Palavreando - 7 de março

Por Wanderson Nogueira
sexta-feira, 06 de março de 2009
por Jornal A Voz da Serra

Rua Portugal

Na pequena península que imita o país que lhe empresta o nome tudo acontece. Bem no coração da cidade. Todo tipo de gente se reúne, todo tipo de tribo conversa. Começa com pizza e termina com pão. Como toda boa rua do grande centro tem lanchonete chinesa com seus pastéis de vento, saúde cara para as vistas e centenas de bons e maus filmes à espera de serem alugados. O paraíso e o inferno, no entanto, ficam entre o meio e o fim. É ali no meio que se concentra a multidão da noite, incomodando os moradores dos prédios, mas provando que é possível reinventar os dias de boemia.

Na mesa de bar amigos riem e gargalham de suas próprias desgraças. Amizades que estreitam laços na bebida por desculpa. A cerveja gelada é só um pretexto para colocar o papo em dia e dizer em outras palavras que “estamos aí pro que der e vier”. Mesas se acotovelam por espaço, mas se respeitam. Vozes se sobrepõem umas às outras, mas respeitam a conversa alheia. E se fala de futebol, de mulher e de homem. De música, televisão e política. Daria para fazer um jornal ou revista com tanta informação despejada sobre os esgotos nem sempre tão bem tampados. Daria para incrementar um programa de debates, afinal, há sempre um tentando convencer o outro.

Ali é um lugar privilegiado para um escritor. O cotidiano acontece naquela rua de pedestres, que alimenta histórias repletas de personagens, bons e excelentes personagens, com suas mais diversas e belas manias. Passarinho, Bob, Rubinho, Sidney, Marcinho, Marquinhos, Toninho, hippies, garçons, emos, Waltinho, gente normal e esquisita, o homem que todos os dias leva sua própria cadeira e senta na mesma mesa para ler jornais, o vendedor de amendoim, o secretário, o jovem, o velho. É um pequeno país cheio de vida, com tantas diferenças, mas com causas parecidas. Todos só querem se divertir! Também descansar, ter um pouco de paz, esquecer do estresse repetitivo, enfim, se divertir à sua maneira.

A história vai se construindo e outros personagens vão surgindo. Gente que abandona a juventude e gente que não pode deixar a meninice de lado. Saudades de quem por ali passou e não passa mais. A rua fica cada vez mais cheia, mas também mais vazia. Rostos não podem ser substituídos e trejeitos não podem ser perfeitamente imitados. As gerações mudam, a tradição permanece e a Portugal fica. Sob aqueles ladrilhos de sonhos e também um pouco de angústia, todos deixam um pouco de si e levam um pouco dos outros, mesmo que jamais se saiba o nome de todos.

Desce um Stonehenge aí! Quem sabe uma “88” com menta. Não, não, eu só fico na cerveja mesmo. E não importa o que você bebe. Na Rua Portugal o que você quer mesmo beber é vida. Porque todos têm sede de vida. E ali a vida se faz de aventura, descomprometimento, conversa fiada e amizade. De um jeito bem simples, o que se quer é não desperdiçar a vida na frente de uma TV. É melhor gastar o tempo com quem se gosta, livre e ao ar livre na Portugal.

A noite finda, muitas vezes cedo para padrões tipo cariocas, mas amanhã tudo será como hoje. E daqui a alguns anos, quem sabe, nossos filhos estarão ali, naquele beco bebendo a boa vida, comendo pizza ou simplesmente comprando pão. Ou todas essas coisas...

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