“Pronto, veterano!” é como o novo comandante do 11º Batalhão de Polícia Militar, tenente-coronel Eduardo Vaz Castelano, saúda o ex-comandante Carlos Eduardo Hespanha ao atender o celular. A forma de tratamento vem desde a época em que os dois frequentavam o Centro de Formação e Aperfeiçoamento de Praças (CFAP), da Polícia Militar, em Sulacap, na Zona Norte do Rio. Vizinhos do Méier, os dois trabalharam juntos por muito tempo na PM.
No último dia 10, Castelano assumiu o posto de Hespanha em Nova Friburgo, que foi transferido para o subcomando da 7ª Companhia de Policiamento de Área (CPA), responsável pelos batalhões da Região Serrana e parte do Centro-Sul Fluminense. Antes de voltar para a cidade, Castelano estava à frente do 26º BPM, em Petrópolis, mas também passou pelo 36º BPM, em Santo Antônio de Pádua, no Noroeste Fluminense.
Ele trabalhou por 12 anos no 11ºBPM. Passou por todas as funções no batalhão até ser subcomandante (do Hespanha), em 2014. Já comandou o corpo de alunos do CFAP e também trabalhou, como civil, no setor de posturas, durante uma das gestões do ex-prefeito Heródoto Bento de Mello. Conhece Nova Friburgo há mais de 20 anos, onde parte da família veio morar. Seus dois filhos nasceram aqui. Foi aqui também que Castelano se formou em Direito, na primeira turma da Universidade Estácio de Sá, em 1997.
O novo comandante do 11ºBPM recebeu A VOZ DA SERRA no seu gabinete, na última quarta-feira, 19, quando falou de segurança pública na cidade, comentou como a crise no Rio de Janeiro afeta o trabalho da PM, e criticou a ausência do estado em comunidades. Sob o seu comando estão mais de 540 policiais militares e a responsabilidade de garantir a segurança de mais de 300 mil habitantes em oito cidades: Nova Friburgo, Bom Jardim, Duas Barras, Cordeiro, Cantagalo, Macuco, Trajano de Moraes e Santa Maria Madalena.
AVS: Os PMs não têm mais opção de aderir ao Regime Adicional de Serviço (RAS) porque o “extra” não é pago pelo governo há mais de um ano, assim como outras premiações por produtividade nos batalhões. Em meio à crise no estado, como é gerir um batalhão com poucos recursos?
Castelano: É preciso muita criatividade. Temos que fazer a máquina funcionar, porque temos cada vez mais demanda em tempos de crise. Precisamos trabalhar mais com menos. Destacamos policiais de algumas áreas para atuar em outras. Isso afeta, em certa medida, alguns setores, mas é o jeito. Tem que ter o entendimento no nosso pessoal para fazer jus às demandas. Temos uma frota grande de viaturas [cerca de 50] que precisa de manutenção constante. É um desafio. Quando o governo implantou o RAS e as premiações foi bom para todo mundo. Para o policial, porque pode complementar a renda, que é baixa, atuando fardado, e para o batalhão e a cidade, porque são mais agentes nas ruas. A criminalidade baixou, porque ela varia de acordo com a presença da PM, principalmente furtos e roubos.
O senhor disse que a PM tem cada vez mais demanda...
A gente prende [pessoas] e apreende [drogas] cada vez mais. Mas isso vem aumentando. Deveria ser inversamente proporcional, isto é, as ocorrências deveriam diminuir, mas não. A gente percebe que tem questões que fogem da nossa alçada. Questões que esbarram na polícia, mas que não são problemas de polícia. Tem cada vez mais drogas nas ruas. Por onde ela está entrando e por quê? Quantos já prendemos, foram liberados e no dia seguinte voltaram a praticar o crime? É preciso uma política de segurança pública mais séria e ampla. É preciso considerar onde governo não está chegando. Se formos, hoje, em comunidades como Alto do Floresta ou Alto de Olaria [onde as incidências de crimes são maiores], você vai ver uma grande quantidade de pessoas ociosas. Aí entra o clientelismo do traficante quando o morador necessita. O traficante dá bombons para crianças na Páscoa, remédios para quem precisa. Ele atua onde o Estado é ausente. A criança, o adolescente dessa comunidade passa enxergar o policial como inimigo, porque vai retirar do seu convívio alguém que ele considera.
Como resolver isso então?
Ao que cabe à PM, temos buscado integrar a comunidade com os policiais. Realizamos cafés da manhã no batalhão para a comunidade, onde nos reunimos para ouvir as demandas e nos aproximar da população. Tentamos quebrar pensamentos ruins sobre a polícia. Tentamos criar um vínculo de credibilidade com os moradores para que confiem em nós e passem informações para que possamos trabalhar da melhor forma possível.
Os relatórios do Instituto de Segurança Pública (ISP), divulgados mensalmente, mostram que as principais ocorrências registradas na 151ªDP são sobre tráfico de drogas, furtos e roubos. É isso mesmo?
Em quantidade de ocorrências, sim, a maioria é sobre tráfico de drogas, que conduz a outros crimes, como pequenos furtos e roubos. Uma prática puxa a outra. Temos observado, por exemplo, a atuação do tráfico na Rua José Tessarollo Santos, no Paissandu, onde tem se formado um grupo de usuários de drogas. Alunos que saem das escolas locais. Na região, temos registrado alguns furtos e roubos. Constatamos que o usuário, para sustentar o vício, começa a cometer esses crimes nas ruas, em casas e comércios. Usam faca ou simulacro de arma de fogo para abordar as vítimas, porque sabem que não ficarão presos se forem detidos. A arma é apreendida, mas só fica preso se for em flagrante delito.
Ainda ocorre migração de traficantes do Rio de Janeiro para Nova Friburgo?
Existe uma migração, mas em quantidade ainda controlável. Por eu ter trabalhado em outras cidades do interior, sei que a migração acontece de modo geral. Em Campos dos Goytacazes, Macaé, Cabo Frio a situação está pior. Aqui em Nova Friburgo, como em Petrópolis e Pádua, a escala é menor, porque quando o tráfico do Rio tenta ocupar comunidades, os próprios moradores, acostumados com traficantes locais, que geralmente conhecem desde pequenos, acionam a PM para cortarmos o mal pela raiz.
Qual o perfil do traficante no interior?
A forma de atuação do traficante do interior não é do enfrentamento. Em geral, eles correm, fogem da polícia, deixam a carga para trás e, em alguns casos, até deixam o tráfico por um tempo, mas voltam depois. A estratégia é não instigar a polícia, que afeta o comércio de drogas local. Os traficantes que vêm do Grande Rio tem o modus operandi de enfrentamento. Eles se sentem mais fortes, andam armados, com a facção criminosa por trás. Antigamente, o traficante era mais velho, mas ele tem ficado cada vez mais novo. Isso é um problema, porque o jovem é mais ousado, ou abusado, no enfrentamento com a PM.
Como o senhor pretende atuar em localidades como Alto de Olaria, Alto do Floresta, Cordoeira e Rui Sanglard, e também na Praça Getúlio Vargas, onde tem se registrado vários casos de venda de drogas ao ar livre?
Como disse, nessas comunidades, temos ocupações desordenadas, como é o caso do Terra Nova, por exemplo, onde faltam serviços públicos essenciais e iniciativas que ocupem os moradores ociosos. A situação se torna ainda mais complicada em meio à crise que vivemos no país. Falta emprego, aumenta a criminalidade. O que podemos fazer é manter o policiamento dentro das possibilidades e ampliar nossa rede de contatos, que nos ajudam a programar as ações de vigilância. Já nas praças Getúlio Vargas, Dermeval Barbosa Moreira e também no Suspiro, vamos reafirmar a parceria com a Guarda Municipal e pediremos ao prefeito Renato Bravo que nos ajude melhorando a iluminação dos espaços. Estive na Getúlio Vargas e há locais escuros. Sei que ele já está trabalhando nisso. A oportunidade faz o ladrão. A escuridão facilita as ações. Nesse perímetro, já estamos atuando com uma viatura na Getúlio Vargas e no Suspiro, dois policiais em motocicletas e em bicicletas. Temos feito várias apreensões. Mantemos também parceria com informantes e o programa de monitoramento por câmeras da cidade, o Cidade Inteligente, também tem nos ajudado.
A comunidade pode, e deve, então, ajudar a polícia...
Precisamos atacar a origem do problema, e, para isso, faço um chamamento aos pais. Vemos muitos jovens desvirtuados. Há muitos relatos de crianças e adolescentes saindo de escolas e indo comprar de drogas nas praças. Cadê os pais para orientar e cobrar os filhos? É preciso saber onde os filhos estão indo, o que estão fazendo. Precisamos que os pais cheguem junto. Não basta fazer filho e deixar que a vida crie ou que a polícia vai tratar o problema depois. Não vamos chegar a lugar nenhum assim
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