar uma forma de aproveitar os cachos da melhor forma possível, sem recorrer ao caminho descaracterizante do alisamento.
Sempre disposta a aprender e criar, durante dez anos ela fez experiências no próprio cabelo — e no do irmão, a quem, brincando, chama de cobaia — em busca de um produto que garantisse o resultado desejado. Por conta disso, Zica nunca teve dificuldades para entender os anseios de seu público-alvo, uma vez que ela própria buscava os mesmos efeitos. Após dez anos de tentativas, uma fórmula-base foi finalmente atingida e patenteada, dando origem ao que hoje é uma rede de institutos especializados em cabelos crespos e ondulados, que não para de crescer e mantém convênios com importantes universidades do Brasil, dando continuidade à vocação inicial de produzir conhecimento conforme os interesses deste público bem definido.
Em visita a Nova Friburgo, onde palestrou no fim de semana, Zica falou com exclusividade para a reportagem de A VOZ DA SERRA.
A VOZ DA SERRA: O que você fazia antes de fundar o Instituto Beleza Natural?
Zica: O meu primeiro emprego foi como babá, mas também fui empregada doméstica, faxineira, lavadeira... E assim foi a minha adolescência toda. Eu não tinha o sonho de ser empresária não. Eu só queria ter um cabelo bonito, sem precisar alisar.
AVS: Quer dizer, você acabou se tornando empresária simplesmente porque a empresa que você buscava ainda não existia?
Zica: É isso mesmo. O mercado não oferecia nada para cabelos crespos e ondulados naquela época. Só alisamentos, como hoje a escova progressiva. E eu tinha o sonho de ter meu cabelo com balanço, brilho e maleabilidade, sem perder os cachos. Meu cabelo era muito volumoso! Meio metro para cima, meio metro para o lado, black power mesmo. Mas quando ele molhava, ele balançava, então era uma questão de entendê-lo melhor, e usar os produtos certos.
Eu passei dez anos experimentando, e não foi fácil. Muitas experiências deram errado, até que eu finalmente cheguei a uma fórmula que funcionou como eu queria. Essa foi a base para o Super-Relaxante, que hoje é um serviço completo procurado por cerca de 90 mil mulheres todos os meses, no qual cada cliente passa pelas mãos de sete profissionais como numa linha de montagem. Eu consegui registrar a minha fórmula, que foi posteriormente trabalhada por nossa equipe de químicos e enriquecida com vários nutrientes que eu não tinha como acrescentar naquela época.
AVS: Essa evolução química dos produtos utilizados reforça a impressão de que sua empresa sempre dedicou muita atenção a pesquisas e à produção de conhecimento. Atualmente, além da fábrica própria, vocês têm convênio com algumas das mais importantes universidades do Brasil e do mundo, e também um setor próprio de pesquisas. Sob o ponto de vista empresarial, qual a importância de controlar todo o processo produtivo?
Zica: É importante não perder o foco. Nossa preocupação sempre foi a de criar e desenvolver produtos para esse público específico, e depois elaborar as melhores formas para que o serviço pudesse ser prestado. Com tudo isso em mente, as coisas aconteceram de forma natural. Se o mercado não oferece os produtos que buscamos, então nós mesmos os criamos. O Instituto Biorio e a UnB estudam os vários tipos de fio que existem, e então nosso laboratório de pesquisa e desenvolvimento, que conta com seis químicos, desenvolve os produtos a partir dessas informações. É uma evolução constante, e com isso temos várias vantagens, não apenas financeiras. O mais importante é poder garantir a qualidade e a padronização de cada etapa da empresa.
AVS: Olhando os endereços dos institutos a gente observa que vocês dão muita atenção a bairros periféricos e a cidades de interior. Qual sua opinião sobre as possibilidades de bons negócios longe dos grandes centros?
Zica: A gente vai onde nosso público está. Nós sabemos de caravanas que saem de lugares mais afastados somente para que as mulheres possam fazer o cabelo, então nós buscamos ir a esses lugares. E acaba sendo um benefício completo para essas áreas que mais precisam, não só pelo serviço prestado, mas porque cada instituto que a gente abre gera mais cem empregos imediatamente. Alguns chegam a gerar 180 vagas. Não importa se é uma cidade pequena ou um bairro de periferia. Onde existem cabelos crespos e ondulados nós queremos estar. Nós buscamos levar autoestima às pessoas, tanto através da beleza quanto através da possibilidade de trabalho.
AVS: Sobre essa questão do emprego, cerca de 80% de seus funcionários já eram, antes, clientes do salões. Por que essa opção?
Zica: Nós entendemos que a melhor forma de padronizar os serviços e ter funcionários que vistam a camisa da empresa é através da contratação de clientes, porque essas são pessoas que acreditam no nosso trabalho. E valorizamos também a oportunidade do primeiro emprego. Não nos preocupamos com experiência, porque temos um centro de formação. Damos oportunidade a quem precisa e quem quer trabalhar, e preparamos essa pessoa para que os serviços sejam prestados da mesma forma em todos os nossos institutos. Com um detalhe: primeiro nós contratamos, e depois damos o curso. A pessoa já recebe enquanto estuda.
AVS: Existem planos para abrir um instituto em Nova Friburgo?
Zica: Com certeza! Estamos trabalhando para isso.
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