Pescador de lua
Queria ter um anzol para pescar a Lua. A Lua daquela noite mágica que se desfez ao calar da coruja e que se eternizou apenas em minhas doces lembranças. Queria ser quem sabe aquela estrela solitária que acompanha a Lua sem temer ser ofuscada ou esquecia pelos tantos outros pescadores de Lua que a observam e admiram o emprestar de sua clara luz. Ser aquela estrela só para ficar mais perto da Lua.
Clara luz da Lua que veste os tantos pescadores de Lua que dispensam qualquer outra vestimenta e contemplam a sorte de verem a Lua sorrindo, cantando talvez... Pescador de Lua que busca flagrar ao menos uma vez o bocejo da noite, o suspirar dos planetas, o sorriso de Plutão.
Fazer parte do universo e mesmo em meio a toda poeira cósmica, ser visto... Iluminado. Ser assim como o menino ao lado de uma rosa num planeta distante e solitário. Ser como o cometa que ligeiro pouco pode ser apreciado. Ser como o astronauta, testemunha da imensidão que é a Via-Láctea. Ser como o anel de Saturno abraçando um gigante. Ser como o buraco negro, misterioso, temido e que a tudo engole. Mas estou aqui embaixo, observador, pescador de Lua. E, apesar de limitado, divino.
Não preciso ser gigante, nem veloz. Não necessito ser essa luz derradeira, tampouco quero ser esse solitário. Afinal, daqui de baixo tenho a Lua e aquela estrela solitária. Não sei se pareço com a Lua ou com estrela solitária, nem sei se sonho em ser uma ou outra. Ambas podem ser pescadas. Sim! Talvez prefira mesmo ser o pescador de Lua... Pescador dessa ilusão de poder pescá-la e admirá-la por algum instante para então devolvê-la ao imenso pano azul que se estende sobre minha varanda. Mas mortal e simples que canta o coaxar da noite terrena, apenas me contentaria em ter por alguns segundos na palma da mão aquela pequena estrela que acompanha a Lua. Não roubaria uma centelha sequer de sua luz. Admiraria no limítrofe tempo concedido a essa relação e devolveria a pequena estrela à noite, ou melhor, à Lua.
E não quero as luas do universo afora, nem as estrelas que viajam pelo espaço. Só aquela Lua e aquela estrela que habitam minha janela todos os dias e que ilustram as poesias que embrulho como oferendas à escada que se constrói para o meu encontro com o inatingível.
Sei que por aí há muitos outros pescadores de Lua que içam seus anzóis e sonham em ter outra noite como aquela mesma noite, em que ao olhar de cada um, existia apenas a Lua com a estrela solitária e eles, cada um deles, em suas varandas refrescadas pelo frescor do bom vento.
E não há porque disputar a posse da noite, nem daquela noite. A Lua não tem dono ainda que se empreste a quem lhe reconhece. Talvez até se entregue a quem lhe ofereça poesias em uma isca que acaricie, não maltrate, não fira, não doa!
Mas todos, como eu, são meros sonhadores que desejam a lua mais do que a possibilidade de ter um anzol para pescá-la. Sei que ninguém quer possuí-la, até porque sabem que deuses não podem ser aprisionados, que luz é para ser dividida ainda que se esteja apaixonado. E é difícil não se apaixonar pela Lua daquela noite. Ela estava vestida com toda a noite e carregava um estrela, uma única estrela como acessório para inebriar, encantar e roubar a alma de todos que estavam atentos ao seu caminhar pela mais doce das madrugadas que já se ouviu falar.
Queria ter um anzol para pescar a Lua, ser quem sabe aquela estrela, pérola da Lua daquela noite. Mas desde que a vi, me tornei apenas um pescador de Lua que escreve poesia como oferenda para a escada que se constrói para um dia quem sabe subir até ela e morrer acariciando a face de quem me roubou a alma.
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