A população fica deslumbrada diante dos painéis com as fotos de seus antepassados que Regina Lo Bianco recuperou e está exibindo no salão do Posto de Saúde. São 300 fotos 13x18, de 1940 até os dias atuais, montadas em vários painéis que mostram parte da história de Rio Bonito de Lumiar.
Numa delas, por exemplo, um morador posa para a câmera com os filhos, a mulher e o cachorrinho. Detalhe: está com seu precioso rádio de pilha nas mãos, como se este fosse um membro da família. Noutra, dois rapazes estão sentados no capô de uma Rural, com um orgulho danado do carro que parecem ter adquirido recentemente. E vai por aí afora. "Algumas das fotos expostas são fantásticas, interessantíssimas”, diz Regina, lembrando que o povo de Rio Bonito traz em suas feições, costumes e tradições as marcas dos colonos suíços e alemães que povoaram a região.
O vínculo da fotógrafa com a localidade vem de longe. Ela descobriu o lugar há mais de 20 anos, quando o doutor Heródoto Bento de Mello trouxe uma comitiva de suíços para visitar Nova Friburgo. Em busca dos primeiros colonizadores, ela procurou um lugar onde ainda houvesse alguns descendentes remotos desses povos para fazer algumas fotos. Foi então que descobriu Rio Bonito e se apaixonou de cara.
No passado, ela conta, as pessoas retiravam seu sustento diretamente da terra. As casas de pau a pique eram feitas graças ao engenho humano e com material da terra, barro, madeira e pedras. A habilidade deste povo lhe permitiu produzir jacás (balaios), peneiras e cestos para transportar alimentos e, claro, fogões a lenha.
Começou a registrar tudo o que via, chegando, inclusive, a fazer uma exposição com as primeiras fotos que fez. Desde então, foi milhares de vezes a Rio Bonito, criando um vínculo de confiança muito interessante com a comunidade. Conheceu duas pessoas que a ajudaram muito neste processo de aproximação com o pessoal da terra: Marianne Folly e Carminha, que já moravam lá há muito tempo.
Lá se vão duas décadas e neste período, Regina pôde captar boa parte das paisagens, construções, objetos, hábitos, enfim, do dia a dia daquele povo, e agora, na última etapa, complementa o trabalho com as próprias fotografias de seus acervos pessoais. Casamentos, festas familiares e religiosas, fotos de família, mutirões para construção da estrada e do centro comunitário, o primeiro ônibus que chegou à localidade, enfim, um painel da vida cotidiana da localidade.
A memória de um lugarejo
Não foi difícil o acesso a estas preciosidades. A agente de família do lugarejo, Bete Almeida, que tem um vínculo muito bom com a população, pedia a cada família que separasse suas fotos para que fosse feito um trabalho de recuperação da memória do local. Em seguida, Regina trazia as fotografias para o Centro, tratava cuidadosamente cada uma delas, ampliava e devolvia as originais. Imaginem o trabalhão.
Mas a fotógrafa foi além. Ao longo destas duas décadas, gravou uma série de entrevistas, tanto com descendentes de suíços e alemães como com naturais da região. "O que sempre me surpreendeu aqui é que eles fazem questão de manter as tradições de seus antepassados, como o carnaval dos homens de folhas, em que os moradores desfilam cobertos de folhas. É uma coisa incrível, espetacular mesmo”, diz.
Agora as coisas estão mudando pelo local. E para melhor, parece. A energia elétrica chegou e com ela, a televisão. Os moradores dispõem até de telefone, algo impensável há algum tempo atrás. Antes, ônibus era só uma vez por dia, hoje tem vários horários. A estrada, que por vezes ficava intransitável, também melhorou. Ainda é de chão, mas está bem cuidada, graças a uma empresa que envasa água mineral, a Ecovita, que tem toda uma preocupação com o meio ambiente e que também dá emprego aos moradores.
A abertura da mostra foi surpreendente, emocionante, conta Regina, registrando a presença de mais de 200 pessoas. Até os jovens do lugar se interessaram, quando reconheciam seus pais, avós e vizinhos. E então, corriam para chamar os outros moradores. Regina Lo Bianco está feliz com o trabalho. "O barato é que a exposição conta um pedaço da história de Friburgo, do ponto de vista dos trabalhadores da terra”, resume.
Agora a fotógrafa está pensando em doar os painéis para o Pró-Memória. Por enquanto não pretende montar a exposição na cidade, por achar que ela não interessaria a ninguém. Será? Meio difícil, até porque apresenta um mundo totalmente diferente do nosso. Conhecemos a paisagem, o verde desses arredores, passeamos por aquelas bandas, mas, quem é o morador deste lugar? O que fazem? Como vivem? Quais os seus costumes? Quem é esse povo que colonizou a região? No final, admite que "seria legal”, mas só dentro de um contexto maior, com trechos das entrevistas, quem sabe, durante o lançamento de um livro sobre Rio Bonito de Lumiar. Taí. Um projeto fantástico para ser abraçado por alguma empresa. Quem se habilita?
A exposição pode ser visitada aos sábados, das 14h às 18h, e domingos, das 10h às 13h, no Posto de Saúde, até o fim de janeiro. Um bom pretexto para conhecer e desfrutar das belezas deste local.
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