Era um tempo negro, de ditadura, e ele na cidade imperial – a única das Américas – ao mesmo tempo em que Leonardo Boff cuidava das crianças na Favela do Lixo – dando-lhes comida e alento –, com a fé que cria resistência para a não desistência da vida: “sem tirar o necessário aos santos e desprezados urubus”, diz João.
Ali viviam, tirando o sustento no lixo, crianças, mulheres e homens, que seriam a matriz e modelo do Brasil para o mundo de que dignidade aos pobres está na base da mensagem de Jesus e “que deve ser praticada – não só falada, ou televisada”, alfineta João.
Nascia ali na prática a Teologia da Libertação (segundo a ONU, a única novidade no mundo dos anos 80), e João Carlos Moura, esse verde radical e original (depois contamos abaixo), estava ao lado de Boff, em Petrópolis, onde morava. Logo depois nascia o PT, com o seu eminente ex-operário – hoje o presidente Lula, que tinha em Boff e Frei Betto as ideias bases para elaborar e criar um partido que visse, sobretudo, os pobres, sem tirar dos ricos.
Fernando Henrique Cardoso chegou perto de Frei Betto e propôs que fizessem um partido só. Frei Betto disse “não, nosso objetivo é outro, é o pobre”. Dito e feito, FHC, presidente, fez “políticas pobres para o pobre e políticas ricas para os ricos”. João cita a frase do discurso de Boff para Dilma no Rio, na entrega do Manifesto dos Intelectuais de apoio à sua campanha (está no respublicabrasil.com, jornal que João criou e edita).
João viu tudo (anos 80 ainda), participou de tudo e tinha um “padrinho” a lhe estimular também na busca espiritual: seu mestre e amigo, o psicanalista Hélio Pellegrino, fundador do PT.
João é radical e está na base originária do PV. Ele lembra que “o termo radical deveria ser compreendido como é: ir à raiz do problema (relativo ou pertencente à raiz ou à origem; original) original (que provém de ou constitui a origem, o início; originário, primitivo) também”.
Assim é João Carlos Moura, este agora também cidadão de Nova Friburgo, além de cidadão de Vila Isabel, onde nasceu, no Rio de Janeiro.
João Carlos Moura funda o PV no Brasil
Antes de filiar-se ao PV e ter seu nome na ata de fundação, João já era considerado pelo Jornal do Brasil um dos pioneiros da luta ecológica no país (em 1972). Gabeira, Minc e Sirkis estavam no exílio e João já brigava pela preservação de Petrópolis, no começo, sozinho.
Quando arquitetaram fundar o Partido Verde, lá estava João, já um “ameaçado” defensor da natureza (Chico Mendes seria assassinado depois no Acre, terra de Marina, agora no PV). E para ele “o ser humano não pode morrer de fome entre tanta terra, natureza pródiga, água, fartura e capacidade de multiplicação das alfaces”, segundo diz.
Outra vez diante de Leonardo Boff, João dizia estar cansado dos verdes, que não amadureciam nunca, e assinou a ficha de filiação ao PT. Era ainda a ditadura e João teve duas tentativas de morte (assunto para um livro que faz).
Verde por vocação (do latim vox = voz interior), João Carlos Moura esteve em praça pública com cartaz quando houve vazamento da radiação da usina atômica de Chernobyl na Rússia (1986), em conversas com o paisagista Burle Marx, com o urbanista Lúcio Costa (o criador de Brasília), sempre tratando de assuntos ligados à preservação e à qualidade de vida no Brasil.
Nunca fez isso por interesse partidário ou profissão, mas por paixão. Seria o primeiro secretário de Meio Ambiente no Brasil, mas recusou-se, porque “a corrupção já dava má fama para quem o convidou, e era um prefeito muito conhecido”, diz. Recusou o convite. E Ética (“com E maiúsculo”, acentua) é, para ele, tão importante que, ao receber de Boff o Manifesto dos Intelectuais pró-Dilma, para assinar entre os primeiros (Oscar Niemeyer, Chico Buarque, entre outros), João se recusou a assinar. Para espanto de Boff, João disparou: “Só assino se constar que a ética é para todos”.
O documento foi então totalmente modificado, “para a zanga de Boff, meu irmão mais velho”, que depois deve ter entendido e o modificou todo. “Além disso, tinha o que João chama de “vários jargões já gastos na política” e que, segundo ele, “não mostrava a criatividade dos que assinavam”.
E, assim foi feito. E então “Boff fez um discurso dos mais bonitos até hoje feitos no Brasil”, no Rio, pró-Dilma, na entrega do manifesto (está no respublicabrasil.com, que João criou e edita na internet).
Caetano Velloso, em Búzios, disse a João que ele “era ecologista por culpa”, depois que João contou que matava passarinhos na infância, caçava borboletas para colecionar e pegava peixinho no açude da Fábrica Confiança, da música O apito, de Noel Rosa, contemporâneo do pai de João Carlos Moura em Vila Isabel. Bom, mas isso já é outro assunto...
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