Flávia Namen
Lançada como forma de prevenir o câncer de colo de útero, a vacina contra o papilomavírus humano (HPV) não oferece garantia de proteção prolongada. É o que revelam dois estudos publicados recentemente na revista New England Journal of Medicine. Cientistas advertem que duas vacinas contra o câncer de colo do útero que estão sendo amplamente receitadas não possuem evidências suficientes de que os benefícios compensam o seu alto custo ou mesmo se garantem uma proteção eficaz contra a doença.
Vírus comum transmitido através de relações sexuais, o HPV provoca uma infecção que normalmente não causa sintomas e é debelada pelo sistema imunológico. Entretanto, em casos raros pode se tornar crônica e provocar câncer de colo do útero. Estima-se que 70% dos casos são provocados por duas linhagens do vírus, agora combatidas com as vacinas Gardanil, da Merck Sharp & Dohme; e Cervarix, da GlaxoSmithKline. A primeira também protege contra outras duas linhagens, que provocam problemas uterinos.
Desde que foram lançadas, em 2006, as vacinas são um sucesso de venda e já foram aplicadas em milhões de mulheres e meninas. “A despeito das grandes expectativas e resultados promissores dos testes clínicos, ainda não temos evidências da eficiência da vacinação contra o câncer de colo do útero. Com tantas questões ainda sem resposta, há boas razões para ser cauteloso”, destacou a editora da revista Journal of the Norwegian Medical Association, Charlotte J. Haug, que assina um dos artigos publicados pela New England Journal of Medicine.
O curto período de testes das vacinas, licenciadas em 2006 nos Estados Unidos, foi criticado por Haug. De acordo com ela, pesquisadores ainda não demonstraram por quanto tempo as mulheres vacinadas ficarão protegidas e se ao eliminar algumas linhagens do HPV, as vacinas não reduzirão a imunidade natural do organismo aos demais tipos do vírus. Para Haug, como o câncer só se desenvolve após anos de infecção crônica pelo HPV, não está absolutamente provado que a proteção contra as duas linhagens do vírus poderia reduzir as taxas de tumor uterino.
A outra pesquisa divulgada recentemente foi feita na Universidade de Harvad e analisou os custos das vacinas, concluindo que há uma boa relação custo-benefício somente em algumas circunstâncias. Para os pesquisadores, a imunização só valerá a pena se puder proteger uma menina por toda a vida.
O diretor médico da Merck, Richard Haupt, classificou as questões como “muito teóricas” e destacou que a continuação das pesquisas sugere que a vacina não traz problemas com outros tipos de HPV.
Vale destacar que o câncer de colo do útero geralmente pode ser identificado em estágios não invasivos e tem tratamento. Como a vacina só protege contra algumas linhagens do vírus, mesmo as mulheres vacinadas não estão livres de fazer exames preventivos.
Alto custo é a principal desvantagem
O ginecologista e obstetra Noberto Rocha reconhece que existe uma polêmica quanto à eficácia das vacinas, devido ao curto período de testes. “É um questionamento levantado por alguns grupos, que acham cedo para comprovar os benefícios das vacinas. Isso é comum e costuma acontecer em relação a qualquer medicamento novo lançado no mercado, mas as vacinas são aprovadas pela Sociedade Médica e são eficazes contra os dois principais tipos de vírus ligados ao câncer de colo do útero”, explica ele.
O alto custo das vacinas, cujo preço médio é de R$ 500, é a principal desvantagem encontrada por quem quer se imunizar, segundo Noberto. “Nos países ricos as vacinas estão disponíveis na rede pública, de forma gratuita. Já na América Latina é preciso pagar para se imunizar e o preço é o maior obstáculo para as interessadas”, destaca o médico.
Polêmicas à parte, o ginecologista recomenda a vacinação. “Os testes já demonstraram que as vacinas são muito eficientes quando aplicadas antes do início da vida sexual. Em minha opinião as jovens, principalmente as pré-adolescentes, cujas famílias podem arcar com os custos, devem se vacinar”, aconselha Noberto.
Glória Pires e a filha Antônia são as estrelas da campanha de vacinação
Em setembro do ano passado, o laboratório GlaxoSmithKline lançou uma campanha de combate ao câncer de colo do útero voltada a jovens que ainda não iniciaram a vida sexual. A atriz Glória Pires e a filha Antônia, de 15 anos, são as estrelas da campanha, que visa a conscientizar as mulheres sobre a importância da prevenção contra o vírus HPV. Com o slogan Evite o câncer de colo do útero; fale com seu médico; proteja sua filha, a iniciativa destaca a importância da vacinação para proteger jovens da doença.
O texto da campanha alerta que a primeira relação sexual tanto de homens como de mulheres ocorre, em média, aos 15 anos de idade, segundo pesquisa encomendada pelos Cadernos de Saúde Pública da Fundação Oswaldo Cruz, no Rio de Janeiro. “Por isso, o diálogo aberto sobre sexualidade com sua filha é fundamental, para protegê-la das doenças sexualmente transmissíveis, conhecidas como DSTs. A informação e sua atitude em prol da saúde de sua filha são fundamentais no combate contra o HPV”, diz trecho do texto.
Em sua maioria, mulheres sexualmente ativas serão infectadas por um ou mais tipos de HPV ao longo da vida. Qualquer pessoa infectada com HPV desenvolve anticorpos, que poderão ser detectados no organismo, mas nem sempre são suficientemente competentes para eliminar os vírus. Por isso, a melhor arma contra o HPV é a prevenção, através de algumas medidas, como manter cuidados higiênicos; ter parceiro fixo ou reduzir o número de parceiros sexuais; usar preservativos em todas as relações sexuais; visitar regularmente o ginecologista para fazer exames de prevenção como o Papanicolaou, que deve ser realizado anualmente e permite a identificação de lesões pré-cancerosas no colo do útero.
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