Notas de um moleque desocupado - 31 de maio

Por Daniel Frazão
sexta-feira, 30 de maio de 2008
por Jornal A Voz da Serra

Nem dá para acreditar que mês que vem chego aos trinta anos. Não demorou.

Estranho, sempre me imaginei diferente aos trinta anos. Lembro de quando tinha dezenove, vinte, e me imaginava aos trinta. A imagem que me vinha à mente era completamente diferente, física e existencialmente. E hoje estou aqui, sem sentir diferença alguma. Acho que é impossível dissociar o indivíduo de si mesmo... por mais que o tempo passe.

Pelo menos no que tange ao aspecto físico, acho que me dei bem. Modéstia à parte, é difícil alguém acreditar que tenho praticamente trinta. Outro dia gravei um programa e o pessoal de lá pensou que eu tinha dezenove, hehe. Aí também já é demais. A parte ruim é que é difícil me libertar da conceituação do "jovem escritor", mesmo que já não seja "o jovem escritor" faz tempo. Acho que isso ainda vai render pano pra manga.

Fazer trinta anos é como entrar num túnel escuro. Lá longe, do outro lado do túnel, o número QUARENTA brilha em letras garrafais de néon. E você sabe que está indo naquela direção.

É assustador pensar nas coisas que vou encontrar dentro desse túnel. Com certeza é um túnel mais escuro que o túnel da casa dos vinte. É mais silencioso, mais solitário.

Não consigo entender esses velhos que ficam mais serenos à medida que o tempo passa. Quanto mais velho fico, menos sei. Acho que aos sessenta serei uma verdadeira bomba existencial. Uma bomba em ebulição, embora contida e melancólica; silenciosa como o túnel.

Sim, a melancolia faz parte de mim. Sempre fez. Mas acho que deve ser assim com todo mundo, uma vez ou outra. Comigo, são muitas vezes, mas e daí? Melancolia não é necessariamente ruim. É difícil achar uma coisa que seja necessariamente ruim.

Para mim, o passado é vivo. O futuro é um mar aberto. O presente sou eu. Não há razão de separar uma coisa da outra.

erta vez me disseram que quem vive de passado é museu. E quem vive de futuro é o quê? Um vidente picareta de subúrbio. Mas não importa. No fundo todas essas coisas importam. Aos trinta, começamos a notar que o passado não ficou para trás (já que a vida é breve) e que o futuro não está tão longínquo; notamos que tudo está incluso no presente. O presente é o único tempo real, o resto é conceituação.

É impossível olhar para o passado ou vislumbrar o futuro. Tudo o que enxergamos são transfigurações do tempo presente. É aquele túnel que falei. Ele mexe com nossos sentidos. Acho que esse é o papel do túnel. O nosso papel é atravessá-lo. E chega desse papo empírico.

Trinta anos, quem diria... Eu não diria. Pelo menos não dessa maneira.

Quer saber de uma coisa que muda dos dezoito para os trinta? As fantasias sexuais. Quando eu tinha dezoito, era legal imaginar uma mulher mais velha. Hoje, isso é um pensamento um tanto quanto triste e frustrante. Hehe.

Então é isso. Lá vou eu para os trinta. Ainda como um "jovem escritor". Acho que nem posso reclamar disso. Nem quero pensar no dia em que serei um "velho escritor". E chega de papo.

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