Karine Knust
Impossível falar sobre histórias que envolveram animais numa das maiores tragédias do país sem lembrar da imagem de uma senhora sendo resgatada por uma corda em meio à correnteza. A dona de casa Ilair Souza, moradora do município de São José do Vale do Rio Preto, na Região Serrana, protagonizou uma das cenas mais marcantes de 2011. A enxurrada de água destruiu a casa, levou seus cachorros e quase arrastou Ilair. No entanto, dois vizinhos conseguiram agir a tempo. Jogaram uma corda em sua direção e a içaram rapidamente. Ilair chegou a tentar salvar Beethoven, um de seus bichinhos, mas, ao ser resgatada, a força das águas foi maior e o cachorro foi levado.
Cerca de quatro meses depois, Ilair e sua família tiveram uma grata surpresa. A dona de casa foi escolhida para abrir a 6º temporada do quadro Lar Doce Lar, do programa Caldeirão do Huck. Além de a família Souza ganhar uma nova moradia, o amor ao animal de estimação, que não conseguiu sobreviver, não foi esquecido. O apresentador Luciano Huck presenteou Ilair com um cãozinho que também fora vítima da tragédia de 2011. O novo membro da família foi batizado de Bolinha.
Em Nova Friburgo, são muitos os casos de animais que ficaram abandonados ou morreram na tragédia. Felizmente, vários dos que sobreviveram conseguiram ganhar um novo lar.
Lobinho, um "cidacão” friburguense
Qual friburguense não conhece o famoso "Lobinho”, por exemplo? O popular e charmoso cão, que andava pelas ruas do centro da cidade, dormia dentro de uma agência bancária na Avenida Alberto Braune e recebia cuidados de pedestres e lojistas. Em janeiro de 2011, em meio a tanta confusão, Lobinho ficou desamparado. Mas essa situação durou pouco. Rapidamente ele foi acolhido por uma família apaixonada por animais. Na época, a comerciante Claudia Cereja já tinha dois cães de grande porte em seu apartamento e outros quatro no sítio da família. Por isso, logo após a catástrofe, ela cuidou de Lobinho, sem no entanto adotá-lo definitivamente. Mas a conexão entre aquele charmoso amigo de quatro patas e Claudia era tanta que, depois de um tempo, a comerciante resolveu levá-lo para casa de vez. "Queríamos achar um adotante legal, mas não tivemos coragem de deixá-lo novamente. Arrumamos excelentes adotantes. Nós mesmos. Nos apaixonamos por ele e ele por nós. Agora ele não sai mais lá de casa”, revela ela.
A paixão de Claudia realmente tem seus motivos. Por ser um cão muito simpático, no tempo em que esteve nas ruas Lobinho ganhou uma página no Facebook — "Lobinho, o cão comunitário de Nova Friburgo” —, criada por seus amigos humanos. Atualmente, Claudia é a administradora da página e diz que resolveu mantê-la para que as pessoas pudessem continuar acompanhando Lobinho através das redes sociais: "Resolvi manter a página porque, além de ser uma ótima forma de divulgarmos ações pelo bem da causa animal, ele é muito popular até hoje. Não há um dia sequer que não saiamos com ele na rua sem que alguém venha nos perguntar sobre ele ou nos parabenizar pela atitude. Apesar do temperamento meio sério, é incrível ver como Lobinho é querido. Aliás, isso é surpreendente. Seus hábitos, seus amigos de anos, pessoas que o amam só por terem tido este contato de rua e que o alimentaram durante anos. Ele é um cidadão friburguense, literalmente”.
(Reprodução / TV Record)
Reencontro inesquecível
Na última semana, um canal de televisão divulgou a história da família Schuenck e a vira-lata Bolinha. Na noite do dia 11 de janeiro de 2011, Valério, sua família e os dois bichinhos de estimação tiveram que sair de casa por causa do temporal. O dono do imóvel para o qual estavam se mudando não permitia a presença de animais. Não teve jeito: a cadela Pretinha foi levada para um sítio de parentes, enquanto Bolinha teve que ir para a adoção.
Comovida com a história, a veterinária Carla Sassi, que na época da catástrofe veio trabalhar como voluntária, resolveu adotar Bolinha. Agora, quatro anos depois da tragédia, Carla voltou a Nova Friburgo para fazer uma surpresa à família friburguense que teve que se desfazer de seu animalzinho de estimação. A cachorrinha veio rever seus antigos donos. O momento de reencontro foi emocionante e inesquecível para todos. Depois de sua visita, Bolinha voltou para seu novo lar, no interior de Minas Gerais.
Uma tartaruga de sorte
Maria Sueli Ferreira da Silva, secretária de A VOZ DA SERRA, sempre gostou de animais. Desde pequena, era só andar pelas ruas e ver um bichinho abandonado que ela não pensava duas vezes; o carregava logo para casa. Na tragédia de 2011, uma amiga encontrou uma tartaruga, sem uma das patas, no meio da lama no bairro Varginha, onde morava. Ela não teve dúvidas. Avisou Sueli, que imediatamente adotou a tartaruguinha, que atualmente convive com outras três de sua espécie.
"Todos os meus bichos são adotados. Tenho um cachorro, quatro gatos e cinco tartarugas.”
Ticão: um hóspede ilustre pra cachorro
Antes da tragédia, Celina Müller já tinha muito mais animais do que a maioria das pessoas. Eram vinte em sua casa. O que ela não contava é que esse número iria aumentar, e muito, depois daquela inesperada tempestade. Além dos diversos voluntários que chegaram a cidade para auxiliar as vítimas — seres humanos —, uma equipe formada, inclusive, por veterinários, se lembrou dos animais. Foi montado um centro de atendimento em um galpão na Vilage e um veículo rodava o município em busca de bichinhos perdidos de seus donos. "Existem pessoas já acostumadas com esse tipo de ação, que seguem para cidades atingidas por catástrofes, exclusivamente para salvar os animais. A veterinária Carla Sassi é uma delas”, conta Celina, que o tempo todo apoiou a iniciativa, que resgatou e tratou de centenas de animais.
O problema é que, três meses depois, cerca de quarenta bichinhos — entre gatos e cachorros — continuavam no galpão, o que causou incômodo a vizinhança. A solução encontrada por Celina foi levar todos para sua casa. Surgiu então o projeto Amicão & Amicat. Entre tantas histórias, um dos casos mais marcantes foi a do cachorro Ticão, um dos quarenta "hóspedes” de Celina: "O dono dele era um jovem de vinte anos que morreu naquela madrugada. Os pais ficaram bastante feridos e tiveram que ficar internados em Niterói. Um ano depois, a irmã do rapaz — que tinha mais um irmão — viu, por acaso, a foto de Ticão no site do projeto. A família, que agora mora num local onde não é permitida a presença de animais, resolveu visitar o cãozinho. Foi um momento muito emocionante”. Ticão é o único animal com donos conhecidos que Celina permite que fique em sua casa. "A família, realmente, não tem condições de ficar com ele. O dono era o filho que morreu e, mesmo assim, eles vem visitá-lo, o que deve ser muito difícil.”
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