Ana Blue
"Numa noite escura e fria, o deus do heavy metal desceu pessoalmente à Terra, escolheu três paspalhos e deu a eles uma missão: levar a todos os palhaços do mundo um som vigoroso, autêntico e irreverente.” Assim Dalmo Latini, Leonardo Benvenuti e Jéferson Robert iniciam seus shows com a banda Punk Rock Circus.
Amigos de longa data, tendo como denominador comum a arte de rir e fazer rir, os três artistas seguiam suas carreiras paralelas quando perceberam que poderiam criar algo incrível juntos. Dalmo é integrante da Trupe Família Clou — junto com sua mulher, Talita Melone, e seus filhos Ian e Isabela —, que em 2013 completou dez anos de trabalho. Leonardo e Jéferson, além de palhaços — a dupla Abelhito e Sucata —, já se apresentavam em suas respectivas bandas musicais. Então, em 2013, a partir de um projeto de leitura em que participaram, onde misturavam músicas infantis e rock pesado, surgiu a ideia: por que não uma banda de palhaços?
Não é uma ideia totalmente nova. No Brasil, outras trupes já fizeram o mesmo, como a banda Di Da Dó e a Circo da Silva, que Dalmo afirma serem algumas das referências para a Punk Rock Circus. Até ele próprio, junto com Leonardo, já havia formado antes uma dupla que cantava músicas de cultura popular. A grande sacada, desta vez, foi a sátira aos clichês do rock and roll: o estrelismo, as exigências absurdas dos artistas e a excentricidade dos integrantes de algumas bandas. Os três gostam do estilo — Dalmo, em dias civis, digamos assim, não se separa das suas camisas de diversas bandas de rock — e garantem que não têm o objetivo de criticar o rock, mas de brincar com a postura extravagante de alguns artistas. Assim nasceu a Punk Rock Circus.
"O palhaço não é um personagem. O palhaço é você mesmo, com uma lente de aumento. É a sua própria identidade, mas exagerada, mostrando sua verdadeira essência. O humorista faz humor com as características do outro: o outro é feio, o outro é pobre, o outro é gordo, magro, alto, baixo. Já o palhaço faz a piada de si mesmo e, satirizando a si mesmo, faz com que os outros se identifiquem com ele”, diz Dalmo, que comanda a guitarra e os vocais da banda. Leonardo — mais conhecido como Leo Abelha — é o baterista do grupo e Jéferson responde pelo baixo. São três figuras antagônicas, que no palco se completam em sintonia perfeita. "Os três patetas”, brinca Jéferson.
A Punk Rock Circus busca a total interação com o público: em cada show eles inventam uma brincadeira diferente. Das apresentações que fizeram, eles destacam a do Anjos do Picadeiro, no Rio; a do 1º Encontro Internacional de Palhaços Eu Riso, em Fernandópolis (SP) e as que foram realizadas na Usina Cultural, em Nova Friburgo mesmo, por conta do apoio que receberam e pela participação do público.
A primeira música da banda — são nove no total — foi gravada justamente para o Anjos do Picadeiro. "Rio é rua” é uma composição que vai além da diversão. É um levantamento de uma questão que vem trazendo dor de cabeça para artistas de todas as expressões e estilos: a dificuldade de se fazer arte de rua — e nas ruas — no Brasil. Instrumentos apreendidos, truculência policial, burocracia excessiva para apresentações em espaços públicos, enfim, são muitos os obstáculos a serem enfrentados antes de se conseguir apresentar um trabalho para o público.
E por falar em dificuldades, os investimentos para que a banda siga adiante foram muitos. Apesar do apoio que já receberam de algumas pessoas da cidade — nesse momento, vão chovendo nomes na nossa mesa de entrevista. "Queremos destacar o Diego Magrelo, que ajudou a compor o cenário; Mário Moreira, que nos auxilia com toda a parte de arte visual, junto com o Jéferson; Gugu e Serginho, que emprestam os equipamentos de som; Gustavo e Anderson, que ajudam com a iluminação; Mônica, que faz as filmagens; João Artigos e Márcio Libar, que apoiaram a produção do Anjos do Picadeiro e Bruno Lo Bianco e Alexandre Revés, que fizeram a produção de ‘Rio é rua’. Sem eles a Punk Rock Circus não teria passado de um projeto no fundo da gaveta”, dizem os três —, as dificuldades de apoio financeiro ainda são um entrave para a realização do trabalho. Instrumentos, equipamentos, figurino, maquiagem, tudo isso depende de recursos. Apesar disso, muitos convites para apresentação estão surgindo, graças também a grande ajuda na divulgação que os amigos da banda dão nas redes sociais. "Quando chegamos para nos apresentar e o público canta nossas músicas, sabemos que eles conheceram nosso trabalho antes, na internet. Isso é gratificante demais”, dizem Dalmo e Jéferson, quase uníssonos. Dalmo está fazendo aulas de canto, para melhorar as apresentações, e diz isso todo cheio de orgulho. E cheio de orgulho também comenta sobre a participação de seu filho, Ian, e do amigo dele, Frederico, na Punk Rock Circus.
Embora a banda tenha se formado recentemente, já tem história pra contar. Pelo menos meia hora de nossa entrevista foi dedicada a um episódio que aconteceu no Eu Riso, em Fernandópolis. Johnny Melville, famoso mímico escocês e uma das grandes atrações do evento, brincou com a Punk Rock Circus em sua apresentação, reconhecendo o trabalho do grupo. "Os alunos foram reconhecidos pelo mestre! Isso que é rock and roll”, concluem. Experiência semelhante aconteceu no espetáculo Noites de Parangolé, na Fundição Progresso, com um dos grupos de palhaços mais conhecidos no Brasil, o Teatro de Anônimos.
O trabalho diferente da Punk Rock Circus também cobra um ingresso diferente: o famoso "chapéu”. Cada um na plateia dá o que tem e que julga justo pelo show, num dos momentos mais engraçados da apresentação. "A gente só pede que não botem só bala no chapéu, porque né...”, finalizam nossa entrevista, divertida, leve, engraçada. Afinal, como entrevistar três palhaços sem sair com a boca doendo de tanto rir?
Para quem quiser conhecer, o grupo mantém uma página no Facebook — Punk Rock Circus — e tem vários vídeos de shows no YouTube. Mas, leve como uma bigorna, o som é altamente desaconselhável para pessoas de coração fraco. Vocês estão prontos para o rock and roll?
Rio é Rua
Letra: Dalmo Latini | Arranjos: Dalmo Latini, Leonardo Benvenuti e Jéferson R. Cunha | Produção: Bruno Lo Bianco (Estúdio 100condições FC) e Alexandre Revés
Vindo de todas as partes
De todo lugar
Palhaços de todo o planeta
Irão se encontrar
Artistas do riso chegando
Do mundo inteiro
Dezembro no Rio
Tem Anjos do Picadeiro (bis)
Rio é rua... Rio é rua... Rio é rua... (bis)
O ano passou e nós
Nos veremos de novo
O riso chapado estampado
Na cara do povo
O picadeiro é a praça
E a lona é o céu
O ingresso é livre e você
Joga no meu chapéu... (bis)
Rio é rua... Rio é rua... Rio é rua... (bis)
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