Uma cidade em reconstrução a cada dia

Nove anos depois, A VOZ DA SERRA visita locais que receberam melhorias após a destruição causada pelas chuvas de 2011
sábado, 11 de janeiro de 2020
por Guilherme Alt (guilherme@avozdaserra.com.br)

 

A tragédia de 2011 é um marco temporal em Nova Friburgo e na vida de seus moradores. E não é para menos. A maior catástrofe natural do país vitimou milhares de cidadãos – entre mortos e feridos – e destruiu outras centenas de casas e ruas. Até hoje, o município sofre com os reflexos daquele fatídico 12 de janeiro e eles podem ser vistos na expressão de cada morador em dia de chuva forte ou pode ser constatado nos alagamentos a cada temporal.

Nove anos depois, ainda há muito o que ser feito. Apesar disso, muitos lugares atingidos em cheio foram completamente reconstruídos e é esse o enfoque desta reportagem. Nossa equipe visitou os locais mais emblemáticos atingidos pelas fortes chuvas e que hoje são exemplos de que é possível dar a volta por cima.

Praça do Suspiro

No Centro, a Praça do Suspiro, por ter um dos pontos turísticos mais conhecidos – o Teleférico – foi o símbolo da destruição da cidade. A imagem que rodou o mundo com a encosta do Morro do Cruz deslizando ainda está na memória de muitos brasileiros. A avalanche atingiu a igrejinha de Santo Antônio, o anfiteatro, o estacionamento do Teatro Municipal Laercio Ventura, o Tiro de Guerra, residências nas redondezas, além do próprio teleférico.

A Praça do Suspiro, recebeu obras ainda naquele ano e foi totalmente recuperada. Dois anos depois foi a vez da capela de Santo Antônio ser reaberta. Em 2014, o teleférico voltou a funcionar, mas somente o primeiro estágio. Somente em 2017 o segundo estágio foi liberado, assim como o anfiteatro.

Rua Cristina Ziede

Ainda no Centro, na Rua Cristina Ziede, outro ponto emblemático marcou e chocou a cidade: a queda de parte de um prédio em uma área nobre, além do deslizamento de uma encosta que destruiu casas e grande parte da rua.

O deslizamento atingiu todos os andares do prédio e destruiu apartamentos e uma cobertura do bloco B. A partir de então, a bucólica rua se transformou em um mórbido “ponto turístico” para muitas pessoas que vinham à cidade em busca de evidências da maior catástrofe climática registrada na história do país.

O local tornou-se simbólico para o município e recebeu até a visita da então presidente Dilma Rousseff no dia seguinte à tragédia. No entorno do prédio, sete casas foram soterradas e 22 pessoas morreram.

A rua rapidamente se reergueu, mas algumas casas demoraram para ser liberadas pela Defesa Civil. Uma das casas que permaneceram de pé hoje dá lugar a um famoso e frequentado pub que reúne diversos ambientes descolados como tatuagem, barbearia, estúdios de piercing, além de um bar com estrutura para apresentações de artistas locais. O prédio atingido foi totalmente liberado em 2019.

A encosta também recebeu obras de contenção. Por ser muito grande e ter deslizado em diferentes pontos, perto dali, a obra de contenção também contemplou outra parte da mesma encosta dando mais segurança para moradores e donos de estabelecimentos da região.

Córrego Dantas

O bairro Córrego Dantas foi o local mais atingido pelas chuvas. Queda de rua, ruptura de manilhas, deslizamentos de encosta, desplacamento de pedras, centenas de mortos, feridos, desabrigados e de casas condenadas. Esse era o cenário em 2011. Por conta da força da comunidade, o local hoje faz parte do Plano Diretor friburguense e é reconhecidamente um dos locais que mais se reergueu, enchendo de orgulho os cerca de três mil moradores.

Sandro Schottz, presidente da associação de moradores local, acompanhou a nossa equipe pelo bairro, destacou os locais atingidos que hoje estão totalmente recuperados e falou do orgulho de uma população, antes devastada pela tragédia. “Nos primeiros dias as notícias que chegavam eram as de que o bairro estava acabado e que todos deveriam sair daqui. Isso causou uma tristeza muito grande nas pessoas. Houve uma mobilização, além de uma metodologia de trabalho que possibilitou nos organizássemos, chamando a atenção do poder público, além de sensibilizarmos a opinião pública para atrair recursos e assim iniciar o processo de reconstrução do bairro”, disse. 

O que foi reconstruído?

Sandro Schottz informou tamém que os serviços foram reestabelecidos, foram  reconstruídos os acessos ao bairro; o transporte público que estava paralisado voltou a trafegar e as redes de esgoto e pluvial foram normalizadas. Algumas pontes danificadas também foram reconstruídas no Córrego Dantas. “Tivemos uma grande obra de contenção na encosta do bairro. As manilhas de muitas ruas estouraram e várias vias cederam, hoje elas estão pavimentadas, com calçamento novo e manilhas noivas”, listou Sandro.

Todas essas conquistas foram fruto de muita insistência da comunidade. Para atrair os olhares do poder público era preciso unir os moradores. “A gente conseguiu um bom número de pessoas para fazer uma mobilização. Sabemos a dificuldade que é para conseguir os recursos necessários junto ao poder público. Muito dessa reconstrução se deve aos moradores de Córrego Dantas que se uniram. A sociedade civil também se uniu para nos ajudar e através de uma pressão conseguimos atrair obras importantes que foram realizadas pelo poder público”, observa Sandro. 

A pressão foi tão grande e surtiu tanto efeito que a localidade, antes não reconhecida como bairro, atualmente faz parte da divisão territorial do município e está incluída no Plano Diretor. A localidade também recebeu uma das diversas sirenes da Defesa Civil que alertam os moradores em situação de risco para se abrigarem em pontos de apoio.

“Aqui era uma área de expansão controlada com empreendimentos empresariais e agora já participamos da revisão do Plano Diretor e somos reconhecidos como um bairro de verdade. Somos agora uma comunidade que está organizada e estruturada por melhores condições de vida” orgulha-se, Sandro.

Ainda de acordo com Sandro Schottz, Córrego Dantas tem uma história de engajamento antiga. Os pilares das lutas sociais dos primeiros líderes da localidade abriram espaço para que outros moradores desempenhassem um papel fundamental para o crescimento ordenado do bairro. “Há uma constatação de que Córrego Dantas tem uma história de engajamento de trabalho social, atuando em comunidade. Surgiram novas lideranças que se articularam para possibilitar ao local ter uma nova visibilidade. A tragédia fez com que os olhos se voltassem para nós, mas o pós tragédia fez com o que nós continuássemos sendo vistos, por conta do trabalho social, realizado pela comunidade. Nós começamos a ocupar páginas de jornal, muitas reportagens foram feitas conosco e as pessoas começaram a conhecer a localidade. Passamos a ter a admiração de muitas pessoas que prezam pelo trabalho comunitário. Não queremos voltar ao que éramos, queremos, daqui pra frente, a ser ainda melhores”, desejou o presidente da associação.

 

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TAGS: Clima | obra
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