O segundo domingo do mês de maio costuma ser antecipado por um sem número de mensagens de felicidade, agradecimento e celebração em homenagem às mães. As imagens apresentadas costumam remeter a momentos de carinho, com famílias felizes, descontraídas, sem nenhum sinal de dores e mágoas – coisas tão comuns em quaisquer relações familiares.
Os ressentimentos, claro, podem ser postos de lado, resolvidos ou abrandados. Mas também podem ser piorados. O tempo chega para todos, e com ele, soluções ou problemas ainda maiores. Em alguns casos, o afastamento é a única solução.
Visitando o Lar Abrigo Amor a Jesus (Laje), no bairro da Lagoinha, é possível se encontrar os mais variados cenários de abandono, todos estampados em olhos empapuçados, cansados e consumidos pela experiência. Os dias passam escorridos, lentos, envoltos em lembranças, para alguns, confusos, mergulhados em um mundo próprio, beirando os cem anos – os bailes, músicas, parceiros de salão, as ferramentas da memória para que o presente, algumas vezes de abandono, seja amenizado.
Para a atual presidente do abrigo, Clélia Maria Barbosa Rangel, é importante que este cenário de abandono, ao qual alguns idosos são submetidos pelas circunstâncias da vida, seja sobreposto. Para isto, o contato entre familiares e idosos deve ser estimulado. Algumas vezes, ainda que por forças maiores, como o Ministério Público.
Clélia entende que existem traumas, mágoas, sentimentos conflitantes entre familiares, mas eles precisam ser deixados para trás. Carinho, afeição, suporte e atenção – tudo isto é muito importante para o processo de envelhecimento destas pessoas. Alguns, recém-chegados ao abrigo, sentem lógico desconforto, e o grupo de cinquenta funcionários da instituição os ajudam na adaptação, fornecendo-lhes atividades, incentivando-os a criar e desenvolver hobbies.
Ao se visitar o abrigo, algo extremamente recomendado a todos aqueles dispostos a abrir novas perspectivas e harmonizar-se com a vida e seus caminhos, vê-se o esforço de Clélia e sua equipe para que a tristeza não tome conta desses adoráveis senhores e senhoras. Os cenários criados por cada um deles são estimulados até o limite do possível; os tempos áureos da juventude são acesos, comemorados.
Enquanto a reportagem de A VOZ DA SERRA visitava o abrigo em busca de mães e suas histórias, uma grata surpresa nos foi revelada: negociando com Clélia para que a presidente da instituição lhe emprestasse o carro, a professora aposentada e poetisa Lídia Ferreira, 68 anos, a chamou de “mãe”.
Clélia, que há muitos anos trabalha como voluntária no abrigo, e que após ter se aposentado, assumiu as tarefas do Laje em tempo integral, diz ser muito comum esse tratamento. A principio, ainda tentou desencorajar que a chamassem assim, mas o fato é que a identificação materna é latente; o zelo, o amor e a dedicação que a presidente do abrigo dedica a esses “filhos” de cabelos brancos a colocam na posição de uma grande mãe, que reconhece e ama as limitações de cada um dos seus.
Numa cidade em que a expectativa de vida pode atingir com facilidade uma centena de anos, é bom saber que, mesmo na velhice, existem mães dispostas a oferecer carinho, diminuir as distâncias e, principalmente, a amar.
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