Erika de Souza Bueno*
O fim dificilmente é lógico e, tampouco, se obriga a ser feliz. A ansiedade toma conta e é evidenciada por olhos lacrimejantes que se negam a piscar. Cada detalhe, cada gesto, cada olhar, cada cena...
Sem se dar conta, o espectador se vê envolvido por uma atmosfera de tensão, medo e um sentimento inexplicável que o faz torcer por um determinado fim. Nada o satisfaz mais do que ver o vilão recebendo as recompensas negativas por todos os males que praticou contra o inofensivo “mocinho”. Como se não bastasse, inúmeras vezes o castigo do vilão não satisfaz os desejos de violência que foram gerados por uma narrativa surpreendentemente eficaz.
É até difícil explicar, pois é muito diferente do que acontece com a narrativa no papel, na qual escrevemos detalhadamente as características físicas e emocionais dos personagens. Na narrativa do cinema, evapora-se a necessidade da escrita, pois todas essas características ficam a cargo do olhar do espectador, que se delicia pelas expressões corporais e faciais dos personagens, além dos aspectos dos cenários.
Tudo isso ganha muito mais ênfase quando se soma à trilha sonora e aos inumeráveis enquadramentos, os quais direcionam a atenção do espectador, que se vê vencido pelas técnicas dessa fascinante linguagem. São tantas as diferenças entre essas narrativas que chega a surpreender até o mais estudioso da arte que se rende ao fascinante mundo cinematográfico.
É preciso se questionar... O que, afinal, aconteceu com os finais felizes? Certamente, percebeu-se que a angústia, o medo e a violência dão muito mais audiência do que a felicidade, o amor e a paz. E assim, a narrativa cinematográfica caminha alterando os rumos e desafiando o intelecto de seus espectadores ao envolvê-los numa trama que, junto ao protagonista, deseja-se desvendar.
Completamente entrelaçado pelo filme, o espectador vibra ao descobrir os desdobramentos que tomará a história que está assistindo. Elogia, fica feliz e até cobra reconhecimento de seus pares ao enfatizar, repetidas vezes, que ele, “sozinho”, conseguiu prever tudo o que estava por acontecer naquelas dramáticas cenas. Esses sentimentos, é fato, também são perfeitamente possíveis e cabíveis em nossas literaturas, o que torna o cinema um dos recursos mais essenciais à sala de aula.
A narrativa cinematográfica é, então, um valioso objeto de estudo, que não pode ser negado aos nossos alunos. Mesmo que sem perceber, eles já mudam suas práticas, alteram seus planos e repensam suas vidas através da arte cinematográfica. A escola precisa prover meios para que seus alunos identifiquem essas manobras que fazem a partir do que assistem num filme, bem como nas mais diferenciadas cenas da vida. Assim, eles assumirão o papel de autores conscientes de todas as formas de influência, passando a repensar o que, de fato, querem para a própria vida.
* Erika de Souza Bueno é coordenadora pedagógica do Planeta Educação e editora do Portal Planeta Educação (www.planetaeducacao.com.br). Professora e consultora de Língua Portuguesa pela Universidade Metodista de São Paulo. Articulista sobre assuntos de língua portuguesa, educação e família.
Deixe o seu comentário