Faz tempo que não paro para ler a revista da semana, vejo sem ler as matérias sobre ciências, esporte e TV. Há tempos que não escrevo uma carta para aquele amigo que tanto amo. Há quantos dias, semanas, meses, sei lá, não declamo poemas para o travesseiro.
Sinto falta daquela sobra de tempo para alongar as conversas de filosofia barata, tenho saudades dos intervalos entre uma cachaça e outra. Quero tempo porque o tempo que me sobra é apenas para a nostalgia de outros tempos. E amanhã? O que será de mim se hoje já não tenho tempo para fabricar as nostalgias de depois?
Fui feliz sem saber e agora sou feliz apenas pela felicidade que tive. Queria ter mais tempo para pelo menos folhear o jornal antes dele virar embrulho de peixe. Mais minutos para vaguear pelos devaneios que me revelam a poesia de chuveiro. Sentir-me completo pela simples oferta de psicanálise gratuita nos conselhos que recebo e dou na mesa de bar improvisada na calçada de esquina.
E todos estão assim, correndo como loucos, numa corrida sem linha de chegada, sem aventura, sem chance para pensar e refletir para que lado se quer ir de fato. Não há momentos de saborear as horas, e tudo e todos passam, vendo sem enxergar o Sol nascer e se pôr, morrendo sem sentir a vida crescer, envelhecer até se extinguir. Todos cheios de compromisso, sem compromisso com o que importa, com o que é intenso, com o que nos diferencia dos insetos.
Por que complicamos tanto? Por que não crescemos, sem ter que perder a essência de menino? Aquela meninice, aquele ímpeto jovem de querer mudar o mundo e se entregar às paixões...
Quero tempo para fabricar saudades futuras. Estou, estamos tão desatentos, menos apegados, menos preocupados, menos sentimentais, talvez. Como me perdi de mim? Foi quando deixamos a indiferença se instalar em nossos peitos?
A indiferença mata, nos limita, nos elimina ao esvaziar as boas e más emoções, pois não há nada que nos faça mais vivos que as emoções.
Uma história sem emoção é caderno gasto, esquecido por suas linhas não preenchidas, em branco, amareladas pela ausência de quem se motive a folheá-las. Não causa interesse, não ilumina, nem escurece, apenas inexiste.
Somos seres em autoextinção...
Por isso, vem! Vem brincar com o tempo de ser feliz de novo. Solta esses braços, bagunce esses cabelos e ria, gargalhe sem parar, porque o tempo é moleque quando o convidamos para pular corda e se divertir com os piques existentes e aqueles que inventamos ao deus-dará! Vem porque o tempo é companheiro e se coloca nessa roda furiosa dos dias que envelhecem, é verdade, mas fecha os olhos e imagina que essa roda é roda gigante que gira e nos dá o direito de apanhar estrelas, tocar Marte e quem sabe até andar de bicicleta no anel de Saturno. Faz barulho, embrulha o silêncio com o papel de pão rabiscado de poesias de rimas infantis e juntos vamos chamar o tempo para temperar a terra, provocar turbilhões aqui e acolá, em todos os corações e sejamos felizes nas coisas simples, como a de ter tempo para ver um bom programa de TV e dançar em frente ao rádio, ter tempo de dizer “te amo” ao amigo e, amando-o, divertir-se com ele em cada segundo e, dividindo a vida, multiplicar o tempo.
O tempo está na estante e corre, voa pelos ponteiros do relógio, no comprimir e exprimir do coração, e não dá para ser indiferente a isso, como não dá para fingir que a tristeza e a alegria são importantes, pois se é alegre e triste vivendo, se emocionando, aproveitando o tempo em cada milésimo de segundo ofertado de maneira intensa. Deixa o “faz tempo” pra lá e façamos do tempo, façamos com o tempo tudo o que podemos até não poder mais!
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