Arnaldo Miranda ainda não tem certeza se o Multilivros chega a ser uma invenção, mas para ele é, sem dúvida, um produto inédito no mercado fonográfico-audiovisual-editorial. Pelo menos que ele saiba.
"Também não conheço muita coisa”, diz, rindo. Arnaldo e seus parceiros pretendem que esta seja uma obra coletiva de artistas, na qual cada um mantenha sua marca pessoal. "Assim como o Júnior tem uma marca personalíssima, também reconhecemos facilmente quando nos deparamos com o trabalho de uma profissional como a Regina (Lo Bianco), por exemplo”, diz Arnaldo.
Ele revela que a ideia do projeto surgiu, em 2011, de uma necessidade pessoal de integrar três grandes áreas do seu trabalho: a música, o teatro e a literatura, cada uma levando-o numa direção, desde a adolescência, sem que chegasse a uma integração satisfatória entre elas.
A partir de certo ponto de sua vida, ele renunciou ao teatro por absoluta falta de condições de produzi-lo satisfatoriamente, o que lhe causou muita tristeza. "Tenho um vínculo essencial com a narrativa dramática. Mas, como resolvi dedicar-me prioritariamente à música, não houve jeito de mantê-lo. Também a literatura, nessas circunstâncias, sofreu um encolhimento: restringi-me basicamente à poesia, dando passagem à prosa em geral e à ficção em particular”, conta.
E filosofa: "Percebi que cada uma dessas atividades é uma deusa tirana que exige de seu servo dedicação integral e exclusiva, sempre que não dispomos de uma sólida estrutura econômica de produção que nos possibilite uma organização sofisticada e disciplinada ao mesmo tempo. Meu caso”.
Observando a complexidade do mercado fonográfico brasileiro, no qual, percebeu Arnaldo, uma música demasiado autoral como a dele não encontra facilmente o seu caminho, "não obstante a generosidade e a abertura do nosso público”, ele começou a pensar em algo que pudesse significar um diferencial a favor de sua arte e que pudesse trazer também uma exposição pública confortável e compatível com o seu temperamento, "que não é lá de grande exibição”...
Voltando um pouco no tempo, para melhor contar a trajetória do Multilivros, em 2009, Arnaldo deu início à produção de videoclipes para o seu primeiro álbum autoral, quando fez uma descoberta, "sensacional”: que podia retomar o discurso dramático fazendo com que os clipes de suas canções contassem histórias. Continua na página 6.
"Histórias com princípio, meio e fim, como nos clipes do Michael Jackson, que tanto amo, histórias que interpretassem as letras construindo um enredo para contá-las por meio de uma narrativa dramática no audiovisual, que, de certa forma, veio a substituir o teatro em minha vida e no meu trabalho. Foi uma alegria sem fim”, lembra, feliz.
Fala, Arnaldo:
"Assistia os clipes pensando na questão de um diferencial para o meu trabalho... especialmente o de animação, cujo estilo é uma espécie de psicodelia pós-moderna... e, de repente... Sim! Por que não? E se transpuséssemos esse clipe para o formato impresso, o que aconteceria? Criaríamos um produto inédito, eu mesmo me respondi. Hummm... isso pode me ajudar em termos de visibilidade em um mercado onde você praticamente tem que tirar a roupa dentro de uma redação de jornal para chamar a atenção das pessoas e da mídia para o seu trabalho...
Fui à bat-caverna, que é como chamo o escritório de produção do Júnior, e expus a ele a ideia. Júnior e eu temos um tipo de cumplicidade artística do tipo um mata e outro esfola, de modo que me respondeu: por que não pensamos nisso antes?!
E assim teve início, em meio a uma Friburgo arrasada, pela qual circulávamos de máscaras e botas, a produção do multlivro Flores da Serra, nosso primeiro título. Não se tratava de simplesmente transpor os frames da animação para o formato impresso, era preciso fazer com que a mesma história que se contava no vídeo fosse contada no livro e guardasse entre ambas uma ligação e um certo distanciamento que cada meio e cada veículo e cada linguagem suscitam ao criador.
A animação do Ilson Júnior impulsionou minha invenção e sem ele, e seu trabalho acurado, eu levaria, por certo, muito mais tempo até concretizar qualquer resultado. De modo que posso atribuir a esse parceiro artístico de todas as horas a materialização dos Multilivros como nós os entendemos hoje. E já estamos no terceiro título.
Flores da Serra é o nosso Pequeno Príncipe, com sua linguagem onírica, infantil, de extrema delicadeza.
No amor, na transposição impressa, tornou-se o que o mercado editorial chama de novela gráfica; e o tema das drogas, seu horror, sua degradação foi levado a extremos por esse artista plástico potente e sensível que é Ilson Júnior, um talento único que honra e enche de alegria as artes do Brasil.
Amis de chambre, o título de 2012, trouxe novos experimentos e ousadias para nós. Eu queria fazer uma videodança a partir da letra dessa canção, que está no meu segundo álbum autoral, Archeiro. Para tanto, trouxemos da Espanha a bailarina brasileira Talia Bedotti, convidamos o coreógrafo carioca Marcio Cunha e a fotógrafa friburguense Regina Lo Bianco para se juntarem à nossa equipe de produção, que contava ainda, e sempre, com Sergio Martins, diretor de fotografia de todos os nossos videoclipes e parte inseparável do tripé criativo que formamos, ele, Júnior e eu. O resultado não poderia ser mais animador, a despeito da minha inexperiência com essa linguagem que tanto amo e pretendo desenvolver em trabalhos futuros.
E o fato de ter sido desenvolvido em Nova Friburgo, majoritariamente por artistas em atividade na cidade, creio, é motivo de orgulho para toda a comunidade, afinal, não inventamos a roda, mas pelo menos demos-lhe uma bossa nova capaz de agradar o mundo inteiro.
Para quem gosta de música, audiovisual e livro, tudo junto ao mesmo tempo agora, temos o produto ideal para seu deleite e fruição. Chega ao mercado entre 2015 e 2016.”
Arnaldo Luis Miranda
Rio de Janeiro, inverno de 2014
www.ciadoar.art.br
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