Carlos Emerson Junior
Somos um bando de irresponsáveis? No ótimo artigo “Cultura da Irresponsabilidade”, publicado no O Globo sobre a tragédia de Santa Maria, a escritora Rosiska Darci de Oliveira, sem meias-palavras indaga: “De onde vem o desprezo pela lei, a ojeriza à ordem? Por que no Brasil as leis não pegam e as normas não se cumprem? Por que achamos tanta graça na transgressão?”.
Pois é! Lembrei que achamos normal viajar em um ônibus em péssimo estado de manutenção. Aliás, na única vez que vi a fiscalização apreender um coletivo que estava com os pneus carecas, poltronas quebradas, banheiro imundo e o ar-condicionado apenas ventilava, metade dos passageiros resolveu protestar contra o “rigor excessivo” e o atraso que a viagem sofreria.
Quantas vezes ignoramos ou até mesmo avalizamos uma irregularidade? Centenas de acidentes são provocados no Brasil, por motoristas embriagados ou drogados. E já que estamos falando nisso, é bom tem em mente que o desrespeito às regras mais básicas de educação e trânsito provoca cerca de 43 mil mortes por ano, quase três vezes mais do que a guerra civil na Síria.
E aquela turma que joga lixo em tudo o que é lugar, menos na lixeira? Se não estou enganado, aqui mesmo em Nova Friburgo, no ano passado, retiraram 60 pneus de dentro do Rio Bengalas, uma completa violência ao meio ambiente e aos moradores. No inverno cansamos de assistir nossos morros em chamas provocadas por queimadas, um crime ambiental, como todos estão cansados de saber!
Irresponsável, meus caros, foi quem armazenou botijões de gás em um restaurante no centro do Rio de Janeiro, que explodiram, destruíram o imóvel e mataram duas pessoas que deram o azar de passar pela calçada na hora. Irresponsável foi quem deixou de fazer a manutenção de um brinquedo em um parque de diversões em São Paulo, enlutando a família de uma menina. Ou quem autorizou a grade fora das especificações na varanda de um hotel, que acabou provocando a queda de um bebê do terceiro andar.
Novamente aqui a Rosiska coloca o dedo na ferida: “O desprezo pela ordem vem do fato que ninguém teme a lei, porque acredita—e não sem fundamento—que sempre se encontrará uma maneira de contorná-la, uma propina, a influência de um amigo, o favor de um político. A história da corrupção se enreda na história da transgressão e a explica”.
Reclamamos muito da omissão das autoridades, seu descaso, negligência e corrupção. No entanto, parece que esquecemos que achando graça, ignorando as leis e tentamos burlar a fiscalização com propinas, seremos cúmplices dessas tragédias que tanto nos horrorizam. A melhor forma de solidariedade, qualidade marcante de todos os brasileiros, será não permitir que a dor das famílias de Santa Maria tenha sido em vão.
Nunca mais.
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Dizem que a cabeça de um escritor é muito mais fértil do que a realidade mas, de repente, a vida sempre nos pega completamente desprevenidos. Nesses quase dois anos colaborando com o jornal A Voz da Serra, nunca imaginei que ia escrever sobre o falecimento de uma das pessoas mais queridas de Nova Friburgo.
Fui apresentado ao Laercio Ventura em um café, ali na Ariosto Bento de Mello. Sorridente, ele passou o braço cima de meus ombros e com o ar de galhofa perguntou para a nossa editora-chefe, em alto e bom tom:
— Ah, esse aqui é o Carlos Emerson, aquele que quando manda a crônica dá uma trabalheira enorme para o pessoal da revisão?
Todo mundo caiu na gargalhada, inclusive eu, fazer o quê, não é? Lamentavelmente, conheci muito pouco esse grande friburguense e sua luta para manter um jornal no interior do estado. Nova Friburgo deve—e muito—ao Laercio Rangel Ventura, a distinção de ser um dos poucos municípios brasileiros a ter um Jornal (com maiúscula mesmo) tão tradicional e importante como o A Voz da Serra.
carlosemersonjr@gmail.com
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