Há poucos dias recebi de uma amiga uma citação do meu cronista predileto, Caio Fernando Abreu. Rita nem sabia da minha admiração pelo escritor, mas como sou daqueles que acreditam no nada acontece por acaso... Pois bem, na citação enviada por ela, Caio fala sobre seu cansaço em insistir no amor, se diz “exausto de construir e demolir fantasias”. E completa entre outras frases marcantes: “amor é falta de QI, tenho cada vez mais certeza”.
Nem pensei muito e logo respondi à minha amiga: amar é sempre muito bom, ainda que às vezes seja demolir fantasias construídas. Mas é preciso amar e se quem ama é “burro” que todos sejam mais burros e cada vez mais competentes e entregues à burrice. O que eu mais quero é ser burro, o maior burro de todos e desejo a todos quilos e quilos de burrice. Burrice tipo ingênua. Burrice tipo alegria. Burrice tipo divertida. Burrice tipo sonho bom. Burrice do seu tipo, do seu jeito de ser burro, de sofrer, de perder, de reconquistar e acreditar de novo que essa coisa toda de amor é possível, ainda que nem sempre seja exatamente como filme de Hollywood ou novela da Globo.
Buquês de burrice! Cartões cheios de burrice! Músicas repletas de burrice e acima de tudo aquele silêncio pós-beijos perfeitos e apaixonados repletos de burrice!
Assim sendo, não posso desejar e querer outra coisa que senão a falta de QI. Quero essa tolice de amar ainda que não seja amado, e, melhor ainda se for correspondido mesmo que não à altura. Para quem ama sempre parece que pode ser mais, ainda que importe mais o que se sente do que o que o outro necessariamente sinta... Não quero dizer com isso que quem ama não faça tudo para que o outro também embarque nessas estrelas cadentes que voam no céu. Há disposição total e tola para dar mais que conforto a quem se ama numa incessante busca de também levar o outro a descoberta da melhor sensação que existe. Se amar faz mais bem a quem ama do que propriamente quem é amado, se torna pleno quando ambos se entregam à mesma sintonia. Eu, particularmente, nunca experimentei sensação melhor do que a aventura perigosa de amar.
Quero que toda a burrice de amar invada o meu peito e entorpeça meu ser. Nada nos faz sentir mais vivos. Nada nos faz mais completos, contemplativos, inspirados... Inspirados, inspirando um mundo coberto de cinza, mas que por dentro é vermelho, multicolorido...
Mas a burrice de amar é para os sonhadores que gostam de dividir seu mundo. Essa burrice louca que desmaterializa e torna menos egoísta quem por ela é possuído.
Sabendo disso não posso continuar querendo outra coisa. Quero essa burrice de se pegar rindo de nada no meio de tudo. Quero essa burrice de encontrar vocações no céu independente de sua cor e de seus presentes. Quero a magna burrice de acordar mais disposto e de ir dormir com borboletas no estômago. O amor é capaz disso. Quero que minhas mãos fiquem mais burras pela necessidade de fazer carinho no rosto armado. Quero que meus braços fiquem mais burros na busca por esparramar meu abraço. Quero que meus olhos fiquem mais burros ao brilharem insistentemente quando vejo ou apenas penso no ser amado. Quero que minhas pernas fiquem mais burras e assim bambas me levam para o encontro que vicejo. Quero a burrice que faz meus lábios terem necessidade do beijo que me faz voar, e, por apenas um me dar asas, quero acima de tudo essa burrice que me faz o mais fiel entre todos. Quero que meu coração fique mais burro ao disparar toda vez que o nome do amado é pronunciado ou apenas cantado em verso e prosa nas minhas correntes sanguíneas. Quero que meu corpo inteiro fique mais burro e que até minha alma suplique à santa burrice de que esse estado seja o mais permanente possível.
Burrice que completa não pela ignorância de não saber, mas pela incerteza que visita constantemente na certeza do que se sente ao ponto de te transbordar em fogos de artifício.
Pode parecer burrice essa espera de estar junto e burrice ainda maior ficar junto, mas o que importa é alcançar a tal felicidade que encanta ao ponto de te transformar em encantador.
Não há burrice alguma em enlouquecer e declarar aos quatro ventos que ama. Pode ser que esse amor se desfaça como castelos de areia, pode ser que perdure, pode ser que corra vez em quando o risco natural do fim, e, ainda que o fim venha, ainda sim todo o caminho de burrice trilhado há de ter sido feliz, há de ser bom!
É a mais certa das certezas: a burrice de amar te entusiasma a viver.
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