Pague os seus pecados, seja perito

sexta-feira, 29 de maio de 2009
por Jornal A Voz da Serra

A perícia médica é um emprego que não se deseja nem para o mais mortal dos inimigos. Aliás, muitos a consideram uma BO, bonitinha mais ordinária, pois paga um salário bonzinho, mas em nenhum momento remunera de maneira adequada os percalços por que passa um perito no seu dia a dia.

Para ilustrar tal afirmativa, transcrevo abaixo um documento que foi entregue a um dos peritos que trabalham na perícia, na segunda feira, 18 de maio:

“Provider – Comunicado de Registro de Ameaça

Segurado PSCG, entrando em contato com a central de atendimento 135 / Caruaru, PE para reclamar do indeferimento de suas perícias entabulou ameaças de agressão contra médicos peritos da APS (Agência da Previdência Social) de Nova Friburgo, RJ, usando termos de baixo calão dizendo: “Vai acabar eu indo no INSS e fazendo uma merda.... Se eu bater de frente com um médico ali, eu vou meter pau mesmo... E fora vou meter bala neles. Vou engavetar um médico. Meter a cadeira na cabeça deles ou um computador. Vou ferrar um filho da mãe desses.

Termos usados na íntegra pelo segurado

Diante do exposto que essa ouvidoria possa inferir”.

Gostaria de chamar a atenção para o fato de estarem Ministério da Previdência Social, o próprio INSS e sua procuradoria e o Ministério Público a par de tais ameaças, uma vez que elas são uma constante no dia a dia da profissão. Em todas as APSs há relatos de agressões verbais ou físicas, algumas terminando em morte do perito. Aliás, está é apenas um detalhe para os gestores da Diretoria de Benefícios, pois são eles os responsáveis pelos inúmeros artifícios que tornam difícil encerrar um benefício após sua concessão e que geram toda essa pseudorrevolta nos segurados.

O pior é o desconhecimento da população sobre as finalidades da perícia médica, estimulado ladinamente pelo próprio governo, o grande beneficiário da ignorância coletiva. O benefício tornou-se moeda de troca para políticos, contribui para a diminuição da taxa de desemprego e é um bom ganha-pão para muitos profissionais liberais sem escrúpulos, médicos que alimentam a indústria dos atestados e advogados mal intencionados, que conhecem as falhas do sistema.

No meio disso fica o perito médico, treinado para conceder o que é devido e negar o que não é de direito. Desamparado, pois nem seu empregador, maior interessado no bom desempenho da sua equipe médico pericial, se propõe a correr em sua defesa. Paga-se uma fortuna com a propaganda oficial, para convencer a sociedade de que instrução não é importante para se governar um país, mesmo que as asneiras proferidas aqui e acolá, sejam dignas de fazer corar Emília, a boneca de pano criada por Monteiro Lobato. No entanto, nenhuma matéria para mostrar a diferença entre doença e incapacidade laborativa; que benefício não é mais uma das bolsas criadas para estimular o ócio do trabalhador, mas sim uma ajuda temporária para cobrir aquele período no qual a capacidade laborativa está diminuída ou ausente; que o fato de pagar (ou ser descontado) o INSS não implica ter benefício garantido em qualquer circunstância.

O que se vê no universo médico pericial é uma contradição à lógica, pois as doenças que acometem segurados do INSS contrariam as estatísticas médicas, uma vez que a maioria é resistente a tratamento, cronificam e não melhoram jamais.

Quando uma ameaça dessas se consuma, todos os envolvidos, como num balé macabro, aparecem para as lamentações de praxe, as promessas de impacto até que o tempo se encarregue do esquecimento das grandes tragédias. Só que os peritos precisam de ações competentes para ontem, para que o seu trabalho não seja uma provação e sim um sentimento agradável de participar na construção de um país sério em que dignidade seja palavra de ordem.

Dr. Max Wolosker Neto, jornalista e médico

Email: woloskerm@gigalink.com.br

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