Rio Bengalas - 7 de janeiro de 2012

segunda-feira, 09 de janeiro de 2012
por Jornal A Voz da Serra
Rio Bengalas - 7 de janeiro de 2012
Rio Bengalas - 7 de janeiro de 2012

Carlos Emerson Junior

O Rio Bengalas é um dos cartões-postais de Nova Friburgo e talvez o mais importante, já que corta toda a cidade. Os moradores antigos garantem que era possível tomar banho e até mesmo pescar em suas águas límpidas. Hoje não dá sequer para imaginar uma coisa dessas!

Conheci o Bengalas já bastante poluído e sempre inundando o centro da cidade e os bairros ribeirinhos durante o verão. Várias tentativas foram feitas para domar suas águas, mas como a natureza não quer nem saber das obras dos homens, assistimos espantados, nas chuvas de janeiro do ano passado, ao velho rio alagar até a Avenida Alberto Braune, uma visão absolutamente inédita para mim e muitos friburguenses.

O município de Nova Friburgo é banhado pelas bacias dos rios Grande, Bengalas, São José, Capitão e Macaé. Praticamente quase todos os distritos têm uma nascente ou são cortados por rios, ribeirões e riachos. A região de Lumiar e Boa Esperança, por exemplo, é famosa por seus cursos d’água com corredeiras velozes, excelentes para a prática do rafting e canoagem, além de ótimos poços e cachoeiras para banhos no verão.

O Rio Bengalas é formado pelos rios Santo Antônio, que nasce no Debossan, e o Cônego, resultado da junção dos córregos Caledônia, Bambuaçú e Cascatinha, no bairro do mesmo nome. Durante seu percurso, recebe as águas que vêm das partes altas da cidade, principalmente dos bairros das Braunes e Tingly, e ainda dos córregos do Relógio, Inhames e d’Antas, até desaguar Rio Grande, na altura do distrito de Banquete, em Bom Jardim.

Dando uma olhada para o passado, aprendemos que o Bengalas não tinha originalmente o percurso quase em linha reta que hoje o caracteriza. Segundo o historiador Raphael L. de S. Jaccoud, em artigo publicado aqui mesmo em A Voz da Serra, em janeiro de 2007, “no fim do século 19 e início do século 20, a Câmara Municipal—então, também, órgão executivo—num esforço sem par, realizou a retificação do Bengalas, no trecho, hoje, junto às avenidas Galdino do Valle e Comte Bittencourt e o prefeito César Guinle, nos anos 40, dragou e retificou o rio, que era repleto de meandros, até Conselheiro Paulino”.

Para piorar o quadro, temos o problema da poluição. Não me conformo em morar num município cheio de mananciais e nascentes e dar de cara diariamente com uma lixeira fedorenta ao ar livre, onde deveria haver um rio. Além de pessoas que jogam, de forma irresponsável, sofás, pneus, ferro-velho e seu lixo doméstico, indústrias e a agricultura também contribuem, despejando diretamente seu esgoto “in natura”, um completo absurdo.

Sujar os rios é crime e vale para qualquer um. A Lei 9.605/98, em seu artigo 54, prevê multa e prisão para quem causar poluição de qualquer natureza em níveis que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana ou que provoquem a mortandade de animais e destruição significativa da flora.

Infelizmente estamos poluindo esse patrimônio de maneira irresponsável e permanente. As estações e redes de esgoto que estão sendo construídas são um avanço mas não a solução completa do problema. Temos que pensar na despoluição dos nossos rios—e começar pelo Rio Bengalas seria extremamente simbólico.

É possível recuperar um rio poluído e está aí o velho Tâmisa, em Londres, considerado até a década de 60 como o mais sujo da Europa. Uma combinação de rede, estações de tratamento de esgotos e conscientização da população mudou completamente esse quadro. Se os ingleses se uniram para salvar um trecho de 30 quilômetros de um rio com 346 quilômetros de extensão, por que nós, friburguenses, não conseguiríamos fazer o mesmo com o nosso Bengalas, com seus 6 quilômetros de extensão na área urbana?

Com boa vontade, inventividade e participação popular, tudo é possível, meus caros. Primeiro temos que reconhecer que, quase duzentos anos depois, ainda não sabemos lidar com as chuvas de verão, sempre mais intensas por causa da localização serrana e tropical e o inevitável transbordamento dos rios. Pelo contrário, todas as nossas intervenções para sanar esses problemas têm sido infrutíferas.

Em segundo lugar, precisamos nos preparar para o futuro. O aquecimento global é fato e já sentimos os seus efeitos. A intensidade das chuvas aumentará até 2050 e, com o desmatamento progressivo da Amazônia, o fenômeno conhecido como Zona de Convergência do Atlântico Sul continuará mostrando seus efeitos em nossa região. A boa prudência pede que pensemos bem onde devemos construir e morar, respeitando os limites dos rios e encostas.

Perdemos vidas porque nos esquecemos que para a natureza somos apenas uma parte do ecossistema. Nossa convivência com o Rio Bengalas, desde a chegada dos colonizadores suíços, em 1820, tem sido marcada pela improvisação e o desrespeito. Acho que todos nós concordamos que está mais do que na hora de aprender como conviver harmoniosamente com nossos rios e o velho Bengalas.

Carlos Emerson Junior

carlosemersonjr@gmail.com

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