Regina Lo Bianco

segunda-feira, 04 de março de 2013
por Jornal A Voz da Serra
Regina Lo Bianco
Regina Lo Bianco

Dalva Ventura
Difícil, para não dizer, quase impossível fazer uma entrevista com Regina Lo Bianco. Grande colaboradora de A VOZ DA SERRA, ela está sempre pronta para registrar, com a sensibilidade que lhe é peculiar, as belezas naturais de Nova Friburgo. Mas falar dela própria? Nem pensar. Reservada, discreta, de poucas palavras, só depois de muita insistência consegui entrevistá-la. Assim mesmo, com a promessa de apenas conversarmos sobre o novo foco de seu trabalho. 
Conhecida por retratar as belas paisagens dos arredores de Nova Friburgo, de algum tempo para cá Regina passou a fotografar também as suas mazelas. Entristecida com os problemas que vêm descaracterizando e enfeando nossa cidade, Regininha passou a fotografar também os painéis de propaganda que escondem nossas fachadas, os buracos no calçamento, as ruas cheias de lixo, enfim, a degradação ambiental, o crescimento desordenado e a falta de conservação do patrimônio da cidade.
 “Eu me sinto muito participante da nossa história, daí minha tristeza de ver a cidade desse jeito”, diz, durante nosso papo. Que até aí segue tranquilo, numa boa. Mas é só começar a conversar sobre sua vida e sua carreira que ela se fecha em copas. Dali por diante, é tirar leite de pedra. “Que interesse isso pode ter para alguém?”, questiona. Com muito custo, até consigo descontraí-la e arrancar alguma informação mais pessoal. Mas ela logo diz, meio rindo, meio séria. “Chega, não falo mais.” Mas, para quem nunca “fala”, a entrevista até que ficou de bom tamanho.  

A VOZ DA SERRA – Regina, você se tornou conhecida por retratar as belezas de Nova Friburgo, mas de um tempo para cá vem mudando o foco de seu trabalho, passando a registrar também a transformação—para pior—que a cidade vem sofrendo. Como isso aconteceu?   
REGINA LO BIANCO – Sou apaixonada por Friburgo. É uma cidade muito, muito bonita. É radiante. E eu tenho procurado mostrar tudo isso através das minhas fotografias. Eu fotografava—e ainda fotografo—nossas belezas, mas agora também estou querendo olhar este outro aspecto da cidade, porque Nova Friburgo não vai só da Rua Sete à Praça e Alberto Braune, Mac Niven e Moisés Amélio. E Olaria? E Conselheiro Paulino? E o Cordoeira? São cidades dentro da cidade, com hábitos e culturas próprias, com suas especificidades. Agora, estou registrando também esta outra Nova Friburgo.  

AVS – Até que ponto a tragédia de 2011 foi responsável por esses problemas?
Regina - O que a gente passou não tem nada a ver com a transformação a que me refiro. A natureza vem se recuperando. Aos poucos, mas vem. Meu foco agora está se voltando para a degradação da cidade provocada pelo homem. Estou falando dos painéis de propagandas e das placas de sinalização que escondem nossas fachadas, nossa história, o próprio charme da cidade e que se multiplicam pelas ruas. Friburgo está muito poluída visualmente, está totalmente descaracterizada, despersonalizada, daí a mudança também na minha fotografia. 

AVS – Esta poluição visual é gritante e preocupa, de fato, todos que amamos Nova Friburgo. A seu ver, Regina, este problema tem solução?
Regina – Eu acho que não é só Friburgo que está passando por isso. As cidades, em geral, estão se transformando, mas temos que agir enquanto é tempo. Acho que ainda dá para recuperar, sim, mas daqui a pouco a gente vai perder o controle. Eu não sei qual é a saída. Da minha parte, estou registrando esses problemas para denunciar e chamar a atenção das pessoas, dos dirigentes para a questão. Essa é a minha intenção. 

AVS – Em sua opinião, o que está faltando?
Regina - Um choque de ordem. Falta uma política pública de controle da cidade, tanto da parte ambiental como de gerência. 

AVS - Quando você começou a despertar para isso?
Regina - Quando comecei a ter dificuldades para fotografar o centro da cidade. Hoje, é praticamente impossível fazer fotos charmosas do centro. Quando comecei a fotografar, a cidade tinha uma cara. Nesses 15 anos, ela ficou com outra cara. Esse impacto é que está me fazendo mudar. 

AVS – Mas eu me lembro que há algum tempo você fez uma exposição na Usina Cultural mostrando, numa sala, as belezas da cidade e noutra, suas mazelas. Já era o início de sua preocupação com estas questões... 
Regina – Já era o início desta preocupação com a ocupação desordenada das encostas, o desmatamento sem critério e a falta de preservação do patrimônio histórico. A cidade já vinha tendo uma orientação cada vez mais comercial, com anúncios gigantescos, cartazes publicitários e placas de sinalização sem uniformidade. Um triste processo desarmônico e ruidoso. Uma overdose de imagens.

“A fotografia é minha forma de colaborar com a história da cidade”

AVS – Bem, eu diria que você está... expandindo seu foco, já que continua fotografando paisagens e a natureza exuberante de Nova Friburgo. 
Regina – De certa forma, sim, eu gosto muito da natureza, do ambiente rural e lá, felizmente, nada mudou.  Eu sempre gostei de ir para os arredores da cidade, pesquisar, documentar a história daquelas localidades. A região de Rio Bonito e Macaé de Cima, que frequento há 15 anos, é muito, muito bonita, de mata fechada, de hábitos próprios. O Rio Bonito, por exemplo, é uma comunidade que frequento há 15 anos, fazendo entrevistas com os moradores mais antigos e registrando imagens daquele lugar fantástico. 

AVS – Conversávamos há pouco sobre um ensaio seu retratando o sertão do Rio Bonito. E então?
Regina – Já fiz dezenas de entrevistas e fotografias com o povo de lá, mostrando seus costumes e tradições. São pessoas simples, com muita história para contar e que se preocupam com a degradação do meio ambiente. No carnaval, por exemplo, os moradores se fantasiam com folhas, como só acontece num cantão da Suíça. Incrível. 

AVS – Regina, me diga uma coisa. A fotografia aconteceu por acaso na sua vida?
Regina – Bem, eu fotografo desde os 15 anos. Naquela época, minha preferência era registrar detalhes e objetos. Meu foco sempre foi documentar e criticar. Hoje, com a fotografia posso refletir sobre as questões urbanas e sobre a nossa capacidade de construir uma cidade mais justa, organizada e agradável.

AVS – Quantas exposições você já fez?
Regina – No Centro de Artes fiz três exposições ilustrando raps do Gabriel o Pensador, e também um ensaio sobre a comunidade do Rio Bonito. Na Usina Cultural expus dois trabalhos sobre Nova Friburgo. No ano passado, o Sesc me convidou para fazer um ensaio sobre o Jardim do Nêgo. Foi um trabalho bem interessante. Agora, estou pesquisando e estudando uma forma de mostrar “Uma outra cidade”. Este é o título provisório da minha próxima exposição.

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