Novo conceito de carceragem devolve dignidade a presos

sexta-feira, 27 de novembro de 2009
por Jornal A Voz da Serra
Novo conceito de carceragem devolve dignidade a presos
Novo conceito de carceragem devolve dignidade a presos

A tentativa de fuga de um dos detentos na manhã de terça-feira, 24, causou tumulto nas imediações da 151ª DP e trouxe à tona a discussão sobre a carceragem da Vila Amélia. Em recente audiência pública promovida na Câmara de Vereadores com a presença dos delegados José Pedro Costa da Silva (titular da 151ª DP) e Orlando Zarconi (chefe da Polinter), uma série de problemas foi apontada e o assunto começou a ser discutido.

Diferente do que geralmente acontece em outras unidades prisionais, o preso Cristiano Henrique da Silva, que tentou fugir esta semana, não sofreu retaliação no setor carcerário. Fruto de um trabalho iniciado após a chegada do inspetor Ernani de Souza Gomes (já como resposta à audiência pública na Câmara), o diálogo foi o meio encontrado para que Cristiano pudesse expor os motivos que o levaram a tentar fugir.

Nascido em Vila Isabel, no Rio de Janeiro, Cristiano Henrique foi criado nas proximidades de Água Santa. Preso e condenado, ele cumpriu parte de sua pena até fugir, quando estava no regime semiaberto. “Minha mãe tem problemas psiquiátricos e soube que haviam abusado dela, então resolvi não voltar e tentar mudar esse quadro lá fora”, contou em entrevista no pátio da carceragem da 151ª DP, na manhã de quarta-feira, 25.

Cristiano disse que não programou a tentativa de fuga. “Eu estava num culto e havia um outro preso pintando uma das celas e percebi que ele estava distraído e resolvi usar a escada para alcançar a laje e pular para o pátio”, esclareceu, dizendo que o problema da mãe, a saudade da família e a informação de que o juiz criminal de Nova Friburgo havia aceitado a denúncia do Ministério Público (MP) contra ele fizeram com que “perdesse a cabeça”.

O problema vivido por Cristiano, agora apelidado de Fujão, é o mesmo de boa parte dos mais de 140 presos que estão nas celas da 151ª DP. Eles ainda enfrentavam o agravante de ter que viver e conviver com companheiros de celas num ambiente semelhante aos de “masmorras medievais” e “campos de concentração”, conforme classificação do próprio chefe da Polinter, delegado Orlando Zarconi, durante a audiência pública realizada em Nova Friburgo.

Por iniciativa do vereador Professor Pierre, em parceria com diversas entidades, a dignidade está sendo restaurada. O ambiente carcerário era precário. Falta de água, banhos com garrafas pet, falta de luz, banho de sol de 40 minutos de segunda a sexta-feira, pouco tempo para visita de parentes, comida quase sempre azeda e muitos outros problemas eram comuns no setor. Atualmente muitas providências já foram tomadas.

Basta conversar com os presos para perceber o quanto já estão satisfeitos e esperançosos com a estrutura encontrada na Carceragem Cidadã. Todas as celas foram reformadas (estavam mofadas e os buracos, conhecidos como bois, que serviam às necessidades fisiológicas, estavam entupidos, causando mau cheiro). Na cela 2, onde atualmente estão 23 presos, todos foram unânimes em afirmar que a situação está muito melhor. “Ainda dormimos amontoados, mas não sofremos mais com o cheiro ruim e o ambiente está mais limpo”, atestaram.

Um dos destaques pelos presos foi quanto à ampliação do banho de sol. Agora eles saem das celas duas vezes por dia, para uma hora de banho de sol, há chuveiro no pátio para banho, todas as celas têm chuveiro com água quente, há atividades religiosas diárias, o tempo de visitas aumentou e já há espaço para atendimento jurídico. Tudo num ambiente em que o preso tem o direito de se expressar e até reivindicar, pois tem acesso direto à administração.

Segundo o vereador Professor Pierre, este é só o começo do processo. “Estamos buscando junto ao Centro de Estudos Supletivos (CES) professores para ministrar aulas aos detentos. Assim eles poderão concluir seus estudos. Vamos ainda trazer o maior número de atividades que pudermos para humanizar cada vez mais o setor de custódia”, disse o vereador.

Mudanças na carceragem levam presos a pensar num futuro melhor para suas vidas

Muitos presos vêm se mostrando inclinados às mudanças. Na visita de A VOZ DA SERRA ao setor carcerário durante o banho de sol de quarta-feira, 25, se mostraram satisfeitos e dispostos a procurar emprego e uma vida longe do crime após cumprirem suas penas.

Preso por tráfico de drogas, Eliezer Domingos Gomes disse que falta pouco mais de um mês para ele ganhar a liberdade. “Eu criei o festival de chope de Riograndina, tinha um bar com sauna. Estou aqui há um ano e seis meses. A cadeia foi uma escola e pretendo não me envolver mais com coisas erradas e voltar a trabalhar quando sair daqui”, afirmou.

Ao fim da visita de nossa reportagem, outro preso, incentivado pelos demais detentos, pediu para cantar um rap de sua autoria. Alexsandro Nobre Correa , MC Esquisito (foto) disse estar animado com a ideia de um dia gravar seu CD e abandonar definitivamente a vida delituosa. Na letra de seu rap ele expressa a vontade de voltar para sua mãe (diz saber que a magoou) e conta o drama vivido com duas namoradas. “Quando sair quero uma nova vida. Quero aproveitar melhor as oportunidades”, disse.

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