OPINIÃO - Uma viagem ao Rio de Janeiro

terça-feira, 19 de novembro de 2013
por Jornal A Voz da Serra

Anacleto Vasconcelos

Na saída da rodoviária vemos um conjunto de pequenas lojas dedicadas à venda de roupas íntimas femininas, marca registrada da cidade. No seu entorno umas poucas ruas completam o bairro poeticamente denominado Ponte da Saudade. Logo a seguir, chegamos a Mury, um reduto residencial de descendentes dos antigos colonizadores alemães que ainda conserva algumas construções, hábitos e restaurantes típicos. Mal terminamos o pequeno bairro e já nos deparamos com a primeira favela desse trecho de rodovia, fruto da ocupação do patrimônio imobiliário abandonado pela antiga ferrovia da região. A partir do Alto da Serra a Natureza explode em toda a sua plenitude, exibindo um santuário remanescente da Mata Atlântica, área que se estende até o início da baixada de Cachoeiras de Macacu. Essa região — para nós, Serra de Friburgo; para outros, de Cachoeiras, sua verdadeira vinculação geopolítica — é resultante do esforço de preservação de um ecossistema fundamental para nossa qualidade de vida. Atravessando a cidade recordamos sua importância histórica como centro de manutenção das composições ferroviárias, especialmente das máquinas cremalheiras que prestaram inestimáveis serviços à nossa população, galgando os primeiros mil metros de altitude da Serra do Mar, completando a longa viagem Rio-Friburgo daqueles anos dourados... Fenômeno interessante é o mito da viagem de trem. Ainda hoje há pessoas que guardam uma inexplicável saudade daquela época quando o horário da chegada do trem à cidade era um acontecimento social importante. É indiscutível que o trem foi suplantado pelo automóvel por muitas razões, sobretudo, econômicas e políticas, mas também é verdade que a viagem de trem se manteve no imaginário popular porque evoca classe, luxo, amor, despedida e saudade... Com o automóvel é diferente. Ele veio e suplantou o trem porque é a representação maior de uma sociedade ávida de riqueza, poder e sexo! Continuando nosso percurso atravessamos uma grande área, muito plana, outrora encharcada e dominada pelos insetos transmissores das doenças tropicais. Ao longo da rodovia predominam residências muito simples e pequenas favelas. No campo, propriamente dito, sobrevivem algumas criações de cavalos e gado leiteiro. É então que recebemos o primeiro choque econômico com o anúncio da presença da grade empresa. Encontramos a estrada que leva a um dos maiores empreendimentos industriais do estado, a nova refinaria da Petrobras. Naquele entroncamento rodoviário, dependendo do horário, podemos perder muito tempo de viagem, contemplando a interminável fila de ônibus que chegam ou que saem, conduzindo milhares de trabalhadores aos seus destinos. O trecho de estrada restante é quase totalmente ocupado por milhares de precaríssimas habitações. Na estrada, por sua vez, o trânsito vai cada vez mais perdendo a fluidez, até parar completamente... É o congestionamento de entrada. Estamos às portas do Rio de Janeiro! Vencidos com paciência os poucos quilômetros restantes, chegamos a Niterói, cidade considerada como uma das mais ricas do estado e último reduto do modo de viver interiorano. A Ponte Rio-Niterói é um marco da engenharia nacional dos anos 70. Seus 14 quilômetros de pistas, com três faixas para cada direção, dezenas de metros acima da Baía da Guanabara foi considerada uma loucura e um desperdício na época da construção. Hoje vivemos em permanente estado de trânsito congestionado e já se discute seriamente a hipótese de sua duplicação. Apesar de todos os contratempos de viagem, a Ponte ainda é uma travessia deslumbrante, um cenário poético e encantador... Inicialmente temos as instalações da Marinha com seus submarinos, fragatas e torpedeiros. Ao seu lado, alguns dos nossos tradicionais estaleiros, onde se destacam as construções das grandes estruturas destinadas às plataformas da Petrobras. Apesar de a Ponte ser construída sobre a baía, temos que enfrentar uma montanha para percorrê-la, uma vez que existe um chamado Vão Central, destinado ao trânsito de navios, o que obrigou a elevar o nível da ponte em cerca de 80 metros. Vencidos os 14 quilômetros de extensão, estamos chegando ao Porto do Rio de Janeiro, com seus incontáveis guindastes, seus contêineres, um mar de automóveis estacionados, esperando o momento do embarque, seus maravilhosos e grandiosos navios turísticos internacionais... Antes, porém, da chegada ao solo firme devemos contemplar algumas das inúmeras ilhas da Baía de Guanabara. O Galeão e o nosso mais simbólico aeroporto; Paquetá, famosa e lindamente romântica; Fundão e sua universidade de onde saem os melhores cientistas nacionais, sem esquecer de contemplar nesse ponto a Perna da Moça, em permanente exercício, segurando a pequena ponte de acesso... Do outro lado, não se faria a História do Brasil sem a Ilha Fiscal... Pertinho dela está o Santos Dumont, nosso aeroporto urbano, um luxo para poucos privilegiados, sobretudo, os passageiros de outra ponte, a Rio-São Paulo. Por fim, saímos da Ponte e, antes de entrar na Rodoviária, alcançamos o novo modelo de cidade: o Porto Maravilha, projeto urbanístico que pretende modernizar a cidade do Rio de Janeiro, nosso destino final. Em resumo, a viagem Nova Friburgo-Rio de Janeiro equivale em tudo, porém, em menor escala, a um grande passeio pelo território nacional, com suas riquezas naturais, suas ilhas de excelência científica, tecnológica e econômica e suas misérias ostensivamente expostas. Vale a pena conferir!

anacletovas@gmail.com


CONTINUA DEPOIS DA PUBLICIDADE
TAGS:
Publicidade