“Os que não se lembram do passado
Estão condenados a revive-lo”
(Santayana)
As chuvas que assolaram as cidades da Região Serrana fluminense, em especial Nova Friburgo, ainda impressionam pelo poder de destruição. Além dos problemas tradicionais que a cidade enfrenta com as chuvas nessa época do ano, áreas de Mata Atlântica nativa, como o Morro da Cruz, situado atrás do Colégio Anchieta, também sofreram sérios deslizamentos.
A chuva que se abateu sobre Nova Friburgo entre os dias 11 e 12 de janeiro foi espantosa: de 21:00h até 5:00h desceu dos céus uma quantidade muito acima do normal de água, além de raios que caiam constantemente. Noite de horror, que deverá marcar nossos corações e mentes, para o resto de nossas existências. As estatísticas, os relatórios, poderão um dia concluir sobre o número de mortos, de desaparecidos, de desabrigados, porém nunca conseguirão contabilizar as horas do pavor, do medo, do desespero das pessoas. Ambientalistas, engenheiros, arquitetos, geólogos, de imediato acorreram para a emissão de laudos sobre as causas da tragédia. Sem dúvida, as avaliações técnico-científicas ajudam muito no entendimento do problema e suas causas naturais. No entanto, creditar à Mãe Natureza toda essa tragédia é, no mínimo, reduzir o problema ao acaso. Se o problema tem forte componente natural não podemos, entretanto, apenas naturalizá-lo, sob pena de entende-lo parcialmente. Sejamos radicais. Em Nova Friburgo as enchentes e a tragédia têm história.
Os meses de janeiro são sempre preocupantes em Nova Friburgo. Já em sua chegada, em janeiro de 1820, os primeiros colonos suíços foram surpreendidos pela força das chuvas, enfrentando a primeira enchente da História da então criada Freguezia de S.João Batista de Nova Friburgo. Em distintos momentos e por volta de meados do séc.XIX, os viajantes europeus H. Burmeister e J.J. Tschudi registraram em seus diários os desconfortos provocados pelos alagamentos e enchentes decorrentes das chuvas de verão na região. Já em tempos republicanos, Galdino do Valle Filho, tradicional político friburguense da primeira metade do século XX, publicou Lendas e Legendas de Friburgo onde há, além de uma crônica sobre enchentes, uma fotografia do transbordamento do rio Bengalas em 1920. Contam ainda no século passado tragédias em decorrência das chuvas nos anos de 1938, 1945, 1978, 1979, 1996. Em 2007, mais uma vez Nova Friburgo passou o mês de janeiro tirando a lama dos sapatos, contabilizando os deslizamentos e contando os seus mortos. Em Nova Friburgo a catástrofe, a tragédia, a enchente, têm história. Só as elites políticas não a consideram.
Na ficção de Garcia Marques, a cidade de Macondo foi um dia condenada a Cem anos de Solidão. A realidade concreta de Nova Friburgo parece ter sido condenada a 200 anos de catástrofes, resultantes do conluio entre a natureza em fúria com histórica insensibilidade social de nossas elites.
João Raimundo de Araújo – Historiador
Agnes Weidlich - Historiadora
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