“Você tem alguma edição de Sabrina?”, pergunta uma cliente, referindo-se à clássica coleção de romances folhetinescos que há anos podem ser encontrados em bancas de jornais. “Não, vendemos todas. Mas volte daqui a uns dias, pode ser que tenha alguma coisa”, responde Heloísa do Nascimento Barroso, que trabalha no Sebo Friburguense Lar Abrigo Amor a Jesus há cerca de nove meses.
Assim é a rotina de um sebo. Livros, discos, quadrinhos. Tudo é motivo de compra, venda, troca, negociação e até de doações. Há sempre alguém interessado em algo que outro não quer mais. Também há aqueles que preferem manusear um livro usado, que veem com bons olhos, e até um certo romantismo, as marcas deixadas pelo antigo proprietário. Anotações, amassados, orelhas, bilhetes de amor perdidos entre as páginas, fotos antigas, tudo isso pode ser capaz de envolver o leitor. É o charme a mais de comprar num sebo.
E há o preço, claro! É possível encontrar livros em perfeito estado, muitas vezes em seu idioma original, com preços que vão de R$ 1 a R$ 200. Tudo depende do estado de conservação, da raridade do material, da procura e da oferta.
Um museu entre as páginas
No Sebo Friburguense há um espaço reservado para fotos, notas fiscais, cédulas invalidadas, bilhetes carinhosos, todos encontrados dentro dos livros do estabelecimento, esperando por seus donos aparecerem e reclamarem suas lembranças perdidas.
O espaço, que foi completamente doado, assim como seu acervo, pelo antigo dono – só precisam pagar o aluguel do imóvel –, vive inteiramente de doações, que não cessam de acontecer. Para os carros que param na porta, com motoristas perguntando se aceitam doações, Heloísa já tem até uma frase feita: “Aceitamos, agradecemos e abençoamos”.
O Sebo Friburguense tem dois pisos, onde os fregueses podem encontrar um espaço para estudos, livros devidamente catalogados e bem distribuídos entre os mais variados motivos, com placas indicando desde os autores até temas inusitados, como uma área dedicada a antigos livros de medicina que, “embora ultrapassados, ainda há quem procure por esse tipo de material”, revela Heloísa.
Ela também aproveita para lembrar que “o sebo é para facilitar o próximo”, oferecendo oportunidades àqueles que têm pouca condição de ter acesso a livros que, de outra forma, dificilmente poderiam comprar. Trabalhando com a ajuda de voluntários, o sebo também fornece condições para a manutenção do Lar Abrigo Amor a Jesus. “Não é só de dinheiro que estamos falando, mas também de afeto, atenção, as coisas que realmente importam”, diz.
O livreiro de Nova Friburgo
Pioneiro nos sebos de Nova Friburgo, Jorge do Livro começou em 1978, vendendo em praças e faculdades, já teve quatro livrarias e está, desde 1995, atendendo em um quiosque no centro da cidade, onde vende livros dos mais diversos assuntos. “Este é um microespaço, contendo um macroespaço literário”, revela, romântico.
Sim, pois Jorge é um romântico. E feliz, já que realizou seus maiores sonhos: tornar-se um professor de história e livreiro. A primeira profissão deixou de lado em 2001, por achar, principalmente, que os alunos não correspondiam mais à expectativa do ensino. A segunda continua à toda e não pretende parar.
Jorge, que chegou a perder boa parte de seu acervo, conta que os títulos mais vendidos hoje são os esotéricos e os de autoajuda. “Mas ainda é possível surpreender os fregueses. Temos livros de arte, romances raros, discos, todo tipo de coisa”, diz o livreiro, que aproveita para lembrar que, embora a internet tenha facilitado em muito o acesso a diversas obras, ainda existe material que só é encontrado em sebos.
Cultura e tradição
O antigo Zumbi dos Palmares, atual Livraria Sebo Shalom – mas mantendo o nome Sebo e Artes na porta da loja, está sob administração de Ilenita Razo Rente há 11 anos. Um dos sebos mais tradicionais da cidade, tem em Ilenita sua quarta proprietária.
Entre os diversos artigos à venda se destacam a busca por discos, principalmente os de heavy-metal e trilhas de novela, quadrinhos e livros didáticos também. Ilenita diz que já passaram por suas mãos livros de até 400 anos. Hoje um dos xodós da casa é uma Bíblia de 1933, cujo preço ela ainda nem definiu. Outra Bíblia, esta em quadrinhos, datada de 1961, está avaliada em cerca de R$ 180.
Para Ilenita, o trabalho no sebo é uma constante reforma, aprendendo, lendo, conhecendo e reconhecendo autores e gostos variados. “A procura, assim como os clientes e seus gostos, é muito variada. A cultura, neste trabalho, é muito importante”, diz.
Na verdade, a cultura é o diamante mais precioso e procurado nesse negócio.
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