Alda Maria de Oliveira *
Num esforço imenso da Fundação Municipal de Saúde através da equipe de Saúde Coletiva para auxiliar a Secretaria Estadual de Saúde, promotora da conferência, neste sábado, no Salão do Hotel Dominguez Plaza, nos reunimos para mais uma etapa do ordenamento das políticas públicas que integrem as demandas das comunidades, das organizações da sociedade civil e dos vários órgãos regionais – que Nova Friburgo tem o privilégio de sediar, para no final do dia de trabalho elegermos nosso grupo regional de delegados e delegadas para a Conferência Estadual.
Lamentavelmente, no mesmo dia, acontecem mais duas conferências importantes: educação e cultura. E não dá para a gente se clonar e participar das três. Então, como membros da Agenda 21 Local, cujos indicadores são todos ligados a saúde ambiental, estaremos lá, trabalhando pesado junto aos demais participantes.
O tema central da conferência A saúde ambiental na cidade, no campo e na floresta: construindo cidadania, qualidade de vida e territórios sustentáveis é a cara de Nova Friburgo. Primeiro, porque na cidade estamos 80% da população concentrados na Bacia do Rio Bengalas; campo somos todo o terceiro distrito de Campo do Coelho, parte do segundo distrito de Riograndina, na Bacia do Rio Grande, pequena parte do quinto distrito de Lumiar e boa parte do sétimo distrito de São Pedro da Serra, na Bacia do Rio Macaé, um pouquinho do primeiro distrito e do quarto distrito do Amparo. E floresta, quase todo Lumiar, boa parte de Mury e mais um pouco em cada um dos outros distritos. Na verdade somos 96% floresta, remanescentes de Mata Atlântica, capoeiras e capoeirões e campos de altitude. E segundo, porque temos um prefeito, o engenheiro civil Heródoto Bento de Mello, que é presidente do Fórum da Agenda 21 Local, que assumiu a agenda ambiental do município com uma ousadia ímpar, deixando atordoados parte de seus técnicos e o movimento ambientalista do município, que estão precisando se desdobrar para acompanhar-lhe os passos.
O desafio é imenso. Porque a Agenda 21 Local, quando elegeu trabalhar as águas do município, através das três principais bacias, do Rio Bengalas, do Rio Macaé e do Rio Grande, e se empenhar pelo enfrentamento da pobreza no município, tinha claro o tamanho do compromisso. E, nas palavras do secretário Municipal de Meio Ambiente (agora interino, porque assumiu a Secretaria de Fazenda) engenheiro civil Ivison Macedo Soares, “não poderemos nunca cuidar do meio ambiente se não fizermos o enfrentamento da pobreza ao mesmo tempo”. Nossos territórios vulneráveis e insustentáveis estão aí, nos vários bairros empobrecidos como Theodoro de Oliveira, Alto do Floresta, Rui Sanglard, Lazareto, o meu Santa Bernadete e vários outros, sem esquecer, na zona rural, Três Cachoeiras, parte de Barracão dos Mendes e outros que têm um perfil muito próximo, todos eles.
Baixa renda das famílias, falta de moradia ou moradia precária, falta de saneamento básico, infraestrutura de iluminação, mobilidade e acesso (sistema viário) deficiente, serviços como comunicação, transporte público e abastecimento comercial insuficiente, infraestrutura social e cultural nos seus componentes de saúde, lazer, cultura e educação deixando a desejar ou até inexistentes; a paisagem de rara beleza que recebemos dos povos indígenas puri e puricoroado degradada em suas áreas verdes, sua arborização, patrimônio construído, patrimônio histórico e artístico, espaços públicos, comunicação visual e elementos e atributos naturais dando um ar de favelização iniciante que atenta contra a equidade, a justiça social, a qualidade de vida que estas montanhas podem nos proporcionar. Basta que olhemos um pouco mais atentos, a essas comunidades desfavorecidas e priorizemos as ações, porque elas custam dinheiro sim, mas estão se impondo, ações essas que todo o meio-dia, na hora dos noticiários dos vários canais de televisão na cidade (e não posso dizer no município, lamentavelmente), os moradores estão incansavelmente apontando.
A escuta se impõe. Somos todos cidadãos e cidadãs do mesmo território.
E por isso, nesta conferência de saúde ambiental vamos ter de falar também de segurança pública, justiça e informações, acesso e participação na gestão pública e organização popular como direitos dentro de um real processo de cidadania.
A economia, cuidando de aumentar a renda das famílias, de qualificar em empreendendorismo, de construir uma economia sustentável, de criar um círculo virtuoso entre produção, renda, qualidade de vida, descarte correto de resíduos sólidos das várias atividades humanas, com prato farto na mesa, abundância de oportunidades iguais, educação plena, boa saúde, lazer e cultura apropriados pelas gentes até se alcançar índices mais salutares de desenvolvimento humano e cuidado com os animais e o meio ambiente, isso sim, pode nos colocar entre os municípios comprometidos, de fato, com a natureza e suas populações humanas.
O desafio da produção agrícola e industrial com foco na sustentabilidade sócioambiental não é menor do que a tarefa de rearranjarmos nossos níveis de consumo desenfreado e inconsciente, que desemboque na construção da democracia onde a educação, a saúde e o ambiente comecem na família, se expanda nas escolas e chegue aos ambientes de trabalho de forma a atestar que somos gentes de primeiro mundo e não miseráveis de um submundo que não interessa a ninguém, mas abre espaços perigosamente, para o estabelecimento de territórios conflagrados.
A nossa conquista deve ser por territórios sustentáveis e isso nos compromete a trabalhar, em última instância pelas prioridades de saneamento básico, manejo correto de resíduos, fim da erosão e desmatamento nas áreas urbanas e rurais, controle do uso de agrotóxicos, implantação de nossas APAs municipais e estadual e nossa parte no Parque Estadual dos Três Picos, de fato funcionando com seus conselhos gestores e planos de manejo que nasçam no seio das comunidades moradoras e, por isso, se tornem sustentáveis.
O compromisso é deixarmos uma boa herança natural e cultural para os que virão depois de nós e isso tem de ficar claro na nossa Conferência Regional de Saúde Ambiental. Nossas vidas devem estar a serviço de alguma coisa boa ou estaremos envergonhando a quem nos deu a vida, a geração que se foi, e aqueles a quem possibilitamos a vida, a geração que chega.
*Engenheira agrônoma, diretora administrativa da Associação de Engenheiros e Arquitetos de Nova Friburgo, conselheira do Meio Ambiente, do Turismo, da Agricultura Familiar e da APA de Macaé de Cima; membro da Agenda 21 Local de NF e do Comperj/Petrobras.
aldah.olive@bol.com.br
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