Sagui-da-serra-escuro pode desaparecer em 30 anos

Projeto está mapeando espécie em extinção para garantir a preservação de animal típico da Mata Atlântica
quarta-feira, 14 de dezembro de 2016
por Alerrandre Barros
O sagui-da-serra-escuro pode desaparecer em 30 anos (Foto: ICMBio)
O sagui-da-serra-escuro pode desaparecer em 30 anos (Foto: ICMBio)

Mais de 12 espécimes do sagui-da-serra-escuro (Callithrix aurita) foram encontradas, nos últimos meses, em trilhas das regiões mais altas Nova Friburgo. O animal, típico da Mata da Atlântica, está em extinção e pode desaparecer em 30 anos. Um projeto de preservação da espécie, capitaneado pela ONG Programa de Educação Ambiental (Prea), quer reverter a situação e criar uma unidade de conservação no município. 

“Eu encontrei o sagui-da-serra-escuro em áreas distintas de Nova Friburgo: da mata de Theodoro, no distrito de Mury, a região de Salinas, no distrito de Campo do Coelho”, revela o pesquisador do Prea e turismólogo Alessandro Antunes. 

O sagui-da-serra-escuro é maior que os conhecidos micos que vivem nas zonas urbanas. A espécie mede entre 40 e 50 centímetros e pesa em torno de 300 e 450 gramas. O macaco é único da família que não tem listras na região dorsal do corpo, com coloração que varia de tons avermelhados ao negro. A face dele tem uma máscara branca que se afunila em forma de cone nos olhos. A cauda é desenhada com anéis alternados em cinza e preto.

De acordo com o Antunes, a espécie é arisca e não gosta da área urbana nem de ficar perto do ser humano, por isso, o sagui-da-serra-escuro costuma ser encontrado nas regiões mais altas de cidades serranas. Ele vive em família, geralmente com cerca de quatro a oito membros, e se alimenta de frutos, insetos e goma, que saem do tronco de árvores, mas também costuma comer vertebrados, néctar, ovos de aves, flores, sementes e fungos. 

Os pesquisadores estimam que o número de indivíduos adultos é de cerca de 10 mil em todo o país. A espécie vem sofrendo intensa redução populacional, em decorrência da perda e fragmentação de seu hábitat. O declínio populacional estimado para a espécie é ainda intensificado pela existência de competição e hibridação com espécies invasoras, como o sagui-do-tufo-branco (Callithrix jacchus) e o sagui-do tufo-preto (Callithrix penicillata). 

“Por causa disso, em 18 anos, a espécie, que estava vulnerável passou, em 2014, para em risco de extinção porque houve redução de 50% da população, segundo pesquisadores”, disse Antunes. 

Em Nova Friburgo, Alessandro toca o projeto, com a supervisão do professor doutor em Ecologia Rodrigo Salles de Carvalho. A iniciativa é financiada por zoológicos franceses, o Durrell Wildlife Conservation Trust e a Association Française des Parcs Zoologiques, e vai catalogar a espécie na cidade, controlar a população de invasores e desenvolver ações de educação ambiental em escolas para mobilizar a população sobre preservação do animal. O projeto ocorre também em Petrópolis, Teresópolis e outras cidades serranas de São Paulo e Minas Gerais

Antunes contou que já realizou 10 trilhas em Nova Friburgo para catalogação do sagui. Ele explica que a cada 500 metros caminhados  o pesquisador liga o aparelho  (play back) que emite o guincho típico da espécie. O som atrai o sagui para perto do pesquisador, que fotografa o animal para os registros. Um aparelho de GPS é usado para marcar o lugar exato em que o sagui foi identificado.

O mapeamento dos locais onde o animal vive é importante para que as espécies invasoras — o sagui-do-tufo-branco e o sagui-do tufo-preto — não prevaleçam sobre o sagui-da-serra-escuro. Recentemente, Antunes identificou um sagui-da-serra-escuro nas matas do Pico do Caledônia, a cerca de cinco quilômetros do Parque Municipal Juarez Frotté, no Cascatinha, onde vários saguis invasores vivem. 

“Os saguis invasores vieram do Serrado, no Centro Oeste, e Caatinga, no Nordeste. Eles comem de tudo e não têm medo do ser humano. No Rio, a população deles já está fora de controle, mas aqui em Nova Friburgo há possibilidade de controlar a reprodução. São animais que carregam parasitas, piolho, carrapatos e podem transmitir raiva, por isso recomendamos que a população não os alimente. Duas pessoas já foram mordidas em Olaria e na Vila Amélia este ano”, contou Antunes. 

Os pesquisadores vão desenvolver ações para capturar e esterilizar os saguis invasores a fim de controlar a reprodução. “O sagui-do-tufo-branco e sagui-do tufo-preto são considerados generalistas, isto é, têm hábitos flexíveis e adaptáveis, tanto para obtenção de alimentos, como para ambientação a novos habitats e por isso têm um enorme potencial invasor competindo, expulsando, hibridizando e potencialmente transmitindo doenças para o sagui-da-serra-escuro”, explicou o pesquisador. 

O projeto de preservação vai desembocar na criação de Refúgio de Vida Silvestre (Revis) na região onde hoje existe a Área de Proteção Ambiental (APA) de Macaé de Cima. O vereador Pierre de Moraes (Psol) está trabalhando na iniciativa. O parlamentar contou que aguarda o memorial descritivo da área para  pedir a inspeção da Secretaria Municipal de Meio Ambiente. 

“O projeto está em andamento e vai garantir não só a preservação do sagui-da-serra-escuro como também de outras espécies da flora e da fauna que estão em risco de extinção em Nova Friburgo”, disse o parlamentar. “A reserva vai garantir o hábitat do animal e gerar vários benefícios para o turismo local, colocando a cidade numa posição de destaque nacional e internacional. É importante ressaltar ainda que a reserva vai sepultar qualquer iniciativa de construção de hidrelétricas no Rio Macaé, conforme ocorreu este ano”, disse. 

De acordo com os pesquisadores, a extinção de espécies é muito grave, porque afeta todo o equilíbrio do ecossistema, a qualidade do ar, da água e até a nossa sobrevivência. O sagui-da-serra-escuro, por exemplo, atua na polinização, dispersão de sementes e controle de pragas. 

Livro para colorir e cartuns

A educação ambiental de estudantes é outra arma do projeto para a preservação do animal em Nova Friburgo. O cartunista friburguense Rafael Bucharel fez os cartuns que ilustram o “Livro para Colorir Turma do Aurita”, que será distribuído gratuitamente para estudantes da rede pública do município. A obra, com texto do pesquisador Alessandro Antunes, apresenta o animal, características e hábitos para conscientizar as crianças sobre a importância da preservação da espécie. 

A Secretaria Municipal de Meio Ambiente informou nesta terça-feira, 13, que está buscando recursos para produzir cinco mil exemplares do livro para colorir que serão distribuídos na rede pública da cidade. “Nós estamos buscando patrocínio para que o livro seja também entregue a estudantes de escolas da rede particular da cidade,” explicou Antunes. Saiba mais sobre o projeto em ongprea.org.br e facebook.com/saguidaserraescuro.

  • Livro para colorir criado por Antunes e o cartunista friburguense Bucharel (Reprodução)

    Livro para colorir criado por Antunes e o cartunista friburguense Bucharel (Reprodução)

CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE
TAGS: Meio Ambiente | Sagui-da-serra-escuro
Publicidade