O novo diretor do Sanatório Naval de Nova Friburgo, capitão-de-fragata Nestor Francisco Miranda Júnior (foto), tem um currículo invejável. Neurologista formado pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde fez também sua residência, trabalhou no Hospital Albert Schweitzer e também no Hospital Geral de Bonsucesso. Apaixonado por sua profissão, tornou-se membro titular da Academia Brasileira de Neurologia e membro fundador e efetivo da Associação de Neurologistas do Estado do Rio de Janeiro.
Depois que entrou para a Marinha, atuou na Estação Comandante Ferraz, no continente antártico, e foi chefe da clínica de neurologia do Hospital Naval Marcílio Dias, por três anos. É casado com a também médica Patrícia e pai da bela Stephanie, de 15 anos. Nesta entrevista especial para A VOZ DA SERRA, Nestor Miranda Júnior fala sobre suas duas grandes paixões: a especialidade e a carreira.
A VOZ DA SERRA - SABEMOS QUE ATUALMENTE A NEUROLOGIA ENGLOBA UMA SÉRIE DE SUBESPECIALIDADES. ONDE O SENHOR SE ENQUADRA NESTE CONTEXTO?
NESTOR MIRANDA JÚNIOR - As cefaleias (dores de cabeça) e as doenças cérebro-vasculares, isto é, as especialidades que estudam, previnem e controlam os derrames, isquemias, hemorragias. Minha formação é de generalista, ou seja, posso atender a pessoas de todas as idades, mas me dedico mais a adolescentes e pessoas da chamada terceira idade.
AVS - MUITA GENTE CONFUNDE A NEUROLOGIA COM A PSIQUIATRIA OU MESMO A PSICOLOGIA. O QUE VEM A SER EXATAMENTE A NEUROLOGIA?
DR. NESTOR - Na verdade, são três especialidades bem distintas. Neurologia é a ciência que estuda o sistema nervoso, de uma maneira geral. Nós, neurologistas, tratamos de dores de cabeça, derrames, manifestações do diabetes, ou seja, dormências e fraquezas musculares. Já o psiquiatra e o psicólogo tratam dos transtornos da mente, como depressões, psicoses, neuroses.
AVS - A DOR DE CABEÇA MERECE SER TRATADA POR UM ESPECIALISTA?
DR. NESTOR - Com certeza. Hoje em dia, só tem dor de cabeça quem quer, quem não procura especialista, porque há vários modos de intervir nessa dor. Existe uma classificação internacional que cobre mais de 150 tipos de dores de cabeça distintas. Cada uma tem uma nuance, um tratamento específico, uma forma de prevenção. A enxaqueca, por exemplo, uma dor incapacitante que representa uma das maiores causas de ausência ao trabalho nas grandes cidades, pode ser prevenida com um índice de sucesso muito grande.
AVS - QUANDO SENTIMOS DOR DE CABEÇA, A PRIMEIRA COISA QUE NORMALMENTE SE FAZ É TOMAR UM ANALGÉSICO. ESTE É UM PROCEDIMENTO CORRETO?
DR. NESTOR - De forma alguma. Aliás, existe um tipo de dor de cabeça que é desencadeado exatamente por abuso de analgésicos. A pessoa acha que vai melhorar tomando quilos de analgésicos, mas ao se automedicar está se prejudicando. Até porque determinados medicamentos podem danificar seriamente o fígado, os rins e outros órgãos do corpo.
AVS - AS PESSOAS GERALMENTE RELACIONAM DOR DE CABEÇA À PRESSÃO ALTA, TANTO NO CASO DE DORES EVENTUAIS COMO CRÔNICAS. QUAL SERIA A PRIMEIRA MEDIDA A TOMAR?
DR. NESTOR - O mais adequado é sempre procurar auxílio médico. Uma avaliação médica criteriosa pode distinguir entre os diversos tipos de cefaleia. Existem as eventuais, chamadas tensão episódica, que tanto podem estar relacionadas ao estresse e a situações adversas como a situações mais graves. Mas há casos em que a pessoa pode estar com a pressão altíssima e não sentir nenhuma dor de cabeça. O importante é que pessoas com características familiares de hipertensão e derrame procurem fazer um acompanhamento periódico a partir de certa idade, por volta dos 35 ou 40 anos.
AVS - ALÉM DA DOR DE CABEÇA, QUAL SERIA O OUTRO GRANDE SINTOMA QUE LEVA UM PACIENTE A PROCURAR UM NEUROLOGISTA?
DR. NESTOR - Creio que seriam as doenças cérebro-vasculares, como os derrames e suas sequelas, as epilepsias, as manifestações periféricas do diabetes, como as dormências e dores nas mãos e nos pés.
AVS - CITE ALGUNS CASOS MARCANTES QUE O SENHOR ACOMPANHOU EM SUA CARREIRA.
DR. NESTOR - Nós, médicos, nos deparamos com casos marcantes em diversas ocasiões. Mexe muito conosco, por exemplo, o fato de termos conhecimento sobre uma determinada doença, saber como utilizá-lo e dar início ao tratamento, mas o paciente não poder continuar o mesmo por falta de recursos, retornando justamente porque parou de tomar o remédio. Isso dói. Também mexem muito conosco os casos de demência, a doença de Alzheimer, que deteriora a capacidade de raciocínio e a memória do paciente. A doença que mais me toca, porém, é a esclerose lateral amiotrófica, que acomete a porção anterior da medula, responsável pela parte motora. A pessoa vai perdendo a massa muscular e acaba incapacitada, embora com a capacidade mental intacta. Nós criamos um vínculo muito estreito com esses pacientes, até porque necessitam de um tratamento multidisciplinar muito difícil de ser encontrado nos serviços de saúde pública. Foi por isso, aliás, que me afastei da clínica pública e até da privada. Os serviços públicos de saúde têm dificuldades de oferecer fonoaudiólogo, fisioterapeuta, psicólogo, assistente social, enfim, uma série de profissionais importantes para o tratamento destes doentes. A medicina privada também impõe uma série de obstáculos a esse atendimento multidisciplinar. Nós, os neurologistas, que atuamos na linha de frente, vemos nosso doente ficar cada vez mais incapacitada, pior ainda, ele tem consciência de que está chegando o fim, é uma coisa que penaliza muito a gente.
AVS - HÁ ALGUNS ANOS NÃO SE OUVIA FALAR EM ALZHEIMER E HOJE, AO CONTRÁRIO, FALA-SE MUITO NESTA DOENÇA. A CIÊNCIA TEM ALGUMA EXPLICACÃO PARA ESTE FATO?
DR. NESTOR - Antigamente não se ouvia falar muito do Alzheimer porque usava-se a palavra esclerose para todo tipo de demência. Na verdade, não se tratava de esclerose e sim, de Alzheimer. Mas não resta dúvidas que a doença está sendo mais notificada. O diagnóstico ainda é clinico e, assim mesmo, baseado em suspeitas, porque há vários tipos de demência na qual se inclui o Alzheimer. Abro um parêntese para deixar claro o que vem a ser demência, do ponto de vista médico. Para o leigo, demência é a loucura, pura e simples. Para o médico, é essa dificuldade de memorização. A pessoa tinha a memória íntegra e, aos poucos, esta vai declinando. Ela encontra dificuldade até de fazer cálculos simples ou de colocar o carro na vaga que sempre ocupou. Os principais métodos de diagnóstico são clínicos e podem ser feitos no próprio consultório. Outros, mais complexos, necessitam de um especialista.
AVS – O QUE SE PODE FAZER PARA PREVENIR ESTAS DOENÇAS?
DR. NESTOR - Infelizmente, as neurológicas ainda não podem ser prevenidas. Mas há doenças que podemos prevenir, sim, entre elas, o próprio derrame, desde que tenham sido diagnosticados distúrbios como a pressão alta, colesterol elevado, diabetes ou cardiopatias. Por isso mesmo, nunca é demais lembrar que mesmo se sentindo bem – já que está sendo bem monitorado por seu médico – o paciente nunca deve parar de tomar remédios ou de fazer as atividades físicas recomendadas para controlar o diabetes, o colesterol ou a hipertensão. Não é pelo fato de estar se sentindo bem que a pessoa deve diminuir ou, pior ainda, suprimir a medicação sem conversar antes com o médico.
AVS - UMA PESSOA SAUDÁVEL PODE, NO FUTURO, VIR A APRESENTAR ALGUMA DOENÇA NEUROLÓGICA? EXISTE ALGUMA FORMA DE SE PREVENIR ESTE MAL?
DR. NESTOR - Sim, quem já tem algum histórico familiar, como colesterol ou triglicerídeos elevados, diabetes na família, hipertensão ou é sedentário, deve, em primeiro lugar, se alimentar melhor e começar a se exercitar. Se eu sei que meu pai e meu avô tiveram colesterol alto, já fiz um exame e o meu colesterol está um pouco elevado, vou tratar de fazer uma dieta e praticar exercício. Nisso se resume a prevenção de todos esses problemas.
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