Mario de Moraes
O ponto alto dessas festividades é, sem dúvida, a comemoração do dia 24 de junho, dedicado a São João. No passado o céu se enchia de balões e, à noite, era difícil contar as luzinhas lá em cima. Atualmente, os balões são proibidos por causa dos incêndios, mas a tradição das fogueiras ainda ilumina as noites juninas e embeleza os festejos dedicados a Santo Antônio (o santo casamenteiro), São João e São Pedro que seguem até o fim de junho.
Em Portugal. o culto a São João é um dos mais antigos e populares. Foram os portugueses que introduziram, em nosso país, as festas joaninas (de João) ou, mais popularmente juninas (de junho). Elas começam na véspera de Santo Antônio (dia 13) e acabam no dia 29 (São Pedro)
Se recuarmos bem no tempo vamos descobrir que os europeus, antes mesmo do nascimento de São João, já acendiam imensas fogueiras comemorando a chegada do Sol e do calor. E através de cultos pagãos agradeciam a boa colheita e a fertilidade.
No século VI, o Vaticano transformou o 24 de junho numa comemoração cristã, festejando o nascimento de João, que batizou o Cristo. No século XIII, Portugal acrescentou mais duas datas festivas: o nascimento de Santo Antônio de Pádua e o dia da morte de São Pedro.
Dos salões para as ruas
As quadrilhas juninas, no entanto, nasceram por volta dos séculos XIII e XIV, na Inglaterra. Com a guerra dos Cem Anos, entre a França e a Inglaterra, houve uma transferência cultural entre os dois países. Os franceses adotaram a quadrilha e a introduziram em seus palácios, transformando-a numa dança nobre. De lá, ela se irradiou para toda a Europa, passando a ser quase obrigatória nas festas da nobreza.
No Brasil, as festas juninas foram trazidas pelos portugueses e logo os índios e os escravos aderiram a elas e as levaram para as ruas. Em 1808, com a chegada da família real portuguesa, a coisa sofisticou-se e tomou maior vulto. Na época, os casais bailavam trocando o par. A ralé, que observava as evoluções às escondidas, gostou do que viu e levou a contradança para as festas populares, onde ela passou a fazer sucesso em casamentos, batizados e, principalmente, em festas juninas.
A quadrilha perdeu prestígio no final do século XIX, quando foi desbancada por outras danças, como o maxixe, a polca e o lundu. No entanto, não desapareceu, continuando a ser dançada em regiões mais conservadoras, como na zona rural.
A tradição se mantém até hoje em cidades do interior ou nas periferias das metrópoles, como nas escolas. Nestas, procura-se reproduzir uma festa caipira, com os estudantes dançando a quadrilha vestidos com os trajes típicos, alegrando-se com as brincadeiras e se fartando com os deliciosos comes e bebes.
O animador da quadrilha utiliza uma pitoresca mistura de português e francês atravessado. Quando ele deseja que os pares avancem para o centro do salão e se cumprimentem com um aceno de cabeça, grita: “cumprimenta vis-a-vis. Avan, tu !”. Para que eles voltem aos seus lugares, “anarriér !”. Na animação maior solta expressões como “balance !”, para ordenar aos pares, depois de se separarem, balançarem em seus lugares. O brasileiro, sempre criativo, terminou transformando a quadrilha francesa numa dança com características bem nacionais.
Casamento e guloseimas
Durante as festas juninas são realizadas diversas brincadeiras, mudando um pouco de região para região no país. Uma delas, presente em quase todos os lugares, é o pau de sebo. Existem outras, como pular a fogueira, a pescaria e as corridas da porca untada e dos sacos de estopa.
O ponto alto, no entanto, é o casamento na roça. Todo grupo de quadrilha possui um casal de noivos, já que a festa é realizada em sua homenagem. Com poucas variações. A história do casamento na roça é sempre a mesma. A noiva grávida é obrigada pelos pais a casar-se com quem lhe fez mal. O rapaz tenta escapar do laço e o pai da mocinha chama o delegado que, armado com um trabuco, leva o teimoso ao altar. Em algumas regiões do Brasil, o casamento na roça também é conhecido como casamento matuto ou casamento caipira. Além dos noivos, dos pais dos noivos e do delegado, desfilam outros e impagáveis personagens, como o padre, o coroinha, os padrinhos e os ajudantes do delegado.
O personagem mais comum das festas juninas nasceu nas comemorações no interior de São Paulo e Minas Gerais. Foi lá que surgiu o falso caipira de chapéu de palha, calça remendada, camisa xadrez e dente cariado, quase sempre acompanhado de uma Maria Chiquinha. Também são originárias dessas regiões a maior parte das comidas típicas, como o pé de moleque, a canjica, o curau, a pipoca e o quentão (infusão de vinho ou aguardente, com gengibre, limão, cravo e canela). Existem muitas outras guloseimas, como o arroz-doce, o bolo de canela, o bolo de mandioca e também a deliciosa batata doce assada na brasa da fogueira. Deu vontade? Então, vamos pular a fogueira!
Disputa entre Caruaru e Campina Grande
Há muitos anos duas cidades do Nordeste brigam para promover a maior festa junina do Brasil. Caruaru, em Pernambuco, e Campina Grande, na Paraíba. Mas não estão sós. Na cidade satélite de Taguatinga, próximo a Brasília, o Arraiá do Povo constitui-se na mais animada festa do Centro-Oeste. No Rio Grande do Sul, onde os caipiras vestem bombachas remendadas, a tradição está presente no Vale do Rio Pardo, onde os festeiros andam sobre a brasa da fogueira.
As festas juninas de Caruaru ficam concentradas no Pátio dos Eventos e as de Campina Grande, no Parque do Povo. Embora, em grandiosidade, os festejos de Caruaru sejam menos imponentes do que os de Campina Grande, eles são mais intimistas e atraentes. Os organizadores fazem questão, por exemplo, de manter o mamolengo, um teatro de improviso, bandas de pífaros e emboladores.
Caruaru é conhecida como a capital do forró. Segundo a prefeitura local, no mês de junho, é feito um grande investimento na cidade, que alcança alguns milhões de reais. O comércio, durante o período das festas juninas, cresce em média 60%, e os hotéis, bares e restaurantes em 80%. Sem falar na arrecadação de impostos, que cresce 40%. No ano passado, Caruaru recebeu mais de 1 milhão de turistas.
Campina Grande é a maior cidade do interior do Nordeste, com mais de 500 mil habitantes. No mês de junho a cidade recebe, no Parque do Povo, todas as noites, mais de cem mil pessoas, que dançam até o dia amanhecer. Os cerca de 2.000 leitos da rede hoteleira da cidade ficam ocupados.
Ao contrário do que acontece nas festas juninas do Sul e Sudeste, a turma que dança a quadrilha em Caruaru e Campina Grande veste-se de forma luxuosa e com muito bom gosto. Para que se tenha uma idéia do que isso significa, o comércio local de tecidos vende bem mais do que em época de Natal.
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