O pecado que dói

sexta-feira, 05 de outubro de 2012
por Jornal A Voz da Serra

Wllysses D’Ávila – visite o blog http://www.pessoal-intransferivel.blogspot.com

No livro “A Cabala da Inveja” o rabino e escritor Milton Bonder define esse sentimento, tão cercado de tabu e aversão, não como um desejo de que o outro não tenha alguma coisa, mas, como um ressentimento pela conquista do outro. A questão é não desejar o que é do outro, mas sim desejar que o outro não tenha, ficar infeliz com a vitória alheia mais do que feliz com as próprias conquistas. Se olharmos com sinceridade para dentro de nós ou observarmos nossas reações sem justificá-las, é possível compreender  toda verdade contida nessa definição, por mais feio que seja sentir dessa maneira, é assim que esse sentimento se comporta dentro de nós.
Zuenir Ventura, no livro “Inveja - O Mal Secreto”, também é polêmico, pois além de uma pesquisa minuciosa sobre a inveja, no livro, ele fala sobre como ela é inerente ao ser humano, e que não tratamos essa reação comum com naturalidade, muito pelo contrário, negamos sentir inveja e julgamos quem supomos que a sinta. O livro faz parte de uma série lançada no final da década de 1990 pela Editora Objetiva—Plenos Pecados—onde vários escritores nacionais escrevem sobre os pecados capitais. Para Zuenir Ventura, a inveja é o pior dos pecados porque é o único que as pessoas não têm coragem de assumir. Por esta razão a obra recebeu o título: O Mal Secreto.
Assim como os outros pecados do cristianismo, luxúria, avareza, preguiça, ira, soberba e gula, lutar contra a inveja que se sente é lutar contra impulsos da própria natureza, ou lutar contra ser impulsivo, talvez. O que eu estou querendo dizer é que isso tudo está dentro de nós, e por mais que seja senso comum negar que se sente inveja, isso é um fato. A verdade é que a vida em sociedade depende da opressão de várias coisas que sentimos para ser viável. Não vamos nos tornar inimigos de quem conquistou alguma coisa e nos fez sentir inferior por isso, não porque somos bonzinhos, mas porque também queremos ser aceitos quando alcançar-mos os objetivos que desejamos. Não sei se foi Oscar Wilde que disse algo mais ou menos assim: “Amigo é aquele que te quer bem apesar das suas vitórias”, se estiver fazendo uma citação errada me corrijam, mas essa frase é cheia sabedoria.
Ninguém admite sentir inveja, mas todo mundo sabe uma receita contra ela, galho de arruda, sal grosso, sinal da cruz, olho grego, uma cebola cortada ao meio, calçar um pé de cada calçado, e por aí vai. Para diminuir alguém, ou para nos sentirmos superior em um conflito, quase sempre atribuímos inveja ao outro, na condição de vítima dela as pessoas nos dão razão, e quem sente inveja está sempre errado.
A gente diz que não sente, mais sabe perfeitamente como ela funciona. A gente diz que confia nas pessoas, mas não conta para ninguém nossos planos com medo de que “algo” atrapalhe. Sim, muitos de nós acredita que a inveja tem força mística, que sai pelos olhos, e é capaz de destruir nossos planos, relacionamentos e negócios, contra ela cultivamos plantas, usamos amuletos e guardamos segredos; enganamos a inveja omitida nosso sucesso e prosperidade.
O que importa disso tudo não é saber que todos sentimos inveja e que escondemos e fugimos disso. Mas o que vem depois, o que fazemos com esse sentimento. Cultivamos ou canalizamos como motivação? Superamos o ressentimento ou sofremos sem limite? Pois se, por um lado a inveja é natural, por outro ela é inútil, e mesmo que tenha poderes destrutivos, provoca muito sofrimento em quem a sente. Então, ser compassivo e nutrir empatia pelas conquistas alheias é mais do que sublime, é fazer bem a si mesmo. Acredito no autoconhecimento como solução para quase tudo, entender o que sentimos, e a nossa capacidade de transformá-lo em algo construtivo, é melhor do que amargar dor e mágoa pelas coisas sobre as quais não podemos intervir. Não somos responsáveis pelo que as pessoas fazem, mas somos capazes de refletir sobre como reagimos.

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