Vou escrever um livro sobre a estupidez humana.
- Não pode fazer isso.
- E por que não?
- Já se deu conta de quantos estúpidos existem por aí? Milhares e milhares. Só nessa rua, centenas. Você vai se encrencar com um monte de gente.
- E...?
- Não quer esse tipo de coisa pra você...
- Tá legal. E o que me diz de um livro sobre a morte?
- Pior ainda.
- Ahn? Como assim?
- Pra cada três pessoas, pelo menos duas estão morrendo. Eles podem tomar como uma ofensa pessoal. E se você levar em conta que todos os homens são mortais, aí fica mais perigoso. Pode ser entendido como uma provocação a toda a humanidade.
- Certo, certo, então escreverei um livro sobre a vida. Assim não ofendo ninguém.
- Aí que você se engana. Pouquíssimas pessoas têm a vida que gostariam. E se tem um negócio que irrita todo mundo é exaltação do que não podemos ter.
- Está me dizendo que falar da vida é uma agressão?
- E das maiores.
- Já percebi que filosofar não está na moda. Tudo bem; sou um cara maleável. Vamos nos ater a coisas práticas. Um livro sobre música, que tal?
- Ihhh...
- O que foi agora?
- Só pode dar encrenca.
- Encrenca? Como assim? O que pode dar errado, falando de música?
- Tudo. Você não tem como adivinhar o que estão ouvindo por aí.
- Não preciso falar do que estão ouvindo.
- Então é melhor não falar nada.
- Porra.
- Pois é.
- Então, um livro sobre animais.
- O quê?!
- O que foi que eu fiz dessa vez?
- Primeiro, seres humanos não gostam de lembrar que são animais. Isso será uma alfinetada. Segundo, pode ser entendido como uma alegoria crítica.
- Alegoria crítica? Falar de coelhos, raposas, esquilos?
- Exatamente.
- Tá bom! Tá bom! Escreverei um livro de culinária!
- Se eu fosse você, não faria isso.
- Por quê?
- Podem encarar como uma forma de apologia à obesidade. Vivemos numa sociedade politicamente correta. Sem contar que as pessoas obesas pensarão que você está fazendo pouco caso delas.
- E o que você me sugere?
- Cara, não faço a mínima ideia.
- Eu também não.
- Pois é.
- Pois é.
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