Palavreando - 13 de fevereiro.

Por Wanderson Nogueira
sexta-feira, 12 de fevereiro de 2010
por Jornal A Voz da Serra

Uma noite

Hoje pela primeira vez não liguei a televisão antes de dormir. Apaguei as luzes, deitei em minha cama, me ajeitei no travesseiro e de repente o teto do meu quarto se encobriu de estrelas. A noite com a lua e as estrelas vieram para dentro do meu quarto e por um instante não precisei dos sonhos que me aguardavam madrugada adentro.

É como se por um instante, eu não precisasse desejar nada, planejar nada, vislumbrar nada, esperar por nada, querer nada além, afinal eu tinha a noite livremente presa dentro do meu quarto.

Sem silêncio, sem barulho... Essa deve ser a experiência da paz: sentir-se vivo sem o compromisso de estar vivo e sentir-se leve sem a preocupação de estar morto. E eu não sei se é o dia perfeito que nos dá a noite perfeita ou se é estar com as pessoas certas que nos dá a certeza de que a noite pode sair lá de fora, com a lua e todas as estrelas para caber imensa no meu quarto, repleta sobre o meu colchão. Mas sei que nesta noite não careço de nada, a não ser da própria noite dentro do meu quarto, das estrelas velando a minha paz celestial, dessa luz sobre o que não vejo, mas iluminando o que sinto.

A noite estendida ao infinito do lado de dentro da minha janela. A noite tão cheia de mistérios e eu sem querer desvendar um mistério sequer. A noite está ali, perto de mim e só sei abraçá-la, me deixar ser abençoado por ela tão magnífica... tão esplendorosa na simplicidade do meu quarto, na singeleza da minha vida. E eu não quero fechar os olhos para não deixar de acreditar, afinal a noite está no meu teto e não na parte interna de minhas pálpebras.

Talvez seja produto da minha imaginação ou talvez seja isso mesmo, não precisar de nada além do que se tem. Nem milhões de dólares, parafernálias modernas ou multidões. Tampouco perguntas, planetas e Disneylândia. Muito menos modelos, galãs e infláveis. Apenas aquelas poucas que de tão perfeitas compartilham conosco a perfeição de estar aqui e agora num aqui e agora com sabor de para sempre.

“Isso pode ser amor”. Confesso-me para o meu travesseiro. Isso é amor! Confidenciam-me as estrelas no teto do meu quarto. Espiam-me e decifram-me, mas não me revelam. E me ponho a pensar sem pensar em nada que a vida simples é boa, exageradamente boa e fantástica. E é isso que quero como sempre esperei. Resgatar a noite para dentro de meu quarto, no meu teto, sobre a minha cama, todos os dias. Deixar-me ser pescado pelas estrelas, deixar-me ser encantado pelo canto das sereias que pousam suavemente no chão do meu quarto e flutuam até sumirem na imensidão do mar. E o azul da noite se confunde até se fundir com o azul do mar e tudo vira um gigantesco azul que me engole dentro do meu quarto que cabe a noite estendida para tantas outras galáxias e o mar com lençóis que desembocam em tantos outros oceanos.

E não quero que a noite acabe tanto quanto quero viver o próximo dia para receber a próxima noite em meu quarto e experimentar a vida em tudo aquilo que posso. Talvez isso seja felicidade, talvez seja apenas vida ao ponto que vida e felicidade são pleonasmo. Tudo isso em uma noite, uma noite que, de repente, invade o meu quarto para estrelar os meus dias.

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