“Os químicos têm a possibilidade de mudar o mundo à sua volta”

sexta-feira, 30 de março de 2012
por Jornal A Voz da Serra

Valdir Veiga Junior admite que os médicos veem com reservas os fitomedicamentos e lhes dá razão, pois muitos indivíduos atuam nesta área sem a devida capacitação. Sim, este é um terreno fértil para o curandeirismo e a picaretagem e ele reconhece isso. Por outro lado, o conhecimento tradicional é muito importante e Valdir Veiga, como muitos de seus pares, é o primeiro a valorizá-lo.

“Desde sempre as pessoas usam as plantas para tratar seus males. Infelizmente, esse conhecimento é complexo e pertence às pessoas mais ligadas à terra e não à população urbana. Mas lamenta o fato dos jovens das comunidades rurais estarem deixando de se interessar pelo conhecimento das ervas. Ele mesmo esteve em uma delas, no rio Solimões, em que o conhecimento das plantas medicinais era só o aprendido na televisão. “Não davam valor ao conhecimento dos avós, só às novelas e programas com pouco conteúdo”, disse.

Mas é importante destacar que os leigos, de uma maneira geral, não sabem sequer como identificar a planta corretamente nem, muito menos, detalhes de dosagem ou se existem problemas na ingestão de determinados chás por mulheres grávidas ou em lactação. Os médicos estão certos em só receitar os medicamentos que já possuem uma padronização e diversos estudos que comprovem as propriedades dos mesmos. Em outras palavras, só depois de contarem com o aval da Anvisa, o órgão regulatório dos medicamentos, com suas doses terapêuticas estabelecidas conforme a composição.

Valdir Veiga Junior explica, a seguir, que já foram isoladas várias substâncias muito ativas, como o taxol, utilizado no tratamento de alguns tipos de câncer de mama, assim como fitomedicamentos que já foram padronizados.

Mas faz questão de destacar também o fato de já terem ocorrido muitos casos de excesso de consumo de suplementos alimentares com fitoterápicos e chás para emagrecer ou melhorar o rendimento físico em exercícios. Os resultados foram mortes por intoxicação e hepatite. Sem falar nos fitomedicamentos importados da Índia e da China que podem ser adquiridos pela internet e que contém metais muito tóxicos, como chumbo e mercúrio. Um perigo.

Propriedades terapêuticas dos óleos de copaíba

O professor Valdir Veiga Jr. coordena um grupo que estuda há dez anos os benefícios dos óleos de copaíba na Universidade Federal do Amazonas. Alguns dos óleos de copaíba têm efeito antimicrobiano e um dos principais achados foi a atividade anticancerígena. Também já conseguiram comprovar a atividade desta substância contra leishmaniose e substâncias interessantes nas cascas, como o ácido betulínico, que estão em fase de testes para o tratamento do vírus HIV.

Ele destaca, porém, que embora algumas vezes sejam consumidos como se fossem iguais, os óleos de copaíba são diferentes entre si e têm propriedades igualmente diferentes.

“Os óleos do Rio de Janeiro e de Minas Gerais não têm a mesma composição química e, portanto, não vão ter as mesmas ações farmacológicas do óleo da região de Manaus, por exemplo. Mas existe uma atividade comum a todas as espécies de copaíba: a ação anti-inflamatória.”

Sua equipe também está estudando plantas que produzem resinas como o breu para o tratamento do vírus HIV, conta, afirmando que substâncias semelhantes já são utilizadas no coquetel. Sua equipe também pesquisa a ação oxidante de algumas plantas para o uso em cosméticos e como suplementos alimentares, não como medicamentos.

“Todas as plantas produzem substâncias antioxidantes, embora algumas produzam mais que as outras. E extratos destas plantas podem ser utilizados em dietas de prevenção de diabetes, diminuição de glicemia e também do nível de colesterol no sangue.”

Papo vai, papo vem, a conversa volta para o assunto preferido deste cientista: a química, o que ele mais gosta de fazer, estudar, desenvolver, ensinar. Mas... logo química? No que ele responde com um enfático “Claro!”

“No Ensino Médio, o estudo da química costuma ser muito desestimulante. É ensinada com poucos recursos de laboratório e multimídia e os alunos acabam decorando nomenclaturas ou aprendendo aplicação de regras de três. Ao invés disso, deveriam ficar entusiasmados com a química no seu dia a dia, estudando hormônios sexuais, os efeitos do álcool e das drogas no organismo, o metabolismo dos alimentos, como funciona o combustível de foguete, o cimento, o alisamento dos cabelos, o airbag, como produzir vidro, fogo, margarina, sabão. Era para ser a disciplina mais interessante, a mais diferente e apaixonante, mas infelizmente é chatinha. Se os professores fossem melhor remunerados teriam mais tempo para se dedicar à preparação das aulas e ao aperfeiçoamento. Nas universidades, o ensino tem mais qualidade e a interação com as pesquisas atrai muitos jovens. Ainda assim, os níveis de desistência são elevados. Uma pena, pois os químicos têm a possibilidade de mudar o mundo à sua volta.”

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