VALFREDO MELO E SOUZA (*)
Aproxima-se o Natal. As modernas catedrais das metrópoles—os shoppings centers—estão em plena efervescência para revelar que a maior celebração cristã do mundo está acontecendo. Santa Claus (em inglês) tem como base um bispo do século IV, Nicolas de Mira (atual Turquia), reconhecido por sua extrema bondade e carinho, especialmente pelas crianças. Santa Claus, Papai Noel, Pai Natal, São Nicolau, todos simbolizam uma mesma leitura. Envolto neste clima crescem os índices econômicos, o emprego, o PIB, as vendas. Os lares estão festivos com portas decoradas a rigor, mesas fartas, panetones a granel, bolas coloridas para lembrar a mais humilde cena da humanidade—a manjedoura, o nascimento do Menino Jesus. Crianças ansiosas a esperar por brinquedos. Adultos em confraternizações festivas. Religiosos a orar pela chegada de um período ainda mais promissor. Bom é que nos esforcemos para não sufocar a criança que existe dentro de nós, adultos, pelo menos, nesta mágica época. Povoa minha memória o Poema da gare de Astopovo, de Mário Quintana:
“O velho Leon Tolstoi fugiu de casa aos oitenta anos / E foi morrer na gare de Astopovo! /...Contra uma parede nua / Sentou-se e sorriu amargamente / Pensando que / Em toda a sua vida / Apenas restava de seu, a Glória / Esse irrisório chocalho cheio de guizos e fitinhas coloridas /Nas mãos esclerosadas de um caduco /...A Morte chegou na sua locomotiva / (Ela chega pontualmente na hora incerta ...) / Mas talvez não pensou em nada disso, o grande Velho, / E quem sabe se até não morreu feliz: ele fugiu... / Ele fugiu de casa.../ Ele fugiu de casa aos oitenta anos de idade.../ Não são todos os que realizam os velhos sonhos da infância!”
Natal é tempo de bondade, um período em que as pessoas se sentem mais motivadas a estender suas mãos aos outros e lhes mostrar toda sua generosidade e simpatia. E neste ponto entendemos que a mensagem de Cristo incorpora-se ao cotidiano através de ações e sentimentos.
Amar o próximo como a si mesmo não é só um belo ensinamento cristão. É de todas as religiões. Representa toda uma filosofia de vida. Transcende o próprio sentido das palavras revelado em doação de tempo, de carinho, de alimentos, de brinquedos, de presentes.
Aprendido a ver o que é reto e não fazê-lo, é covardia. (Confucionismo). Perguntou-se a Confúcio: “Bom homem é quem é apreciado por todos? Não. É então quem é detestado por todos? Também não. O homem bom é apreciado por todas as pessoas boas e detestado pelas más”. Perguntou-se de novo: Existe uma palavra que sintetize a base da boa conduta? Resposta: Não será reciprocidade essa palavra? Em qualquer religião ou filosofia evidencia-se o amor ao próximo. Muitas tradições surgiram antes do nascimento de Cristo. Na Mesopotâmia as festas para Marduk duravam doze dias até a virada do ano, período que coincide com o Natal. Na Babilônia e na Pérsia existiam cerimônias que lembram a lavagem dos pés realizada por Jesus e seu compromisso com os pobres. Na Escandinávia, acender fogueiras, reunir familiares ao redor, tinha como um dos símbolos amarrarem maçãs às árvores próximas à pira. Talvez seja o ancestral mais distante do que hoje se conhece como árvore de Natal.
Lendas outras existem. Autoridades eclesiásticas (entre os séculos III e IV) transferiram arbitrariamente a natividade de 6 de janeiro para 25 de dezembro com a finalidade de desviar para o seu Senhor o culto pagão dedicado ao Sol. Sínodos cristãos do século VIII confirmam a decisão.
(*) - Jornalista e escritor em Brasília
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